Terá sido uma oportunidade deliberadamente perdida para repor equilíbrios sociais básicos através do afastamento dos mecanismos que comprimem a contratação coletiva e o princípio básico do tratamento mais favorável ao trabalhador e para expurgar da lei tantas nomas amordaçantes do trabalhador.
É uma escolha carregada de significado política de quem, podendo, prefere não mexer na lei laboral para conseguir a simpatia do patronato. Teria sido essencial que tivessem escutado o recado humanista de Jorge Leite. Que percebessem na sabedoria e no sentido de justiça do seu magistério e da sua vida um desafio à conformação da nossa sociedade por regras de equilíbrio e de respeito pelo trabalhador.
Sim, é tão simplesmente de respeito humano elementar que se trata. Uma lei que permite a um patrão inscrever no contrato de trabalho que o trabalhador presta serviço onde quer que seja no território nacional e depois logo se vê; uma lei que impede que o trabalhador que recebeu a retribuição a que tem direito possa, por isso, impugnar o seu despedimento injusto; uma lei que permite ao patrão mandar o trabalhador gozar férias nos dias que antecedem o despedimento, uma lei assim cauciona a humilhação do trabalhador, falta-lhe ao respeito e institui a falta de respeito como lei.
Quem aprendeu com Jorge Leite, aprendeu esse princípio superior de que o Direito do Trabalho, sendo fundado na proteção da parte mais frágil, é-o por respeito fundo para com quem só tem a sua força de trabalho para se fazer valer. É esse imperativo ético, que é anterior à lei e que ela serve (ou se recusa a servir), que Jorge Leite vincou sempre. O mesmo imperativo ético que Jorge Leite sempre invocou para denunciar a obscenidade que é um administrador ter um salário centenas de vezes superior ao do trabalhador da sua empresa.
Moralismos, dizem com desdém os cínicos do costume. Pois é, é esse sentido ético firme que faz do pensamento de Jorge Leite um engulho para os que põem a produtividade, a competitividade, o equilíbrio das contas ou o desequilíbrio das forças antes do respeito pelo trabalhador.
Artigo publicado no diário “As Beiras” a 6 de julho de 2019