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A crise das direitas tem sentido?

Na sequência dos resultados eleitorais em Lisboa, tanto o PSD como o CDS mergulharam numa crise vertiginosa. Era de esperar. O PSD tem o pior resultado de sempre, depois de ter governado a Câmara durante 6 anos, de ter escolhido Carmona para presidente e de se ter desentendido com ele. E, no PSD, o desgaste da direcção é muito acentuado e todas as oposições preferem a substituição de Marques Mendes. O CDS não elege, pela primeira vez na sua história, e percebe-se que teria tido mais hipóteses com a vereadora que abandonou o partido, Maria José Nogueira Pinto. Paulo Portas quis testar a sua liderança e perdeu. Era portanto de prever que os dois partidos de direita entrassem em convulsão.

No entanto, bem vistas as coisas, as suas derrotas são mais por incapacidade própria do que por força do PS. Com António Costa, o PS conseguiu mais um vereador e mais 2% do que nas eleições anteriores, quando a campanha de Carrilho se desagregou. Com seis eleitos, está demasiado longe de uma maioria absoluta. Mais: o PS tem uma votação comparável à dos dois candidatos PSD, Carmona e Negrão, somados. Isto não quer dizer que o PSD poderia ter ganho, porque a aritmética sabe pouco de política - pelo contrário, o PSD perderia sempre com Negrão, mas com uma lista unificada poderia pelo menos ter um candidato mais forte e ficaria colado ao vencedor.

Assim sendo, foi por derrocada interna que os dois partidos de direita perderam as eleições. As suas lideranças não têm credibilidade. E não têm credibilidade porque não têm política alternativa à do Governo Sócrates. De facto, quando os lugares-tenentes de Paulo Portas se apressam a justificá-lo e a encenar o seu silêncio com o argumento de que é preciso reflectir sobre as condições da política de oposição no regime actual, a verdade da sua vergonha é que a direita não consegue distinguir-se do envolvimento social das elites dominantes pela política do governo. O sucesso de Sócrates com essa elite pulveriza os esforços das direitas.

Por isso mesmo, os resultados à esquerda são interessantes. Helena Roseta começou com sondagens de mais de 20% e terminou com menos de metade, mas ainda assim com uma votação muito assinalável e que representa tanto algumas linhas de contestação à política urbana em Lisboa como sobretudo um voto de desconfiança em relação ao PS. A CDU e o Bloco perdem um pouco para Roseta, mais a CDU do que o Bloco, mas mantêm o grosso da sua votação, e a CDU consegue ainda eleger o seu segundo vereador, mesmo que por uma curta margem de votos. No total, estas três listas quase igualam a votação do PS, malgrado as suas diferenças.

A lição destes resultados é que a crise das direitas tem um sentido profundo. Esgota o seu espaço político, porque hoje têm pouco espaço social. E, por isso, o mais interessante da política futura é saber se a alternativa à esquerda consegue responder a esta crise social e ao vazio da política. Ora, as esquerdas estão a passar e vão passar por grandes alterações e por grandes mudanças.

Mudanças no movimento sindical, que precisa de ser mais aberto e socialmente envolvente. Mudanças na definição dos contornos dos projectos estratégicos, nomeadamente na resposta ao Tratado Europeu que reconduz o liberalismo e introduz a flexigurança. Mudanças na acção social, para que a esquerda socialista ganhe mais representação popular, e seja protagonista de uma política de acção.

Sobre o/a autor(a)

Professor universitário. Ativista do Bloco de Esquerda.
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