Está aqui

Código de Trabalho: o que propõe o Bloco?

Acabou na sexta-feira passada, dia 12, o prazo para entrega das propostas de alteração ao Código de Trabalho. Elas somam-se aos projetos que já estavam em discussão sobre questões laborais.

Nas próximas linhas, encontra-se a informação mais detalhada sobre o processo que está em curso e sobre as propostas que apresentámos no Parlamento.

Projetos de lei do Bloco que já estão na especialidade, que foram aprovados na generalidade em simultâneo com a proposta de lei do Governo:

  • Limitação aos contratos a prazo (redução da duração máxima, eliminação da norma sobre jovens à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração, redução para 50 – em vez de 750 – do número de trabalhadores das empresas que podem contratar a termo em início de atividade, clarificação do direito à compensação em todas as situações em que o contrato chega ao fim)
  • Combate ao abuso no trabalho temporário e ao outsourcing (limitação forte dos fundamentos e da duração, obrigação de vinculação à empresa utilizadora ao fim de um período, aplicação das regras dos trabalhadores da empresa aos trabalhadores em outsourcing)
  • Eliminação do banco de horas individual
  • Recebimento de compensação por despedimento deixa de impedir a impugnação em caso de ilicitude do despedimento (uma norma amordaçante que impede os trabalhadores de exercerem um direito que deve ser irrenunciável)

Além disso, junta-se ao debate sobre estas propostas e sobre a proposta de lei do Governo um outro projeto do Bloco, que já está em debate na especialidade desde 2016, a que temos dado grande importância:

  • Mais direitos para os Trabalhadores por turnos (subsídio por turnos, maior acompanhamento médico, definição de pausas e tempos de descanso e fins-de-semana, participação dos trabalhadores na definição das escalas de turnos, redução dos tempos de trabalho, majoração dos dias de férias, direito à reforma antecipada em proporção do tempo que se trabalhou por turnos)

O Bloco apresentou ainda várias alterações à proposta de lei do Governo, nomeadamente em quatro dimensões:

I) Alterações apresentadas pelo Bloco para eliminar as medidas da proposta de Lei do Governo que configuram mais precarização e que constituíram as contrapartidas oferecidas aos patrões para que estes assinassem o acordo de concertação, e que fundamentaram o nosso voto contra a proposta de lei do Governo:

  • Eliminar o alargamento de âmbito e de duração dos contratos de muito curta duração (Governo propôs que passassem a aplicar-se a todos os sectores de atividade e que fosse duplicada a duração)

  • Eliminar a extensão do período experimental para trabalhadores menos qualificados ou à procura do primeiro emprego (o período experimental é a mais precária das condições)

  • Eliminar o banco de horas fora da contratação coletiva

II) Outras alterações que apresentámos sobre aspetos essenciais nos quais a proposta de lei do Governo não quis mexer e que são, na maior parte dos casos, heranças da Troika que permanecem na lei laboral:

  • Devolução dos 3 dias de férias retirados pela Direita (voltar aos 25 dias, sem critério de assiduidade) 

  • Reposição dos valores do trabalho suplementar (cortados para metade pela Direita)

  • Reposição do descanso compensatório, em caso de trabalho suplementar

  • Fixar o período normal de trabalho nas 35 horas (além do benefício para o trabalhadores com emprego, permitiria criar mais de 200 mil postos de trabalho)

  • Impossibilitar que o contrato individual afaste os critérios definidos na lei relativos à mobilidade funcional e geográfica (que por vezes funcionam mesmo como mecanismos para assediar o trabalhador ou forçá-lo a despedir-se)

  • Despedimento: retomar o valor das compensações e as regras anteriores à intervenção da troika. No caso das compensações, instituir o princípio geral de um mês/por cada ano de trabalho prestado (neste momento, está em 12 dias). Eliminar o despedimento por inadaptação.

  • Retomar prazos de pré-aviso de greve, que foram alargados injustificadamente de 5 dias para 5 dias úteis para a generalidade das greves; de 10 dias para 10 dias úteis nos sectores que se destinem à satisfação de necessidades sociais impreteríveis

III) Alteração de normas relacionadas com a contratação coletiva, que já vêm de formulações anteriores a 2012:

  • Fim da caducidade unilateral dos IRCTs (instrumentos de regulação coletiva de trabalho)

  • Reposição do tratamento mais favorável ao trabalhador (para impedir que os contratos coletivos tenham normas piores que as da lei geral)

IV) Alterações sobre outras normas, designadamente questões que se têm colocado recentemente ou que são novas

  • Prever o dever de desconexão pela empresa e considerar assédio contacto fora desse horário.

  • Prever que são consideradas nulas as cláusulas que disponham, por exemplo, que ”o local de trabalho é todo o território nacional” ou que “o horário de trabalho se compreende entre as 00h e as 24h”. O empregador sabe que contrata para que o exercício da atividade ocorra num local determinado (excepto em profissões/atividades específicas), como também sabe que o trabalho desempenhado se verificará num determinado período temporal que não as 24 horas do dia. 

  • Prever que a consequência da cedência ilícita de trabalhador temporário deve ser vinculação à empresa utilizadora e não à ETT (nºs 3 e 4 do artº 173 do Código)

Há ainda outras matérias que foram objeto de projetos de lei próprios do Bloco para alterar o Código de Trabalho, e que se concretizaram em diplomas autónomos já entregues no Parlamento, nomeadamente:

  • Garantir subsídio de alimentação para todos os trabalhadores do privado (o subsídio de alimentação não está na lei, apenas nos contratos coletivos ou individuais), com valor mínimo igual ao do setor público (sem prejuízo de contratos coletivos que estabeleçam um valor superior)

  • Majoração do valor do subsídio de doença para trabalhadores com doença grave, crónica ou oncológica e garantia de um valor mínimo de subsídio de doença que corresponda ao SMN (atualmente é 55% no primeiro período, e pode ir até aos 70%)

  • Reforço do combate ao assédio no trabalho, dando força executiva às decisões da ACT e repartindo o ónus da prova, imputando à entidade empregadora provar que os factos identificados pelo trabalhador não constituem assédio.

As dezenas de alterações apresentadas pelo Bloco de Esquerda têm como objetivo reequilibrar as relações de trabalho, valorizar os salários e recuperar rendimentos, relançar a contratação coletiva, combater a precariedade, eliminar os cortes da troika que o PS quer manter, proteger os trabalhadores contra o assédio, lutar contra os abusos e contra a exploração que é permitida pelas normas que favorecem os patrões e que resultam da sua intervenção direta. Neste processo, assumimos a nossa responsabilidade: uma alteração significativa da lei do trabalho é uma condição de equilíbrio e de justiça, sem a qual à criação de emprego que tem acontecido neste período não corresponderá nenhuma alteração no padrão que persiste hoje no mundo do trabalho, de salários baixos e de precariedade.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda, sociólogo.
(...)