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Iraque: Mais pessimistas e inimigos dos EUA
Quatro anos depois de serem invadidos pelos Estados Unidos, os iraquianos se mostram mais pessimistas sobre o seu futuro e mais inimigos dos seus supostos libertadores, afirma uma pesquisa divulgada esta semana pela BBC, ABC News, USA Today e pela rede alemã de televisão ARD. A pesquisa, que incluiu 2.200 pessoas em todo o Iraque, foi patrocinada pela ARD, BBC da Grã-Bretanha e ABC News dos EUA, bem como pelo jornal de maior circulação neste país, o USA Today, e realizado pela consultoria D3 Systems, com sede no Estado da Virginia. Todos os pesquisadores eram iraquianos.
Artigo de Jim Lobe, da IPS (Inter Press Service), publicado também no site da revista digital Envolverde.
De longe, a segurança é a maior preocupação dos iraquianos, particularmente em comparação com os resultados de pesquisas semelhantes feitas em 2004 e 2005. Quase dois em cada três iraquianos disseram estar preocupados "em grande parte" de eles ou alguém de suas famílias converter-se em vítima da violência que assola o país, e quase metade (47%) disseram ter um amigo ou um parente próximo fora de casa que foram fisicamente prejudicados por algum ataque.
Quarenta por cento culparam pela maior parte da violência os Estados Unidos ou as forças da cocoligação que encabeça (31%), ou o presidente George W. Bush (9%). Por outro lado, 18% responsabilizaram a rede terrorista Al Qaeda, do saudita Osama bin Laden, ou combatentes islâmicos estrangeiros; 19% as milícias sunitas ou xiitas ou conflitos sectários, e 7% o Irão. Setenta e oito por cento dos consultados disseram ser contrários à presença dos Estados Unidos e das forças da coligação. Essa oposição cai para 32% entre os que se manifestaram contrários "em certa medida" e para 46% entre os "firmemente" contrários.
Numa pesquisa da BBC feita no final de 2005 a proporção dos que rechaçavam a ocupação era de 65%, e noutra, realizada em 2004, foi de 51%. Além disso, quase seis em cada 10 consultados (59%) acreditam que agora os Estados Unidos "controlam" os acontecimentos no Iraque, contra apenas 24% em 2005, ano no qual ocorreram duas eleições. Por outro lado, a proporção dos que dizem que é o governo iraquiano que tem o controle caiu de 44% há dois anos para 34% hoje.
O estudo, feito com entrevistas pessoais entre 25 de Fevereiro e 5 de Março, também regista um grande aumento dos que consideram aceitáveis os ataques contra as forças da coligação: eram 17% em 2004 agora são 51%. Está porção, porém, é ligeiramente menor aos 60% que haviam assumido esse ponto de vista numa pesquisa divulgada em Setembro pelo Programa sobre Atitudes Políticas Internacionais (Pipa) da norte-americana Universidade de Maryland. Mas apenas 12% disseram que os ataques contra forças do governo iraquiano devem ser considerados aceitáveis, enquanto 88% disseram ser inaceitáveis.
Como no estudo do Pipa, a pesquisa encontrou importantes diferenças entre os próprios iraquianos, segundo as suas identidades religiosas ou étnicas. Os curdos, que são entre 15% e 20% da população nacional, foram os menos pessimistas e antinorte-americanos de todos os grupos. Já os árabes sunitas, que representam cerca de 20% da população, se mostraram os mais pessimistas e antinorte-americanos. E os xiitas, que são aproximadamente 60% dos iraquianos, manifestaram uma posição intermediária.
"Os pontos de vista iraquianos parecem seguir uma tendência geralmente negativa", disse Stephen Weber, que ajudou a preparar a pesquisa do Pipa feita em Setembro. "As diferenças entre grupos sectários continuam sendo muito acentuadas", disse, enfatizando as respostas sobre se a coligação liderada por Washington estava ou não equivocada quando invadiu o Iraque em 20 de Março de 2003.
Enquanto quase quatro em cada cinco entrevistados xiitas a consideram justa, apenas 2% dos sunitas concordaram e 78% disseram que estava "absolutamente equivocada". Durante a queda do regime de Saddam Hussein (1979-2003), a minoria sunita teve uma presença predominante no aparelho do Estado e da economia, em detrimento da maioria xiita e dos curdos subjugados no norte.
A pesquisa confirmou que os cidadãos de Bagdad e da província de Al Anbar, no centro-oeste, - principais objectivos de aproximadamente 30 mil soldados que Bush vai enviar para se somarem aos 140 mil que já estão no Iraque - são os que se sentem mais inseguros de todos os iraquianos. Cerca de 80% dos consultados na capital e na região central descreveram a situação como "bastante má" ou "muito má". Isto representa o dobro da percentagem registada em outras regiões.
Nas duas últimas semanas, altos funcionários civis e militares dos Estados Unidos, incluindo o próprio Bush, alegaram que a maior presença militar reduziu a violência em Bagdad, em particular, embora acrescentando que demoraria pelo menos mais seis meses avaliar seu impacto. "Levará mais tempo para a nova estratégia ter efeito", disse Bush na segunda-feira, no discurso do quarto ano da invasão. "E haverá dias bons e maus pela frente, na medida em que se desenvolver o plano de segurança", acrescentou, pedindo ao público e ao Congresso paciência para avaliar a estratégia de Washington.
A última pesquisa não é completamente negativa a respeito dos esforços dos EUA no Iraque, embora 69% tenham dito que acreditam que a presença dessas tropas piorou a segurança e 82% afirmaram não terem muita confiança (30%) ou nenhuma em absoluto (52%) nas forças de ocupação norte-americanas e britânicas. Mas apenas 35% disseram querer que as forças norte-americanas "partam agora" (o que supõe um aumento em relação aos 26% de 2005), enquanto 38% disseram que deveriam "ficar até a segurança ser restabelecida", e 11% disseram que deveriam "ficar até que as forças de segurança iraquianas possam operar de modo independente".
Bush também poderia se consolar com uma maioria de 57% que não acredita que o Iraque viva uma "guerra civil". Destes, 46% consideram que "de certo modo é improvável" que se trate de uma guerra civil e 11% que é "muito improvável". Além disso, 47% (mesma proporção de 2005) disseram acreditar que a invasão foi positiva. Quarenta e três por cento dos iraquianos disseram preferir um governo democrático a um encabeçado por "um líder forte" (34%) ou um "Estado islâmico" (22%).
Entretanto, inclusive este aspecto mostrou acentuada queda do optimismo em relação a 2205, quando 57% dos entrevistados haviam escolhido a democracia. Cinquenta e três por cento expressaram a convicção d que em cinco anos o Iraque terá um governo democrático. Mas a esmagadora mensagem da pesquisa é de crescente insatisfação e pessimismo. Apenas 39% dos consultados (contra 71% de 2005) disseram que as coisas estavam relativamente bem em suas vidas. Cinquenta e oito por cento afirmaram que as suas vidas eram iguais (22%) ou piores (36%) do que antes da invasão, e dois terços disseram que as coisas iam pior para o país (contra 53% em 2005).
Quarenta por cento dos consultados pensam que o país estará economicamente melhor dentro de um ano, o que representa uma forte queda em relação a 69% que diziam o mesmo em 2005. A pesquisa encontrou uma esmagadora insatisfação com os serviços básicos. Sete em cada 10 entrevistados qualificaram como maus os cuidados médicos e o acesso à água limpa. Oito em cada 10 consideraram negativa a situação do emprego e o fornecimento de combustível para cozinha ou veículos, neste país produtor de petróleo. E nove em cada 10 disseram que é mau o serviço de electricidade. Também foram maioritários os que não expressaram esperança de que a situação em cada sector melhore no próximo ano.
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