Interruptibilidade: a renda dos grandes grupos industriais

Cerca de meia centena de empresas são financiadas pelos consumidores de eletricidade pela prestação de um serviço que até hoje nunca foi utilizado. Esta renda não parou de aumentar e em 2015 atingiu 110 milhões de euros. Por proposta do grupo de trabalho formado pelo Bloco e pelo governo, as regras foram mudadas no Orçamento.

07 de julho 2017 - 11:54
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Portucel Setúbal, fábrica de papel, 2013 – Foto de José Luís Costa/Lusa

O serviço de interruptibilidade foi estabelecido em 2010 para gerir a procura no sistema elétrico. Cerca de meia centena de indústrias consumidoras intensivas de energia estarão disponíveis para, em caso de escassez de oferta de eletricidade, reduzir o seu consumo e assim retirar carga da rede.

Sucede que este serviço é largamente sobredimensionado, visto que a segurança do abastecimento está garantida pela excedentária capacidade eletro-produtora existente em Portugal e pelas centrais paradas mas em estado de prontidão (remuneradas por contratos de garantia de potência).

Segundo informação da REN, nunca ocorreu qualquer interrupção do consumo de qualquer das unidades industriais remuneradas por estes contratos. Paradoxalmente, entre 2011 e 2016, duplicou o valor total da remuneração, atingindo 110 milhões de euros. No total, o sobrecusto já ultrapassou os 500 milhões de euros. Calcula-se que cada família pague em média um euro por mês na conta da luz por causa desta renda. Em 2015, o setor dos serviços pagou 39 milhões de euros a mais na fatura da eletricidade e a pequena indústria 29 milhões.

O número de empresas abrangidas por esta renda também aumentou ao longo do tempo. Da CUF, às celuloses e às cimenteiras, estes grandes consumidores têm recebido o subsídio em troca de uma redução do consumo que até hoje nunca foi necessário. O dinheiro vai parar aos bolsos dos acionistas, sem qualquer contrapartida para o sistema elétrico. No caso das celuloses, estas unidades são autosuficientes em termos energéticos, por serem também produtores de eletricidade em cogeração, razão pela qual não poderia proporcionar, em caso de necessidade, qualquer alívio de carga na rede.

Entre as várias propostas pelo grupo de trabalho formado pelo governo e o Bloco para cortar nas rendas da energia está um novo regime para o serviço de interruptibilidade, impondo a realização de concurso e aliviando a fatura dos consumidores em cerca de 60 milhões de euros anuais, sem prejuízo da viabilidade da Siderurgia Nacional (2,4% da energia consumida em Portugal), que tem hoje na remuneração deste serviço um apoio face aos seus custos energéticos excecionais. Foi nesse sentido a proposta do Bloco incluída na lei do Orçamento do Estado para 2017.

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