Toda a gente sabe que a cultura é apenas um ornamento na sala das escolhas públicas e que as políticas culturais servem para promover processos de gentrificação, entreter a pobreza e pouco mais.
Ou então não.
Ou então a cultura e as artes são decisivas para construir a democracia, para forjar um modelo de desenvolvimento justo, para combater desigualdades.
Não discutir cultura é não discutir o país. É não discutir o mundo que temos e o que queremos.
As indústrias culturais, cada vez mais monopolistas, reproduzem e geram padrões sociais, moldam-nos com os mesmos enredos de sempre, as mesmas receitas formais, os mesmos protagonistas.
A cultura é espaço de combate a todos os conservadorismos, contra todas as opressões.
No trabalho, e somos perto de 200 mil pessoas a trabalhar na cultura em Portugal, praticam-se as mais abjetas formas de precarização.
No Bloco, por levarmos a cultura a sério, construímos alternativa à política minimalista, elitista e ingerente de quem tem governado.
Lutamos contra o poder das empresas que concentram a produção, edição e distribuição, como o das grandes editoras no mercado livreiro ou o monopólio da NOS na distribuição de cinema.
Disputamos a memória, contra os luso tropicalismos, os racismos e os machismos.
Exigimos recursos públicos para a criação artística, para o património, para sustentar redes de equipamentos que divulguem as artes em todo o território. Porque só assim se combate a concentração dos meios de produção culturais que, pelo seu poder simbólico, além do económico, precisam de ser democratizados.
Entendemos que não há ação política transformadora sem ação cultural. Uma ação que desenvolvemos também no nosso seio e que contribui para o nosso pensamento, formação e atividade política.
E vemos as condições de trabalho no setor como elemento central da política cultural.
E sobre isto queria lembrar como, na pandemia, vimos uma tomada de consciência e uma capacidade de organização coletiva, sem precedentes.
Como nunca antes, juntámos pessoas na luta contra as mesmas dificuldades: baixos salários, falso trabalho independente, falso outsoursing, ausência de direitos e de proteção social.
E fomos parte essencial quer na reorganização e construção de novos movimentos, quer no desenvolvimento de frentes amplas. Fizemos trabalho unitário que desafiou o sindicalismo rotinizado e juntou associações setoriais, grupos informais e experiências concretas de luta laboral, como as de Serralves, da Casa da Música, ou dos trabalhadores e trabalhadoras dos serviços técnicos para eventos.
Aliás, foi esta mobilização que fez a pressão necessária para a criação do Estatuto dos Profissionais da Cultura, cuja definição e implementação têm sido campo aberto onde disputamos a dignidade do trabalho no setor.
A luta tem sido intensa, mas a cada passo renovamos energia para o que falta:
Mais proposta. Somos indispensáveis. Os mais importantes avanços na área da cultura foram iniciativa do Bloco. À cabeça, a criação da Rede de Teatros e Cineteatros. Mais força para dirigir as lutas, mais capacidade mobilizadora, mais alianças. E mais ação e disputa dentro do campo cultural. Combater o poder dos que se acham donos da cultura. Mudar ideias feitas. Democratizar todas as práticas.