Com a Venezuela mergulhada num caos de causas várias, Nicolás Maduro é o presidente eleito e Juan Guaidó o legítimo pretendente que nenhuma autoproclamação de gabinete ou pública ascensão-meteoro pode erigir a líder máximo. Exigem-se eleições livres e o reforço da voz do povo na luta contra a crise política. A resolução da crise económica e social virá depois, tarefa ao cuidado dos eleitos que teimarão em desprezar quem os elege, assegurando todos os dias que jamais e em tempo algum o povo possa ter as mãos no seu destino.
A posição da União Europeia nem despreza a realidade nem a procura conformar. A Portugal, compete reforçar que não pode haver golpistas contra a democracia nem recentes eleitos contra o povo. As manifestações na Venezuela são impressionantes e esperançosas. Pacíficas, ainda que já tenha partido gente. O país parece fingir ou fazer de conta na encruzilhada. Como se Maduro não tivesse sido eleito para o largo período de governação 2019-2025, como se as Forças Armadas não estivessem com ele, como se o espectro de ilegalidade e fraude não estivesse sempre presente desde que Maduro ganhou as eleições perante o boicote de grande parte da Oposição, como se a Assembleia Nacional não tivesse sido esvaziada de poderes em 2017, como se não houvesse ingerência clara dos EUA e seus aliados no jogo de pelota de Guaidó. São demasiados terrenos mistos para um povo tão esperançoso. Começa a ficar evidente que a única alternativa se move a petróleo, entre eleições ou sangue.
O petróleo no centro da cilada. Quando Trump apoia de imediato a autoproclamação de Guaidó, sabemos estar perante um fenómeno que tresanda a estratégia antecipadamente concertada. Daí ao apoio de Bolsonaro foi um trote pequeno. A estes algozes não interessa a democracia ou os direitos humanos. A luta pela legalidade internacional e por uma mediação pacífica e democrática para a Venezuela é a única via que a União Europeia pode trilhar de forma responsável. Com cada vez menor margem para se poder salvar a si, que seja a Europa capaz de estender aos outros um princípio de equilíbrio pela sua política externa.
O pior que pode acontecer a quem luta pela liberdade nas ruas da Venezuela será ver a revolução que têm em mãos ser apropriada por forças externas que lhe retirem a soberania e a independência. Esse será o maior trunfo de Maduro: substituir a palavra "liberdade" pela palavra "independência", fazendo discurso e caminho. Que nenhum golpista lhe dê esse trunfo.
Artigo publicado no “Jornal de Notícias” a 25 de janeiro de 2019