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CETA - o ataque à democracia

O acordo de comércio e investimento entre a União Europeia e o Canadá está prestes a entrar num ponto sem retorno.

A 21 de setembro entrará em vigor provisoriamente a parte do acordo relativa àquilo que se chama “competência exclusiva da União”. O que tem, obrigatoriamente, que ser ratificado pelos Estados-Membros está em curso, e pela União Europeia toda ainda nem meia dúzia de Estados o fizeram.

É fácil perceber o porquê: é um tratado altamente extenso e tecnicamente complexo, tendo suscitado dúvidas em alguns países sobre a conformidade com a constituição. Também tem uma abrangência como não se viu antes, por isso vai ter impactos diretos em tantas áreas como a saúde pública, o ambiente, a legislação laboral, os direitos de autor, a proteção de dados e o investimento.

Não ter pressas num processo de ratificação de um tratado como este seria aconselhável. Mas em Portugal não tem sido esse o caso. Desde a primeira hora que os governos envolvidos o incentivaram e apoiaram, sendo que este governo do PS tem tido uma pressa bastante grande para terminar o processo de ratificação no parlamento.

Com a existência de 3 debates públicos (realizados por determinação de resolução do parlamento) pouco participados e divulgados pelos cidadãos, o processo de debate público deixou muito a desejar e continua a não haver um conhecimento geral do que estamos a falar.

Agora, teremos também à pressa debate e votação para a ratificação do acordo. O Bloco de Esquerda sempre se manifestou contra o CETA e continua a defender que o tratado não pode ser ratificado. Não apenas pelas consequências gravosas para a saúde pública e ambiente, como têm alertado todas as organizações ambientais e de saúde; não apenas pelas consequências no nivelamento por baixo de padrões laborais, como tem alertado a CGTP-IN e os estudos feitos a nível europeu.

Mas também porque este tratado põe em causa vários aspetos da nossa constituição. É patente a violação do artigo 2º da Constituição da República Portuguesa (CRP), na medida em que é preterida a soberania popular, elemento estruturante do Estado de Direito Democrático. Mas também no artigo 13º, nº 1 “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”.

Analisando o acordo e comparando com este princípio constitucional, os cidadãos portugueses (bem como o próprio Estado, diga-se) não estão autorizados a recorrer a este mecanismo arbitral que é criado pelo acordo, colocando-os, desta forma, em situação de desigualdade no acesso à justiça. Este acesso é também regulado pela CRP, no seu artigo 20º (Acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva).

Como já temos vindo a defender1, o CETA é um acordo perigoso e faz entrar pela janela o que não entrou pela porta: foi o mecanismo encontrado pela Comissão Europeia de fugir, uma vez mais, ao escrutínio da sua ação. Por isso não vamos desistir desta luta, pois é relevante para os povos e para a democracia.


Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Licenciada em Ciências Políticas e Relações Internacionais e mestranda em Ciências Políticas
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