Caro Henrique Raposo,
Li o seu artigo com a atenção que se dá a um bom romance de ficção política: há drama, vilões e conspirações internacionais. Vamos por partes:
Os “laços” com o Hezbollah
Não tenho, nunca tive e não procuro. Nem laços, nem fitas, nem cachecóis comprados em Beirute, onde nunca estive. O Bloco de Esquerda defende a paz, os direitos humanos e a autodeterminação de todos os povos. Perceba que isso não significa subscrever agendas militares ou religiosas de qualquer grupo político ou miliciano.
A suposta “celebração” da morte de Charlie Kirk
Não sei em que campus universitários tem andado mas, ao que sei, os estudantes andam mais preocupados com os aumentos das propinas e com casas para arrendar do que com celebrações macabras. Pessoalmente, nem acompanhava as posições de Kirk. Atribuir-me (ou a uma tal de “esquerda woke”) a organização de um baile de máscaras para celebrar mortes é simplesmente ridículo.
A Al Jazeera como “menina querida”
A Al Jazeera é um órgão de comunicação social. Leio-a como qualquer outro: com espírito crítico e sem cartão de sócia. Curiosamente, esqueceu-se de mencionar que os repórteres da estação foram banidos por Israel – o Estado que caça cabeças de jornalistas na Cisjordânia e em Gaza – e mortos enquanto reportavam o genocídio. Mas não se preocupe: também leio o “Financial Times”, o “Público” e o “Expresso” (que dá espaço a devaneios como os do Henrique). E, tal como acontece com a Al Jazeera, isso não me torna acionista, cúmplice editorial ou responsável pelo que lá se escreve.
Comparações
A minha diferença com Ventura não está apenas no projeto político, mas também nos “amigos internacionais” que cada um escolhe. O líder da extrema-direita prefere antidemocratas, putinistas e outros protoditadores dos nossos dias. Eu faço alianças com quem defende direitos humanos, igualdade e liberdade. Em vez de trincheiras, procuro construir pontes. E se essa extrema-direita, ou mesmo o Henrique, é indiferente à morte de 28 crianças por dia, eu não sou. As pontes que quero construir neste momento são para alimentar um povo que morre de fome. Se o humanismo é a fronteira entre a civilização e a barbárie, diga-me, Henrique, de que lado está? Porque eu sei sempre onde estou.
Henrique, a política precisa de debate sério, não de intrigas de série B. Se quiser discutir ideias, cá estarei. Mas se for para falar de “ligações perigosas”, traga provas – ou, pelo menos, um bom argumento.
Com estima e um sorriso,
Mariana Mortágua
Carta publicada em expresso.pt a 20 de setembro de 2025