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Bares dos comboios – história da responsabilidade do Governo

Estes cerca de 130 trabalhadores estão numa situação muito preocupante: não receberam o salário de fevereiro, março continua uma incógnita e veem os seus postos de trabalho em causa. O Governo, através da CP, empresa que tutela diretamente, tem responsabilidade inequívoca sobre este drama.

Desde o dia 1 de março, cerca de 130 trabalhadores do serviço de bar dos comboios de longo curso da CP estão em luta. A situação não é nova, mas toma agora uma proporção dramática para a vida destes trabalhadores e suas famílias.

Em fevereiro, a atual concessionária, a Apeadeiro 2020, informou os trabalhadores que os salários de fevereiro não seriam pagos e que a empresa iria apresentar um Plano Especial de Revitalização (PER). A acrescer a isso, já em janeiro a empresa não pagou pontualmente os salários, em virtude de uma penhora de saldos bancários ordenada pelo Estado.

Estes cerca de 130 trabalhadores estão numa situação muito preocupante: receberam o salário do mês de janeiro tardiamente, não receberam o salário de fevereiro, março continua uma incógnita e veem os seus postos de trabalho em causa. Encontram-se, há vários dias acampados em Santa Apolónia e em Campanhã, em protesto pelos seus direitos e pelos seus salários.

Poderia parecer, deste relato, que há apenas um responsável, a Apeadeiro 2020. Mas não é assim. O Governo, através da CP, empresa que tutela diretamente, tem responsabilidade inequívoca sobre este drama.

Em primeiro lugar, porque a utilização de empresas privadas externas para este serviço tem sido a escolha da CP. Não tinha que ser assim. Até porque, além da vida destas 130 pessoas, está em causa o próprio serviço de bar nos comboios, com prejuízo para utentes. Este modelo não serve a ninguém.

Em segundo lugar, é a CP e a tutela que têm que conhecer as empresas a quem concessionam este serviço. Incrivelmente, acabam sempre por ser empresas que deixam os trabalhadores numa situação de incerteza permanente.

Em terceiro lugar, a condução deste processo, por parte da CP e do governo, tem negligenciado consecutivamente a situação laboral destes trabalhadores, quando tinha a obrigação de garantir que todos os postos de trabalho são assegurados e os direitos são cumpridos.

Não é admissível que a CP, uma entidade 100% pública, não tome uma posição célere e assuma a condução do processo, já que é a entidade adjudicante destes serviços e que, por isso, escolhe quem lhe presta os serviços, segundo os critérios que determina. A externalização deste serviço e a sua não internalização é um fator determinante para que situações como esta se continuem a repetir.

Entretanto, já no dia 8 de março, após uma reunião de tentativa de negociação entre Governo, CP e Apeadeiro 2020, percebeu-se que não resultou nenhuma conclusão em defesa dos trabalhadores e dos postos de trabalho.

Depois disso, no dia 10 de março, a CP fez saber que iria desencadear os mecanismos legais com vista à resolução do contrato de concessão, avançando para um novo concurso, com um novo concessionário.

Hoje mesmo, após nova reunião, os relatos não são animadores e, na verdade, todo este processo pode prolongar-se no tempo, entre recursos e lançamentos de novos concursos.

Enquanto tudo isto decorre, mantém-se um problema: os 130 trabalhadores continuam sem salário. Se a situação geral de perda de poder de compra, estagnação de salários e aumento brutal de preços já é uma dificuldade para os trabalhadores portugueses, imaginemos para quem não recebe salário.

Por isto mesmo, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda requereu, na comissão de economia, a audição do Ministro das Infraestruturas, João Galamba, do Conselho de Administração da CP e da FESAHT, federação de sindicatos. A responsabilidade do Estado é óbvia, precisamos de mais esclarecimentos por parte da tutela e de compromissos para soluções.

Mas o que fez o Partido Socialista? Chumbou este requerimento. Na verdade, não há qualquer justificação que valha a estas 130 pessoas que continuam sem salário. Aliás, este agora é o hábito do PS. Ministros no parlamento, é como o diabo a fugir da cruz. Assim, não é possível confrontar com os problemas que tantas vezes se recusam a ouvir diretamente dos trabalhadores e não é possível perceber que soluções estão equacionadas.

Continuamos a manter uma forte solidariedade com estes trabalhadores. Para aqueles que clamam pela entrada dos privados pelo setor do transporte ferroviário adentro, já sabemos que essa solução não vale a quem trabalha. E para o PS e governo, a hora agora é de responsabilidade para com estes trabalhadores, que prestam um serviço fundamental ao serviço público de transporte.

Insistiremos com novo requerimento, não desistimos de obter respostas e soluções. Estes trabalhadores são essenciais para o funcionamento dos comboios, a concessão é uma obsessão que está a destruir o serviço público e a deixar trabalhadores sem salário. A questão é: até quando?

 

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Licenciada em Ciências Políticas e Relações Internacionais e mestranda em Ciências Políticas
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