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Falácias ao centro

Quer a tentativa de colagem ao centro do PSD, quer a negação do espectro político do PAN, não passam apenas de duas formas diferentes de fazer a mesma coisa: despolitizar e apelar ao senso comum.

No debate entre Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos, o líder do PSD afirmou que esse não era um debate entre dois partidos de direita, mas sim entre "um partido de direita e um partido do centro". De forma clara, Rui Rio reafirmou a sua estratégia de apresentar o PSD como um partido moderado e no centro do espectro político, capaz de captar eleitores quer à esquerda, quer à direita.

Com o mesmo pavor à definição política, e na tentativa de se apresentar como opção de voto para os mais diversos eleitorados, Inês de Sousa Real diz que o PAN "não se identifica na dicotomia esquerda-direita", admitindo coligações para qualquer um dos lados.

Mas quer a tentativa de colagem ao centro do PSD, quer a negação do espectro político do PAN, não passam apenas de duas formas diferentes de fazer a mesma coisa: despolitizar e apelar ao senso comum, colocando objetivos eleitorais imediatos à frente da construção de qualquer visão transversal e sustentada para o país e para o mundo. São tentativas fúteis. Por muito que se tentem manter identidades com palavras, é nas inevitáveis tomadas de decisão política que a clarificação acontece.

Quando o PAN admite coligar-se com a direita e critica a "cegueira ideológica" da esquerda, mostra que não compreende realmente a dimensão sistémica da crise climática. O PAN não apresenta alternativas à necessidade de acumulação de capital infinita nem à ganância do lucro que destrói ecossistemas, porque o sistema deste partido é o capitalismo. As propostas de taxas sobre o consumo provam também que a transição verde que o PAN propõe não tem como objetivo a justiça climática. É uma transição em que são os mais vulneráveis, como sempre, a pagar a fatura.

Mais grave é o caso do PSD. Um partido que normaliza e faz acordos com a extrema-direita, que promove privatizações e a flexibilização laboral e que aceita a visão de que a saúde pode ser um negócio, é um partido de direita. Nunca poderá ser de "centro", muito menos social-democrata. Um político, que enquanto presidente da Câmara Municipal do Porto, abriu a porta à especulação imobiliária e aos interesses privados (criando pesadelos como o da demolição do bairro do Aleixo que para sempre assombrará as vidas de muitas famílias), e limitou as valências sociais e culturais do município, intensificando situações de pobreza, empurrando os habitantes para fora da cidade e criando uma verdadeira guerra de classes, é um político de direita. Nunca poderá ser um "moderado".

O "centro", a "moderação" e a "estabilidade" são palavras que servem para maquilhar uma realidade profundamente injusta e radical, mas servem acima de tudo para ocultar posições e interesses também eles conduzidos pela ideologia vigente. A observação da prática política permite desmontar esses mitos.

Sobre o/a autor(a)

Engenheiro Informático. Mestrando em Ciência Política. Bolseiro de investigação
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