Pela segunda vez, um país Europeu experimentou a “liberdade de escolha” no que diz respeito à saúde e, pela segunda vez, os resultados foram maus. Desta vez foi a Noruega. A partir de 2015, os noruegueses puderam escolher livremente qual o prestador de saúde que pretendiam, se público ou privado. Os objetivos da medida eram reduzir listas de espera e aumentar a eficiência na gestão dos serviços de saúde. Mas em 2022, a Noruega contratou uma entidade externa para avaliar o impacto da medida que concluiu que não só não se observaram os benefícios esperados, como se verificou um aumento nos custos globais com a saúde e um aumento na desigualdade no acesso aos serviços de saúde, sobretudo entre classes socias e localização geográfica.
Esta é, como dizia, a segunda experiência na Europa que pretende implementar, na prática, o fetiche da liberdade de escolha que a direita portuguesa tanto venera. O Reino Unido já tinha avaliado, em 2008, a sua própria experiência com a liberdade de escolha, tendo chegado à conclusão que não houve qualquer ganho de qualidade e eficiência, como apontado no relatório “Audit and Healthcare Comission”. Quando questionados, os utentes britânicos preferiam ter mais “qualidade” no hospital mais perto de si do que “liberdade de escolha” para frequentarem o hospital que desejassem.
Nos países cujo sistema assenta na “escolha” dos prestadores, sejam eles públicos ou privados – os sistemas Bismarckianos, como o Francês ou o Alemão, tem havido, ao longo dos últimos anos, um movimento para restringir essa mesma escolha, no sentido de controlar os custos que tendem, nestes sistemas, a serem superiores, sem que a isso corresponda um ganho de qualidade. Os restantes países, como Portugal, onde o Estado é financiador e prestador, têm sido acusados de ineficiência e de acumularem listas de espera, dificultando o acesso. O que é verdade em Portugal e Reino Unido mas não o é em outros países com sistemas idênticos ao nosso como a Dinamarca ou a Suécia. Por outro lado, vários países com sistemas “bismarckianos” têm problemas de listas de espera e entupimento de urgências, como é o caso da França.
Independentemente do tipo, é o subfinanciamento dos sistemas, manifesto sobretudo pela falta de profissionais que causam listas de espera e sobrelotação de serviços
O debate sobre os “modelos de financiamento” dos serviços de saúde servem, no fundo para encobrir o verdadeiro problema que assola sistemas de saúde por essa europa fora: o baixo investimento e a suborçamentação. Independentemente do tipo, é o subfinanciamento dos sistemas, manifesto sobretudo pela falta de profissionais que causam listas de espera e sobrelotação de serviços. É evidente que precisamos de análises comparativas e monitorização dos resultados, mas neste momento, priorizar esse debate, é encobrir o verdadeiro problema: falta financiamento e faltam profissionais.
Em Portugal, enquanto a direita clama por um novo modelo de financiamento, a maioria absoluta ensaia uma estratégia similar, prometendo reorganizar o SNS. A criação da direção executiva e as propostas para fechos e concentrações de urgências nas grandes cidades procuram apontar uma solução que não existe. Claro que todos os debates são legítimos e todas as propostas podem ser meritórias e positivas para o SNS. Mas nenhuma, repito, nenhuma proposta de modelo ou reorganização terá qualquer sucesso se não forem resolvidos os dois problemas de base: o subfinanciamento e a falta de profissionais!