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"Assunção Cristas, acha normal?!"

O que Assunção Cristas nos conta - achando isso normal - é que, ainda durante a maior crise financeira desde 1929, o seu Governo não achou importante debater o sistema bancário. É uma revelação grave, que nos confirma duas coisas.

Assunção Cristas deu recentemente uma entrevista em que fez duas afirmações que merecem destaque. A primeira é que nunca, no tempo do anterior Governo, os assuntos da Banca foram a Conselho de Ministros. O que Assunção Cristas nos conta - achando isso normal - é que, ainda durante a maior crise financeira desde 1929, o seu Governo não achou importante debater o sistema bancário. Nem as causas que levaram à injeção de milhares de milhões de euros em vários bancos, entre eles o Banif e o BES. Nem os problemas que persistem no balanço dos bancos e que são um impedimento real à recuperação económica.

É uma revelação grave, que nos confirma duas coisas. A primeira é que, na obsessão pela redução dos custos do trabalho e dos gastos públicos, o problema financeiro não foi considerado como a principal causa da crise. A segunda é que o Governo de Passos e Portas nunca teve intenção de resolver os problemas da Banca. Navegou à vista, lidando com o que aparecia, e deixando o resto para quem viesse a seguir.

A segunda afirmação, que me parece igualmente grave, diz respeito ao tema Paulo Núncio e do seu passado profissional.

Segundo Assunção Cristas, não há qualquer relação entre as funções desempenhadas por Núncio nas sociedades de advogados por onde passou e a sua ação governativa. É compreensível que, sendo presidente do CDS, Cristas considere a situação normal. Deve ser tido em conta que, de Lobo Xavier a Diogo Feio, são vários os altos quadros do partido ligados aos departamentos de fiscalidade de importantes escritórios de advogados.

Em teoria, nada impede que um advogado possa assumir funções governativas. Na prática, há muitos tipos de advocacia, e tudo depende da atividade que se desempenha. O problema surge quando um advogado, como Núncio, faz carreira a ajudar empresas e pessoas a contornar o mesmo sistema que depois, como secretário de Estado, é suposto proteger. E quando, depois de conhecer bem a máquina, volta à sua atividade de aconselhamento privado.

Que Assunção Cristas não perceba o problema desta relação mostra bem como a porta giratória entre o poder público e os negócios não incomoda o CDS, muito pelo contrário.

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” em 14 de março de 2017

Sobre o/a autor(a)

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
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