No editorial de 13/1/2023 deste jornal, Manuel Carvalho sentenciou o fracasso da greve dos professores. Esta estaria condenada pela falta de diálogo social, resultante das formas de luta adotadas por alguns sindicatos. Não me cabe a defesa legal dos pré-avisos de greve, até porque o diretor do PÚBLICO admite que podem ter “cobertura da Constituição e todas as leis do mundo em seu favor”. Mas creio que há alguma coisa a dizer em defesa da dignidade desta mobilização.
Essa dignidade saiu à rua no sábado, sob o mote levantado pela multidão: "Professores a lutar também estão a ensinar.” A demonstração de cidadania desmente o isolamento social. Um professor sintetizou num cartaz essa reivindicação solidária, que junta famílias e comunidade escolar: “Manuel, o pai está a lutar pela tua educação.” E um nonagenário, quando questionado sobre a sua presença, respondeu simplesmente: “Fui aluno.”
O que motiva, então, o editorialista a condenar esta mobilização histórica? O biombo não esconde o alinhamento com as opções tomadas, na velha tentativa de separar o inseparável: a resposta à crise existencial da escola e o problema estrutural da falta de docentes. Este barril de pólvora tem muitas causas, mas a sua explosão recente resulta simplesmente da incapacidade do PS.
O ministro da Educação, aceitando finalmente negociar, não deixou de colocar na mesa propostas que sabia serem inaceitáveis
O ministro da Educação, aceitando finalmente negociar, não deixou de colocar na mesa propostas que sabia serem inaceitáveis. Tais propostas, como a criação de um conselho intermunicipal de diretores ou a escolha por perfis de competências, provaram-se, no passado, permeáveis a cunhas e autoritarismos. Ao mesmo tempo, recusa responder aos problemas reais: não mexe nas normas que impedem a mobilidade por doença, obrigam os professores a andar com a casa às costas, travam na secretaria a progressão, desrespeitam o pessoal não docente e mantêm a precariedade. A falta de professores nas escolas não se deve às greves. Deve-se a um Governo que desistiu de resolver os problemas.
Sobre a dignidade das mobilizações, diria apenas que o alerta que finalmente soou é o mais importante fator de esperança para a Escola Pública. As costas dos professores são largas, mas não chegam para carregar as culpas do fracasso do Governo. Se Manuel Carvalho o tivesse percebido, teria evitado dar um tiro no pé.
Artigo publicado no jornal “Público” a 18 de janeiro de 2023
