Está aqui

Gestação de substituição um passo em frente

O diploma sobre gestação de substituição agora aprovado resulta da evolução social.

Terminada a primeira sessão legislativa com diversos resultados positivos na luta contra a austeridade e o conservadorismo, que imperaram durante o anterior governo, e que predominam nas instâncias europeias, é importante realçar a aprovação do diploma sobre gestação de substituição.

Esta aprovação, e a afirmação do Presidente da República de que irá promulgar o diploma, representam, a meu ver, mais um passo em direcção à liberdade e à emancipação das mulheres na medida em que o controlo sobre a reprodução e a sexualidade são fundamentais para uma cidadania plena.

Sabemos que o patriarcado sempre tentou controlar a sexualidade e a reprodução das mulheres e, embora existam grandes avanços sociais no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, as novas possibilidades que o avanço cientifico no âmbito da procriação medicamente assistida (PMA) permitem são sempre vistas com desconfiança e suspeita.

A gestação de substituição é um tema difícil como todos os que envolvem a ciência e a vida na medida em que não apelam apenas ao racional mas também às emoções. Neste caso a comunicação social nem sempre ajudou ao esclarecimento das pessoas ao referir-se ao diploma alternadamente como da 'maternidade de substituição' e/ou das 'barrigas de aluguer'.

Por um lado, ao noticiar o tema como 'maternidade de substituição', assimilou a visão patriarcal de que a maternidade é a função natural das mulheres e reproduziu uma das leis que a ordem de género inscreveu na maneira como as sociedades se organizam e que tem sido usada para justificar as diferentes teorias das esferas separadas - que preconizam os papéis de género como por exemplo o homem provedor e a mulher cuidadora - e assim perpetuar desigualdades de género. Mas, a maternidade é uma relação familiar/social que se estabelece para além dos vínculos biológicos daí o diploma versar sobre a gestação de substituição e não sobre maternidade.

Por outro lado, os títulos que destacavam 'barrigas de aluguer' apelavam ao emocial e ofuscavam o que se estava realmente a discutir sem com isso procurar dar a conhecer a realidade de países em que já é possível assegurar o pagamento à mulher gestante. Este vai ser um debate do futuro que vale a pena pensar. Ainda não vão existir 'barrigas de aluguer' mas vai ser possível, como disse o deputado do Bloco, Moisés Ferreira, no dia da votação: “Garantir que hoje, 20 de julho, é o dia a partir do qual os projetos se materializam; a partir do qual os sonhos se realizam” - e consequentemente o direito de outras mulheres a decidir, a escolher usar o seu corpo para que o sonho de outras mulheres se realize. É um passo a somar ao passos dados quando foi aprovado o alargamento do acesso às técnicas de PMA a todas as mulheres, independentemente da sua orientação sexual ou do seu estado civil.

O diploma sobre gestação de substituição agora aprovado resulta da evolução social no sentido de garantir o respeito pela dignidade da gestante de substituição e de lhe assegurar, assim como aos beneficiários, direitos, deveres e a possibilidade de um consentimento informado que situações à margem da lei não permitem.

O caminho a seguir é aquele que sempre nos orientou na luta pelos direitos sexuais e reprodutivos, passo a passo, seguras de que a A Mulher Decide, a Sociedade Respeita, o Estado garante.

Sobre o/a autor(a)

Licenciada em Relações Internacionais. Ativista social. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
Comentários (3)