O Governo de Luís Montenegro, desde que empossado em abril deste ano, tem baseado a sua ação política em grandes campanhas de propaganda, quer aproveitando-se de medidas aprovadas pelo anterior Governo quer criando medidas novas com o excedente orçamental desse. Muito pouco tem sido o verdadeiro intelecto e instinto político da AD naquilo que é a máquina institucional do país, mas a azáfama mediática pelo Orçamento de Estado tem alterado essa perceção. Muitos dos verdadeiros objetivos a concretizar no próximo ano são desconhecidos mas, aos poucos, o véu vai caindo sobre as intenções a longo prazo de Montenegro, fazendo surgir várias ideias que, a se confirmar, impactam gravemente a vida dos jovens portugueses.
O pacote da habitação, adotado antes das férias parlamentares, fez com que a ilusionística isenção do IMT para jovens até aos 35 anos fosse uma realidade, mesmo com um consenso negativo da maioria do parlamento. No país onde os preços das casas continuam a disparar e o acesso à habitação fica cada vez mais difícil, o Governo achou digno fazer uma magia fiscal que não ajuda nenhum jovem. A pressão continua a ser posta do lado da oferta o que invariavelmente causa o aumento descontrolado dos preços, contribuindo para esta bolha de precariedade transversal a qualquer geração, mas especialmente danosa nas camadas mais novas da sociedade. Assim, os jovens continuam sem conseguir aceder à sua primeira habitação independente, continuando a insistir na estatística que aponta Portugal como o país onde os jovens saem mais tarde da casa dos pais.
O Governo também se tem mostrado bastante ineficaz quanto a melhores garantias no acesso ao ensino superior e a residências universitárias. Com o início do novo ano letivo, foram nulas as propostas ou medidas que pretendem resolver a fundo os problemas neste setor que já não tivessem sido propostas e aprovadas pelo anterior Governo do Partido Socialista, deixando a questão ao abandono para a remeter ao famigerado “setor privado e social”. Os jovens académicos - e os que agora chegam pela primeira vez à universidade - deparam-se com preços absurdos por quartos insalubres e minúsculos, com residências universitárias que não têm espaço nem condições para os acolher e com universidades subfinanciadas e rendidas a parcerias empresariais que têm apenas em conta os seus próprios interesses a longo prazo. O interesse sobre este tema parece ser zero para a AD, mesmo que diga o seu contrário, o que apenas prejudica os futuros profissionais do país - mesmo aqueles que alegremente participaram na Universidade de Verão Social-Democrata.
Começámos também este mês de setembro com uma inconfidência chocante por parte do Executivo: o desejo de incluir no Orçamento de Estado propostas para o descongelamento das propinas. Desde o ano letivo de 2014/2015 que as propinas têm sido consistentemente debatidas pela sua redução ou manutenção do seu congelamento, fruto da luta das Associações Académicas e da esquerda política - que inclusive defende sempre a extinção da propina - já este Governo de direita escolhe descongelar o valor colocando vários estudantes em risco económico e de abandono escolar. O Primeiro-Ministro fala em repugnância pelo abandono escolar universitário ao jornal Expresso num dia, e aumenta as barreiras de acesso ao ensino no outro. É incompreensível e oferece um total de zero segurança para qualquer jovem estudante.
Mesmo as mais recentes medidas anunciadas relativamente à oferta de consultas de psicologia e de nutrição, que servem mais uma vez para efeitos de ilusão política do que para combater os graves e estruturais problemas de saúde mental e alimentar nos jovens, são irrisórias. O acesso às consultas de psicologia tem um limite de 10 consultas no espaço de um ano e exclui o acompanhamento ou reencaminhamento de casos que não se enquadrem em quadros de ansiedade e depressão ligeira ou integração escolar, obrigando também o jovem a escolher o seu psicólogo de uma plataforma limitada aos profissionais aderentes. Já as consultas de nutrição têm como limite as 6 sessões e a bolsa de profissionais aderentes é ainda menor, deixando inclusive algumas regiões do país sem esse acesso. No fundo, não quer parecer que estes “cheques-consulta” sejam a solução para problemas de subfinanciamento estrutural.
Cada vez mais se mostra incerto o futuro e a permanência da AD em funções de Governo, no entanto é preciso que todos os jovens - principalmente os estudantes - se unam em prol daquilo que é justo e digno. As soluções para a fixação de jovens no país, para acesso condigno à habitação e para a qualificação superior em condições têm que ser ambiciosas e coerentes. Para isso é preciso que o Governo largue as manobras propagandísticas e pouco conectadas com a realidade, e perceba o que leva uma pessoa jovem a acreditar no seu futuro em Portugal.