No primeiro dia do novo ano, o primeiro-ministro António Costa decidiu fazer uma ação de charme junto dos jovens do país. Perito em propaganda como lhe é reconhecido, Costa publicou um artigo de opinião no “Jornal de Notícias” a assegurar à “geração mais qualificada de sempre” que o país está preparado para lhes garantir um futuro auspicioso.
Em resposta, o “Expresso” foi perguntar a 7 jovens de vários pontos do país como encaram o patológico otimismo de Costa e que futuro esperam para as suas vidas.
Da súmula de problemas elencados pelos inquiridos, será fácil concluir que o otimismo de Costa não contagia os mais novos, desalentados, sem esperança e muitos obrigados a imigrar para encontrar condições de vida que lhes permitam mais do que sobreviver.
A falta de alojamento para alunos do Ensino Superior foi um dos temas abordados. Um problema que impede muitos dos candidatos, apesar de aprovados, de ingressar na Universidade, hipotecando o tal futuro glamoroso de que Costa tanto gosta de falar. A solução, segundo o nosso Primeiro, estará reservada para… 2026, curiosamente ano de eleições legislativas.
A empregabilidade dos jovens foi outra das bandeiras que Costa levantou bem alto no JN. Só que se esqueceu de referir, como alertou outro dos inquiridos, que os vencimentos dos novos empregos não estão minimamente em linha com o custo de vida atual, sendo impeditivos de atos tão básicos como arrendar ou comprar casa e constituir família.
E quanto ao incremento da escolaridade e da qualificação dos mais novos, a resposta não podia ter sido mais assertiva:
“Portugal jamais será um país para jovens enquanto um estudante de Engenharia, após ter investido pelo menos cinco anos da própria vida a realizar uma Licenciatura e um Mestrado, saia da universidade a saber que não irá ganhar muito mais do que mil euros ao mês.
Portugal jamais será um país para jovens enquanto um quarto nas grandes cidades custar quase um ordenado mínimo, impossibilitando, portanto, o acesso de muitos à universidade dos sonhos. Infelizmente, faço parte da geração mais qualificada de sempre, mas que irá ter uma qualidade de vida pior do que as anteriores”, lamentou Carina Taves Lage, 18 anos, estudante de Engenharia Eletrotécnica na Universidade do Porto.
Estes jovens também são piegas?
A verdade é que muitos destes jovens extremamente qualificados já começam a licenciatura a pensar para onde irão imigrar no final do curso para poder ter um vencimento que lhes permita viver com o mínimo de qualidade.
Programas letivos desatualizados, infraestruturas escolares precárias e sem condições, um Plano Nacional para o Alojamento que, apesar de já apresentado várias vezes, continua sem sair do papel, a sucessão de estágios, na sua maioria, não remunerados, após o fim da licenciatura ou do mestrado, são apenas mais alguns exemplos elencados por estes jovens desiludidos com o “paraíso” de Costa.
Contrastando com este otimismo irritante, a realidade apresenta-se como nua e crua e o futuro desta geração passa por conceitos tão na moda como o co-living até aos 35 anos de idade e outros anglicanismos similares.
Ansiosos, tristes, sem esperança no futuro
A geração que já passou pelas crises de 2008, 2011, 2020 e 2022, incluindo uma pandemia sem precedentes e uma guerra, vê-se sem futuro, sem luz ao fundo do túnel, sem esperança, sem alegria.
Razões mais do que suficientes para justificar as conclusões do mais recente relatório do Estudo Health Behaviour in School-aged Children (HBSC/OMS), feito em colaboração com a Organização Mundial de Saúde.
De acordo com estes dados, os jovens portugueses estão mais infelizes, irritados, nervosos e tristes diariamente.
Comparativamente aos últimos dados disponíveis, datados de 2018, a satisfação dos jovens com a vida passou de uma média de 7,68 para 7,50 nos adolescentes de 13 e 15 anos. O mesmo se passa com a sua perceção de felicidade.
Mais ainda, cerca de 27% dos adolescentes em idade escolar revelou sentir-se infeliz, contra 18,3% em 2018. E 21% afirmou sentir nervosismo quase todos os dias, 15,8% mau humor ou irritação, 11,6% tristeza e 9,1% medo.
Seria de esperar que, depois de uma pandemia e no meio de uma guerra na Europa, quem tem poder para defender os nossos jovens fizesse bem mais do que vomitar falácias num jornal de referência.
Seria de esperar que fossem tomadas medidas sérias na área da Habitação, para que o seu futuro não passe de um sofá e uma cozinha dividida. E outras, que evitassem ter de andar de calculadora no supermercado.
A geração mais qualificada de sempre não consegue comprar nem arrendar casa, não tem emprego estável, não tem um vencimento compatível com as suas (muitas) qualificações e não consegue constituir família nem criar filhos, com todas as implicações demográficas que isso obviamente acarreta.
É uma geração ansiosa, triste, receosa, sem esperança no futuro, sem sonhos. Sr. primeiro-ministro, esta geração não precisa de propaganda, de autoelogios ou atos de narcisismo sem pudor. Esta geração precisa de um abraço forte e que o Governo comece a trabalhar para ela. Porque, caso contrário, será a geração mais qualificada de sempre da Alemanha, da França ou de um qualquer país nórdico.
