Está aqui

A ditadura do empréstimo

Após a segunda grande guerra mundial iniciaram-se os "30 gloriosos anos" (1945-1973). Esta época que atravessou parte significativa da segunda metade do século XX, traduziu-se num pacto Capital/Trabalho. O Capital por um lado abandonava as formas mais desenfreadas de liberalismo, (curiosamente foram das alturas mais prósperas para o capitalismo e de onde se registou maiores acumulações de capital) por outro lado o Trabalho abandonava a suas reivindicações revolucionárias e a perspectiva de superação do regime, em troca de maior acesso aos bens de consumo, estabilidade laboral, progresso na carreira, entre muitos outros.

O Estado tinha a responsabilidade de ter um papel regulador e interventivo no mercado e de garantir políticas públicas activas - Serviço Nacional de Saúde, Escola Pública, Segurança no emprego e no desemprego, Segurança Social...

Com a ascensão do neoliberalismo o Estado Social e as suas políticas começaram de forma contínua a ser desmanteladas, e como tal, também a correlação de forças perante a acumulação de capital.

Isto é, durante o tempo do pós-guerra havia maior capacidade financeira por parte do factor trabalho, do que há hoje. Mas como é que isso é possível?

Se por um lado aumentou o fosso de rendimentos entre classes e se sucederam vários anos de desvalorização dos salários, por outro houve um acesso e um incentivo ao crédito brutal, conjugado com o abandono da intervenção do Estado em vários sectores.

Entre os muitos que sofrem com estas opções políticas e económicas estão também os jovens.

O caso português

Portugal tem actualmente 2 milhões de pobres, um endividamento de 135% por parte das famílias, 1,1 milhões de trabalhadores e trabalhadoras precários e 10% de desempregados.

É nesta conjuntura que milhares de jovens portugueses tentam construir o seu percurso de vida, o que se manifesta extremamente difícil uma vez que o aprisionamento ao empréstimo tem começado já aos 18 anos.

Esta realidade tem rostos claros. A desresponsabilização do Estado português, promovida pelos culpados de sempre (PS,PSD e CDS), está intimamente ligada à dificuldade de autonomização em relação à família nuclear e à banca por parte dos jovens.

A acção social escolar, que é manifestamente insuficiente e que exclui demasiadas pessoas, tem vindo a ser descapitalizada de forma contínua e tem sido substituída pelo incentivo ao empréstimo universitário, que nestes últimos 3 anos já abrange mais de 11.000 estudantes.

Estes mesmos jovens, terão que começar a pagar este seu empréstimo a partir do momento em que acabam os estudos, porém apenas 8 em cada 10 jovens em Portugal conseguem neste momento arranjar emprego - na maior parte das vezes precário.

Portanto, passarão os primeiros anos de vida activa a abater a dívida dos estudos, geralmente com o recurso a outro empréstimo e com um emprego precário, ao que seguramente acrescem os empréstimos do carro e da casa - se almejarem sair de casa.

Portanto, não é de construir uma vida de que falam os jovens em Portugal, é de sobreviver à ditadura do empréstimo e do futuro congelado.

Bem pode a elite portuguesa continuar com os discursos sebastianistas sobre o papel "das novas gerações" no futuro do país, quando se atinge a maioridade com uma hipoteca, não há fado que nos arraste.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Sociólogo.
Comentários (1)