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Chile desperta

América Latina, um continente que luta para se levantar do jugo neoliberal e da “pata” do império do norte.

Inicia-se em Setembro de 1973, com um sanguinário golpe militar, o ciclo neoliberal no Chile, debaixo das botas cardadas dos militares do traidor Pinochet….

Eram os tempos da “Operação Condor”, em que o império do norte tentava de novo subjugar os povos do sul e a sua soberania aos interesses económicos e estratégicos próprios.

Foi o Brasil em 1964, o Chile em 1973, a Argentina em 1976, além de muitas outras operações na América Central… lembro-me das Honduras, Guatemala, invasão de Granada em 1983, por exemplo

A táctica era a mesma, aliciar chefias militares, prometendo armamento e modernização tecnológica, além do apoio político internacional às respectivas juntas militares, por parte da Casa Branca.

O resultado foi o que se sabe. Milhares de desaparecidos, milhares de mortos, milhares de detidos e regressões sociais tremendas com o aumento da miséria generalizada e, por outro lado, o aumento dos milionários. Uma desregulação social e laboral absoluta.

Timidamente, alguns governos foram dando umas migalhas, o que o sistema permitia, sem nunca colocar em causa o sistema neoliberal instituído nas ditaduras. Foi o caso do Chile com Bachelet. Mesmo assim já era muito para a oligarquia e as elites chilenas. Claro que uma meia solução não contenta ninguém, e a impopularidade fez a social-democracia, travestida de social-liberalismo, perder as eleições para a direita.

O resultado de todas essas tensões acumuladas no país mais desigual da América Latina, onde o salário mínimo pouco passa dos 300 euros, as pensões, generalizadamente, não chegam aos 250 euros e os preços das rendas e dos transportes estarão ao nível de uma cidade como Madrid, teve como rastilho a subida do preço da utilização do Metro em Santiago. Uma cidade guetizada onde aos bairros ricos não é possível aceder por transportes públicos, como salvaguarda da estanquicidade social.

Estudantes, jovens, a quem se juntam sectores sindicais como estivadores, mineiros, Central Única de Trabajadores, Asociacion Nacional de Empleados Fiscales-ANEF, CONFUSAM, FENPRUSS, Confederacion Coordinadora de Sindicatos del Comercio y Servicios Financieros, FEDASAP, Conderacion Bancária, CONFEDEPRUS, Sindicato Interempresa Lider SIL, Colegio de Profesores, FENATIS Nacional, aderindo outros como CONES – CONFECH – Chile mejor sin TLC, Cumbre de los Pueblos, FECH, FENAPO, FEURCIS e outros sindicatos, confluem na convocatória de uma greve geral. A que se juntam também as feministas e largos sectores da classe média, como garantia, de que algo tem de mudar no Chile. Nada pode ficar como antes.

Da declaração mineira ressaltamos o seguinte:

“No podemos dejar de paralizar, porque la historia nos condenará como cobardes y cómplices de estos atropellos a la clase trabajadora y lo mas íntimo y sentido es que no podemos dejar de paralizar porque no seremos capazes de mirar a la cara a nuestra família y principalmente a nuestros hijos que hoy están en esta lucha, sin sentir que no hicimos nada por apoyarlos y defenderlos, sabendo que ese poder y capacidad está en nuestras manos.

A paralizar, mineras y mineros, a paralizar toda la mineria de Chile junto a otros sectores produtivos, hasta que retiren a las fuerzas militares y opresoras de las calles y hasta que estén disponibles las autoridades de gobierno a sentarse a dialogar de igual para igual con este pueblo que clama y lucha por igualdad, justicia, oportunidades, trabajo y una vida digna para nuestra gente.

Saludos fraternales

Directorio Sindicato Nº1 de Trabajadores de Minera Escondida”

 

Depois do recolher obrigatório em Santiago, Valparaíso e Concepción, as três maiores cidades do Chile e mais de 4 dezenas de mortos, 12 jovens mulheres violadas pelos militares, 121 desaparecidos, entre eles a dirigente da Coordinadora de Estudiantes Secundarios, CONES, Valentina Miranda, raptada em sua casa, pelos Carabineros, milhares de torturados, desconhecendo-se, por agora, o numero total de detidos segundo informação da “Comisión Interamericana de Derechos Humanos”, creio vir a ser difícil qualquer tipo de diálogo com o responsável de tudo isto, algo que não se via desde os tempos da ditadura de Pinochet. Este governante, Sebastian Piñera, com uma história pessoal pouco recomendável, de colagem com a ditadura, há 2 dias usou linguagem bélica e mandou as tropas avançar contra os manifestantes que protestavam contra a desigualdade no Chile. Hoje, depois do balanço que se conhece, faltando saber muito, ainda, das organizações dos direitos humanos, vem pedir perdão, tal como fez também Lenin Moreno no Equador… e promete, promete muito…

Dizem as manchetes: "pedido de perdão" de Sebastian Piñera embrulhado em medidas sociais para travar protestos”, são elas: aumentos das pensões mínimas, complementos salariais, reformas no serviço público de saúde e o congelamento das tarifas de eletricidade. Como promessas escritas em papel molhado nada valem, convém o povo chileno precaver-se. Na verdade já não existirão condições políticas para este aprendiz de ditador continuar no cargo. Aguardamos o desenrolar dos acontecimentos, certos que só a luta e a mobilização cidadã poderá garantir a defesa de direitos e da dignidade para as classes trabalhadoras e mais desfavorecidas, como se comprova. A democracia é um exercício activo de mobilização constante e permanente da cidadania.

Os socialistas e revolucionários deverão estar solidários e activos com todos os povos que se mobilizam pela democracia, pelas liberdades democráticas, contra a ordem neo-liberal, por direitos, por soberania, por justiça, por igualdade. As oligarquias não servem senão os seus próprios interesses e, neste momento, os do império do norte.

Toda a América Latina está prestes a entrar numa convulsão generalizada, pré-revolucionária, ou num banho de sangue debaixo de novas ditaduras. Espero que as esperanças de todas as massas oprimidas e camadas intermédias para um mundo mais justo, mais fraterno, mais igualitário, com um verdadeiro sentido de democracia, política, económica e social, se concretizem. No culminar destas mobilizações gerais, desde Equador a Honduras, desde Colômbia ao Haiti, desde Costa Rica ao Chile, passando pela Venezuela e pela exigência do fim dos bloqueios ilegais, impostos pelo império usurpador do norte, EUA, que tanto prejuízo, fome, doença, miséria estão a trazer a essas sociedades e a esses povos, algo terá de ficar diferente, para melhor.

Cuba vive de novo um período de grande carência de todo o género, fruto do terrorismo económico imposto pelo novo bloqueio dos EUA/Trump. Um país que sempre fez da solidariedade com outros povos, inclusive através da medicina, uma das suas principais características. O bloqueio tem de acabar, será uma exigência de todos os democratas e socialistas.

Democracia, soberania, liberdade, justiça, solidariedade entre os povos, todo um programa para todo um continente. Todo um programa anti-império. Estejamos, pois, activos e solidários.

Sobre o/a autor(a)

Membro do Grupo de Trabalho para a América Latina do Partido da Esquerda Europeia. Dirigente do Bloco de Esquerda. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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