Segundo a DECO, entre 2014 e 2016, 13 quilos de gás butano passaram a custar menos 6,24 euros, mas o preço de venda ao público da garrafa de 13 quilos de gás caiu apenas 2,77 euros. Uma das razões para a diferença crescente entre o custo da importação e o preço de venda ao público é a elevada concentração de mercado, com as empresas – Galp, Rubis, Repsol e OZ, além da Prio, no propano – a aumentarem as suas margens à custa dos consumidores, que não têm alternativa.
Outro elemento a ter em conta nesta análise de mercado é a disparidade dos preços consoante a zona do país para este bem de primeira necessidade. E comparando com Espanha, onde foram impostos preços máximos, a diferença é evidente: ali, a mesma botija que é vendida em Portugal por 23 euros, está a venda por 13 euros. O governo reconhece que o gás de garrafa é utilizado por 75% da população portuguesa e que o preço de referência calculado para Portugal é cerca de metade do preço de venda ao público, revelando um “comportamento anómalo” do mercado.
Em junho deste ano, o Bloco entregou na Assembleia da República um projeto de resolução que recomenda ao governo um sistema de determinação dos preços máximos de venda das botijas de gás GPL, butano ou propano, ao longo da cadeia e ao consumidor final. “Os preços máximos, fixados com regularidade mínima semestral, deverão refletir a evolução das cotações da matéria-prima e dos custos de comercialização”, aponta a proposta.
Em entrevista dada em junho à TSF, o secretário de Estado da Energia manifestou abertura para avançar para a fixação administrativa de preços, caso o preço de venda das botijas não se aproxime do praticado do mercado espanhol.
Os contratos “take or pay” no gás natural que a Galp escondeu
Com a transposição, em 2006, das diretivas que obrigaram à separação das atividades de transporte, distribuição e comercialização de gás natural, o governo definiu o modelo de reestruturação do setor do gás, retirando à Galp as atividades de transporte e às suas distribuidoras o monopólio da comercialização. Porém, manteve a Galp privada como titular dos contratos "take or pay", celebrados nos tempos de propriedade pública da empresa com a Argélia e a Nigéria. Estes contratos obrigam à compra, ao longo dos anos, de uma quantidade pré-determinada de gás, mesmo que as necessidades de consumo sejam inferiores.
Ou seja, o risco de consumo é partilhado pela Galp com os consumidores, que o pagam na fatura. Ora, a Galp pôde, enquanto titular dos contratos “take or pay”, revender os excedentes de gás natural ao longo de mais de uma década, mas não partilhou com os consumidores os ganhos realizados com esse excedente pago por estes.
Como o consumo de gás natural em Portugal caiu desde 2009, os excedentes acumularam-se. Ao mesmo tempo, a procura internacional aumentou (sobretudo do Japão, desde o acidente nuclear em Fukushima). Os preços dispararam. Segundo a ERSE, os lucros da Galp com estes contratos, entre 2010 e 2026, poderão atingir 1.158 milhões de euros. Nas contas do governo do PSD/CDS, as mais valias obtidas pela Galp entre 2006 e 2012 somaram mais de 300 milhões de euros - e nunca foram partilhadas com os consumidores.
Nos últimos anos, os governos tentaram ter acesso aos contratos “take or pay”, que deveriam estar depositados no Ministério da Economia e na Direcção-Geral de Energia e Geologia por vincularem o Estado português, enquanto concedente, quando foram assinados. Mas os contratos desapareceram e a Galp passou três anos a ocultar esses documentos quer do governo quer da entidade reguladora. As ameaças de contraordenação por parte da ERSE e o aumento da pressão política sobre a Galp obrigaram a empresa a entregar os contratos no último ano, passando assim a conhecer-se o preço de base do gás natural consumido em Portugal. Foi assim que, segundo o governo, em 2016, os preços do gás canalizado diminuiram para os consumidores domésticos em 18%. Para a indústria, essa queda foi de 22% a 28%, na média e na baixa pressão, respetivamente.