É quase certo que a votação será favorável. A única questão, no momento, é quão favorável.
A liderança política israelita está bem ciente disso. Está a discutir três diferentes respostas. A posição dominante parece ser a do primeiro-ministro Netanyahu, que propõe ignorar totalmente a resolução e simplesmente manter as políticas actuais do governo israelita. Netanyahu sabe que a Assembleia Geral das Nações Unidas há muito tempo que adopta resoluções desfavoráveis a Israel, que este país tem ignorado com sucesso. Por que seria esta diferente?
Há alguns políticos da extrema-direita (sim, há uma posição ainda mais à direita que a de Netanyahu) que dizem que, em represália, Israel devia anexar formalmente todos os territórios palestinianos ocupados actualmente e acabar com toda a conversa sobre negociações. Alguns também querem forçar a um êxodo das populações não-judaicas deste estado de Israel expandido.
O ex-primeiro-ministro (e actual ministro da Defesa) Ehud Barak, cuja base política é hoje quase inexistente, adverte que Netanyahu está a ser irrealista. Barak diz que a resolução vai ser um tsunami em Israel, e que, portanto, seria mais sábio que Netanyahu fizesse alguma tipo de acordo com os palestinianos agora, antes que a resolução seja aprovada.
Será que Barak tem razão? A resolução vai ser um tsunami para Israel? Há uma grande possibilidade de que assim seja. Mas não existe praticamente qualquer hipótese de que Netanyahu siga os conselhos de Barak e tente seriamente fazer antes um acordo com os palestinianos.
Pensem no que provavelmente vai acontecer na própria Assembleia Geral. Sabemos que a maioria dos países da América Latina (talvez todos) e uma percentagem muito grande de países da África e da Ásia vão votar a favor da resolução. Sabemos que os Estados Unidos vão votar contra e tentar persuadir outros a acompanhar essa posição. Os votos incertos são os da Europa. Se os palestinianos conseguirem obter um número significativo de votos europeus, a sua posição política ficará muito reforçada.
Vão os europeus votar nesta resolução? Depende, em parte, do que aconteça em todo o mundo árabe nos próximos dois meses. Os franceses já sugeriram abertamente que vão apoiá-la, a menos que ocorram progressos significativos nas negociações de Israel com os palestinianos (que no momento sequer estão a ocorrer). Se o fizerem, é quase certo que os governos do Sul da Europa se juntem a eles. O mesmo podem fazer os países nórdicos. É uma questão mais em aberto se a Grã-Bretanha, Alemanha e Holanda estão prontas a juntar-se a eles. Se estes países decidirem apoiar a resolução, poderão resolver as hesitações de vários países do leste europeu. Neste caso, a resolução obteria a grande maioria dos votos da Europa.
É preciso olhar, portanto, para o que está a acontecer no mundo árabe. A segunda revolta árabe ainda está em pleno andamento. Seria temerário prever exactamente quais regimes vão cair e quais vão aguentar firmemente nos próximos dois meses. O que parece claro é que os palestinianos estão à beira de desencadear uma terceira intifada. Mesmo os mais conservadores entre os palestinianos parecem ter perdido a esperança de que possa haver um acordo negociado com Israel. Esta é a mensagem clara do acordo entre a Fatah e o Hamas. E dado que as populações de praticamente todos os estados árabes estão em revolta política directa contra os seus regimes, como poderiam os palestinianos permanecer relativamente tranquilos? Não vão ficar quietos.
E se não ficarem quietos, o que vão fazer os outros regimes árabes? Todos eles estão a passar por grandes dificuldades, para dizer o mínimo, para controlar as revoltas nos seus próprios países. Apoiar activamente uma terceira intifada seria a posição mais fácil de tomar, como parte do esforço de recuperar o controlo do seu próprio país. Que regime se atreveria a não apoiar a terceira intifada? O Egipto já mudou claramente nesta direcção. E o rei Abdullah da Jordânia deu a entender que também ele o pode fazer.
Imaginem então a sequência: uma terceira intifada, seguida pelo apoio árabe activo, seguida pela intransigência israelita. Que farão então os europeus? É difícil vê-los a recusar-se a votar a favor da resolução. Poderíamos facilmente chegar a uma votação com apenas os votos contra de Israel, dos Estados Unidos, e de uns poucos pequenos países, e talvez umas poucas abstenções.
A mim, isto soa como um possível tsunami. O maior medo de Israel nos últimos anos tem sido a “deslegitimação”. Não seria uma votação como essa precisamente um processo de deslegitimação? E não irá o isolamento dos Estados Unidos nesta votação enfraquecer ainda mais a sua posição no mundo árabe como um todo? O que farão então os Estados Unidos?
Immanuel Wallerstein
Comentário n.º 307 de 15 de Junho de 2011
Tradução, revista pelo autor, de Luis Leiria para o Esquerda.net