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Amazónia

O pulmão do planeta arde mais do que nunca, o Presidente [do Brasil] em exercício é responsável por uma política activa de destruição da Amazónia.

Eliane Brum escreveu, no El País, uma magnífica análise sobre o Brasil actual. É o retrato de uma sociedade que se sente doente. A forma como descreve os impactos da polarização política e a degradação social na população é um murro no estômago. Eliane Brum desmonta, um por um, os argumentos tantas vezes repetidos que procuram justificar uma suposta trajectória política linear que trouxe o Brasil à eleição de Bolsonaro. Quantas vezes ouvimos falar em “jogo democrático”, “normalidade” ou “autenticidade” nos tempos políticos que vivemos? Pois, não há nada de “normal” e o que muitas vezes se proclama de “autêntico” é tão simplesmente sintoma de uma democracia também ela doente.

O que se vive no Brasil é agravado por instituições fracas, incapazes de confrontar o poder ou impedir a violência perpetrada pelo governo e pelo Presidente. O Brasil não é caso único, mas essa fragilidade institucional, quando comparada com outros países, é uma condição agravante. Pensemos no que se está a passar na Amazónia e na absoluta irresponsabilidade de um Presidente que decide acusar as ONGs ambientalistas de incendiárias, supostamente por retaliação aos cortes governamentais. Bolsonaro disse que era esse o seu “sentimento” porque as “ONGs perderam a boquinha” que as alimentava e bastou-lhe isso, não precisou de provar nada. O pulmão do planeta arde mais do que nunca, o Presidente em exercício é responsável por uma política activa de destruição da Amazónia, de desmantelamento das estruturas de fiscalização das queimadas, de promoção do desmatamento, de ataque às comunidades indígenas e à biodiversidade, e, perante tudo isto, ocorre-lhe apenas identificar um inimigo e torná-lo alvo de todo o ódio que possa acumular. Não há nada de verdadeiro nem de autêntico. É mesmo só o jogo político de um crápula irresponsável.

Foi também no Brasil, há quase quarenta anos, que as Nações Unidas deram o primeiro passo para juntar os líderes mundiais e discutir a sério as alterações climáticas e a protecção ambiental. A Cimeira da Terra de 1992 teve, pelo menos, esse simbolismo de pôr na agenda a evidência científica e a urgência de resposta que procure evitar um caminho irreversível. Foi nessa conferência que se criaram as bases para o Protocolo de Quioto, um compromisso quase global para a redução de emissões de carbono. A Cimeira da Terra morreu, o Protocolo de Quioto também. Estão a ganhar o mercado livre, a sobre-exploração dos recursos e a política ignorante.

A economia só se tornou mais verde no papel. Quatro décadas volvidas, estamos mesmo a perder o jogo. É hora de assumir que a lógica da sustentabilidade já não chega, que acabou por transformar-se num apenso de um modelo capitalista predador. Precisamos de uma verdadeira agenda para os bens comuns e para a sobrevivência do planeta. Resgate-se a política, e a vida. Comecemos pela Amazónia.

Artigo publicado no “Diário de Notícias” a 24 de agosto de 2019

Sobre o/a autor(a)

Eurodeputada, dirigente do Bloco de Esquerda, socióloga.
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