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A agulha, o chicote e o altar

Gastar do erário público 5,4 milhões de euros para construir um altar é uma ofensa ao sofrimento por que passa a maioria do povo português, é um escândalo, é um ato contra os ensinamentos do evangelho, é um ato contra a república laica.

A polémica está instalada!

Um altar para a Jornada Mundial da Juventude Católica vai custar do dinheiro dos impostos pagos pelos portugueses 5,4 milhões de euros!

Mas o total dos gastos com este Encontro está calculado em cerca de 80 milhões de euros!

E isto são previsões.

E sabemos, como nas grandes obras em Portugal vai uma diferença entre as previsões e a realidade na concretização das obras que sempre custam mais e por vezes muito mais. Olhemos o exemplo, recente, do Hospital Militar.

Num país de mais de dois milhões de pobres é um escândalo estes gastos faraónicos para um encontro de católicos e a vinda do Papa.

O Eng. Moedas tem o descaramento de dizer numa entrevista que a questão é se queremos que venha o Papa ou não.

Olhe que não Sr. Presidente da Câmara. 

A questão é se lemos o Evangelho.

Não podemos esquecer, como afirmou num grande comício no Coliseu dos Recreios o que disse o Padre Max, candidato a deputado, lendo o Evangelho: “é mais fácil um camelo passar no buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus – Palavras de Jesus.” E por isso o Padre Max foi assassinado com uma bomba pelos fascistas, quando era candidato a deputado!

A questão é se para a vinda do Papa é preciso a opulência, o gigantismo imperial e dos negócios escondidos sob a capa da religião.

Porque se escondem partes do Evangelho como aquele episódio transcrito nas escrituras onde o Cristo expulsa os vendilhões do templo à chicotada?

O Eng. Moedas já repetiu e repetiu que pediu 7 orçamentos e que adjudicou o mais barato.

Olhe que não é essa a questão Sr. Presidente da Câmara. A questão é gastar 5,4 milhões de euros para um altar quando falta comida na casa dos portugueses e quando faltam casas para o povo viver com dignidade em Lisboa.

A questão, Eng. Moedas, é que 5,4 milhões de euros permitiriam dar acesso a habitação pública a muitas famílias em Lisboa, com rendas acessíveis e compatíveis com os salários, ou a retirar das ruas as pessoas em condição de sem abrigo.

A questão é que para colocar habitação pública disponívela preços que o povo possa suportar, não há dinheiro porque estamos em guerra, porque tivemos a COVID, porque estamos em crise, porque temos uma grande dívida pública, porque…, porque…, porque….

Mas para construir um altar faraónico que não vai servir para mais nada já não existem estes “porques”, já não existem estas razões.

Neste caso contra todos os ensinamentos do Evangelho.

Mas também temos as razões republicanas.

Somos uma República laica!

Porque tem o Estado que financiar realizações da Igreja Católica? Se os evangélicos resolverem fazer em Portugal uma realização semelhante, o Estado também irá financiar? E se forem os maometanos o Estado irá atuar de igual forma? E se forem os budistas? Etc. etc.

O Eng. Moedas diz que este altar irá projetar Portugal no mundo com uma realização desta envergadura!

Para quê? Para aumentar ainda mais a promoção da monocultura do turismo que em Lisboa retira cada vez mais casas aos trabalhadores e reformados lançando a especulação imobiliária, expulsando-os da cidade para cada vez mais longe de Lisboa?

Gastar do erário público 5,4 milhões de euros para construir um altar é uma ofensa ao sofrimento porque passa a maioria do povo português, é um escândalo, é um ato contra os ensinamentos do evangelho, é um ato contra a república laica!

Sobre o/a autor(a)

Engenheiro, ex-autarca de Lisboa
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