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De unicórnios e discursos vazios está Lisboa cheia

Chegados a abril, e quase meio ano depois da presidência de Moedas, nada de bom fica. Pelo contrário, há um caminho político que despreza as alterações climáticas, que aposta no carro para a mobilidade e que vê na habitação o negócio do costume.

Chegados a abril, e quase meio ano depois da presidência de Moedas, nada de bom fica. Pelo contrário, há um caminho político que despreza as alterações climáticas, que aposta no carro para a mobilidade e que vê na habitação o negócio do costume, sendo tudo isto temperado com uma incompetência latente que torna a gestão de cada assunto numa verdadeira novela. Toda esta linha errática é, contudo, acompanhada da simpática figura dos unicórnios (trazidos até à baila pela Vereadora Laurinda Alves a propósito do acolhimento das pessoas que fogem da guerra), sempre presente, como que para aligeirar os dramas que Moedas vai aprofundando.

Na mobilidade, tornou-se penoso assistir à dificuldade de Moedas (e do vereador Ângelo Pereira) em gerir o debate em torno da Almirante Reis. De forma afoita, Moedas começou por prometer em campanha que uma das primeiras medidas seria acabar com a ciclovia da Almirante Reis. Depois, começaram as dificuldades e, já no poder, Moedas cedeu mesmo ao populismo e à mentira quando referiu que a referida ciclovia era um problema para ambulâncias. Era mentira, toda a gente sabia que era mentira e continua a ser mentira. Moedas sabia que assim era mas, sem argumentos, não resistiu. E bem se podia ter poupado a este papel, já que, uns meses depois, apresenta-nos agora uma solução para a Almirante Reis que, espantemo-nos, é igual à solução inicial que o anterior executivo implementou. Anos a fio a criticarem uma solução para acabarem a defendê-la. A incompetência paga-se caro. A Almirante Reis tem certamente de ser debatida, sendo essencial garantir que esse debate é feito na garantia do direito ao espaço público, do direito à mobilidade suave, com respeito pela diminuição de emissões. Numa palavra: não regressando ao passado.

Em matéria de habitação, a primeira medida de Moedas era um truque de magia. Num ápice, propunha-se a fazer desaparecer milhares de candidatas ao programa renda acessível. Como? Não permitindo que quem vive fora de Lisboa – quem foi expulso da cidade, diga-se – se possa candidatar a este programa. Se fizermos desaparecer as pessoas, não há listas de espera, terão pensado. Foi um erro que a oposição evitou e que seria a cristalização da especulação, seria o sinal definitivo de que quem foi expulso da cidade jamais poderia regressar. De resto, nada de novo: um deslumbramento bacoco com tudo o que seja dinheiro, desde as concessões que não funcionaram e que não fazem sentido até à esperança de que a desregulação do mercado possa voltar em força para gentrificar o que ainda não está gentrificado, é tudo muito bastante revelador.

Esta tem sido a realidade sobre os dois maiores temas da cidade, a que podíamos juntar a trapalhada da nomeação do Provedor dos Animais, a forma como, de uma penada, se chutou para canto o caso de plágio do diretor municipal da cultura ou da bela lição de democracia que Moedas quis dar a toda a gente ao criar um conselho de cidadãos que, no ato de inscrição, pergunta se a pessoa é de algum partido.

A esperança, como se vê, não reside não reside nos unicórnios e em discursos vazios. A esperança radica nas mobilizações que ganharam o direito a uma ciclovia na Almirante Reis e na necessidade da construção de maiorias sociais que façam Lisboa avançar.

Sobre o/a autor(a)

Deputado Municipal do Bloco em Lisboa. Advogado. Licenciado em Direito e mestre em Ciências Jurídico–Criminais
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