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Lições italianas
Pergunto-me que diria então Calvino sobre as lições italianas dos dias de hoje. E não há resposta, claro. Calvino já morreu e a Itália ultrapassa o que a imaginação mais delirante poderia supor.
Mas restam os factos.
Berlusconi vai à frente nas sondagens e a direita mais conservadora parece poder vencer as eleições que se aproximam, restando a dúvida de saber como se vai recompor a frente dos partidos berlusconianos. O governo de "centro-esquerda", portanto, fracassou na disputa pela hegemonia eleitoral e todos quantos nele votaram podem ser assim as vítimas desse fracasso anunciado.
E o governo cai porque se desfaz uma coligação por via da deserção de um partido de direita, vindo da explosão da democracia cristã, e cujos líderes foram inculpados judicialmente por conexão com o escândalo mafioso dos lixos napolitanos. Da solidez e consistência da coligação, fica tudo dito.
Na esquerda europeia, esta experiência de governo e a sua política internacional foi muito discutida. Foi mesmo um tema da Convenção do Bloco de Esquerda, que tomou posição clara condenando todos os governos europeus que colaboraram com a ocupação do Afeganistão, na esteira de estratégia de Bush.
Ora, esta espécie de realismo teve efeitos ainda mais duros na vida social do país, fosse na política orçamental e económica, fosse na alteração das regras da segurança social. E teve como consequência a derrota do governo, porque perdeu parte do seu apoio enquanto a direita recompunha a sua base.
Para a esquerda, esta evolução demonstra mais uma vez a importância da luta pela hegemonia, que se baseia num programa para a transformação da sociedade. Nenhuma coligação pode ter efeito no combate a essa injustiça que é a exploração e a desigualdade a não ser que se baseie no triunfo da mobilização social. E a luta pela hegemonia é precisamente o combate revolucionário que constrói a relação de forças para atingir os pilares da vida social e política em nome de um projecto para dirigir a sociedade. Esse projecto é um programa, mais uma vez: a hegemonia é a luta pelo programa que responde à necessidade imediata da maioria dos trabalhadores e da sociedade, e que contribui para a sua mobilização por objectivos de longo alcance.
Ou, como sugeriu Italo Calvino, a lição italiana é que é preciso "exactidão", "visibilidade" e "multiplicidade" nos grandes enfrentamentos com que a esquerda quer vencer a direita social, económica e política.
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