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Entrevista a Walden Bello: "Vivemos um período revolucionário"

O filipino Walden Bello é uma das figuras de referência do Fórum Social Mundial, desde a sua criação. Bello é o presidente da "Freedom from Debt Coalition" e activista da "Focus on Global South". Em entrevista ao Esquerda.net, falou-nos da crise mundial, das respostas possíveis e  das lutas trabalhadores no Sul e Norte do planeta.

Entrevista de João Romão no Fórum Social Mundial.

 

Quais as características essenciais da crise contemporânea mundial?

Esta é uma crise global, de sobre-produção, de longo prazo e rápida difusão. Não é uma recessão mas uma depressão. As respostas conhecidas têm sido curtas e parcelares. Os responsáveis por essas respostas, os governos, desconhecem o que vem a seguir, porque as suas análises são de curto prazo, concentradas apenas nos negócios e na economia.

Os movimentos progressistas fazem outra análise, que é a análise crítica do capitalismo. O marxismo ajuda-nos a compreender a situação e as pessoas de esquerda compreendem que esta é uma crise de sobre-produção, muito profunda. Os neo-liberais, ou os moderados, realmente não sabem como lidar com esta crise. O problema é que o movimento progressista, globalmente, é relativamente fraco: não temos partidos ou movimentos muito fortes. Mas a nossa responsabilidade é grande porque temos que apresentar soluções orientadas para as pessoas.

Enfrentamos um período muito revolucionário porque as crises vêm juntas e não podemos separar as questões sociais da resposta ambiental. Os estímulos económicos não podem criar mais problemas ao ambiente. Podem aparecer boas soluções globais progressistas ou podemos vir a ter uma mentalidade populista - fascista. A extrema-direita pode vir a assumir um discurso que combine o nacionalismo com preocupações sociais, com apelos populistas às classes médias.

Outra perspectiva é a de salvar o capitalismo à custa das cedências dos trabalhadores, que é o que a social-democracia está a fazer. Pessoas como o Obama representam esta estabilização pragmática, que temos que enfrentar. Não sei quem vai ganhar, mas isto torna mais importante para nós, no Fórum Social Mundial, agir com princípios e de forma prática: princípios de radicalidade e práticas de mobilização de pessoas. São tempos de grandes desafios.

Quais são as principais ideias para estruturar essas respostas?

Precisamos de "desglobalizar" as nossas economias, orientando-as para os mercados locais e nacionais, mais do que para os mercados globais. Temos que nos afastar dos modelos de crescimento baseados nas exportações, que têm servido para as economias menos desenvolvidas alimentarem os mercados do norte. O comércio é bom e pode ser uma coisa positiva, desde que seja um comércio administrado, em que a participação nos mercados internacionais ajuda a construir a economia nacional, em vez de a destruir. O livre comércio tem destruído sectores económicos inteiros e o foco as economias deve ser o local e o nacional. Já chega de neo-liberalismo e livre comércio. O comércio internacional tem que ser sustentável, justo, assente em boas práticas. Não se trata de regressar ao proteccionismo, mas de abolir o livre comércio.

É preciso colocar a ênfase na equidade e na redistribuição de rendimentos, porque as nossas economias só podem ser dinâmicas se a população tiver poder de compra, para estimular a produção. Precisamos de democracia económica, também ao nível das empresas, para que existam processos democráticos de gestão. Temos ainda que desenvolver uma economia mista, que além do sector privado tenha Estado, cooperativismo e processos de auto-gestão. Temos que retirar às grandes multinacionais o controle das estruturas produtivas, porque foram elas que nos conduziram a esta crise. Finalmente, precisamos de uma economia ambientalmente sustentável.

Todos estes tópicos foram discutidos no Fórum Social Mundial e temos os princípios para uma alternativa, mas a forma como os pomos em prática depende da especificidade de cada economia e cada sociedade. Haverá diversidade de políticas económicas, em vez do monolitismo actual na forma de pensar a economia de acordo com o modelo neo-liberal. É necessário ter uma posição agressiva e dizer às pessoas que temos uma alternativa. Este Fórum, como outros que se têm realizado, ajudou a articular essas alternativas.

Na sua opinião, em que regiões do planeta haverá melhores condições políticas para afirmar uma alternativa?

Importa salientar que na América Latina há uma série de bons desenvolvimentos. De um ponto de vista popular, nos Estados Unidos há boas condições para a mudança. O capitalismo está muito estruturado mas há, para muitas pessoas, uma situação positiva, resultante da esperança em Barack Obama. Na Ásia Oriental temos governos conservadores no poder, que subestimam o facto de haver uma enorme quantidade de trabalhadores que espontaneamente se opõem ao sistema.

É uma diferente perspectiva que se tem, em cada parte do mundo. Mas não temos tempo a perder: temos que impulsionar processos de democracia e mudança progressista que beneficiem toda a gente e não apenas uma parte da classe trabalhadora.

A nível global, como se podem conciliar a defesa dos direitos dos trabalhadores europeus, que vêm ameaçados direitos e benefícios que já tinham conquistado, com os dos países do sul, onde esses direitos não chegaram a ser adquiridos?

Precisamos de formas de controle do capital, que tende a deslocar-se para locais onde a mão-de-obra é barata. Para salvaguardar os trabalhadores na Europa e nos países em desenvolvimento devia prevenir-se a mobilidade do capital. Tem que se considerar que há um contrato social entre o capital e a sociedade. Se o capital se recusa a cumprir esse contrato deve ser punido.

O que precisamos é de fazer subir os padrões dos que estão em pior situação. Não precisamos de uma sociedade competitiva, mas de relações internacionais cooperativas, que ajudem a redistribuir a riqueza e a promover uma alta qualidade de vida. Isto não significa que se tenham duas ou três casas, mas que as relações com as pessoas ou o trabalho sejam satisfatórias e proporcionem uma vida decente, desenvolvendo as relações de cada um com a sua comunidade.

O que realmente precisamos é de formas de controle do capital e de critérios de qualidade de vida que unam os trabalhadores do Norte e do Sul. Os movimentos sociais com intervenção transnacional podem ajudar a criar esses padrões comuns para as pessoas de todo o mundo. Neste momento, temos um mundo capitalista sobre-desenvolvido, que está a destruir o planeta. Não precisamos de acrescentar capacidade produtiva: a capacidade produtiva deve tornar-se mais sustentável no seu funcionamento e é necessária uma redistribuição de rendimento entre o norte e o sul. O consumo deve basear-se nos padrões de uma vida decente: boa qualidade de vida em vez de super-consumo.

(...)

Neste dossier:

Fórum Social Mundial 2009

O Fórum Social Mundial 2009 decorreu em Belém do Pará, Brasil, de 27 de Janeiro a 1 de Fevereiro.

Declaração Ecossocialista de Belém

A seguinte declaração, que reproduzimos integralmente, foi preparada por um comité eleito na Conferência Ecossocialista de Paris em 2007 e distribuída no Fórum Social Mundial em Belém do Pará, no Brasil, em Janeiro de 2009. A declaração é suportada por mais de 400 apoiantes, de 34 países, apelando-se à sua difusão e subscrição.

Fórum Parlamentar Mundial apela ao fim dos off-shores

Em Belém do Pará, à margem do Fórum Social, parlamentares da América Latina, Europa, Filipinas e Palestina reuniram no Fórum Parlamentar Mundial e aprovaram uma importante declaração sobre a actual crise financeira.

Marcha de abertura do Fórum Social Mundial

Os cem mil participantes no Fórum atravessaram a cidade de Belém protagoniram um desfile com todas as reivindicações sociais do planeta, todos os sons da militância solidária, toda a alegria do desejo de transformação. Esquerda.Rádio traz-lhe alguns sons desta manifestação, com reportagem de João Romão e sonoplastia de Luís Varatojo.

FSM em sentido amplo por Boaventura de Sousa Santos

A avaliar pelas estatísticas, o IX Fórum Social Mundial realizado em Belém foi um êxito: 133 mil participantes de 142 países; 489 organizações de África, 119 da América Central, 155 da América do Norte, 4193 da América do Sul, 334 da Ásia, 491 da Europa, 27 da Oceânia.

Declaração da Assembleia "Trabalho na crise global" - Fórum Social Mundial

A crise global que vivemos é o resultado de várias crises, económica, social, financeira, energética mas também climática e alimentar. É uma crise sistémica o do modelo de desenvolvimento.

Declaração da Assembleia de Movimentos Sociais - Fórum Social Mundial 2009

Para fazer frente à crise são necessárias alternativas anticapitalistas, anti-racistas, anti-imperialistas, feministas, ecológicas e socialistas. Os movimentos sociais do mundo reuniram-se por ocasião do 9º FSM em Belém, na Amazónia, onde os povos resistem à usurpação da natureza, dos seus territórios e da sua cultura.

Declaração da Assembleia de Mulheres - Fórum Social Mundial de 2009

No ano em que o FSM encontra-se com a população da Pan-Amazônia, nós mulheres de diferentes partes do mundo, reunidas em Belém, afirmamos a contribuição das mulheres indígenas e das mulheres de todos os povos da floresta como sujeito político que vem enriquecer o feminismo a partir da diversidade cultural de nossas sociedades e conosco fortalecer a luta feminista contra o sistema patriarcal capitalista globalizado.

Correa, Lugo, Morales e Chavez no Fórum Social Mundial

Mesmo sem a presença do anfitrião Lula, quatro presidentes de Repúblicas da América Latina juntaram-se num comício em Belém do Pará, à margem do Fórum Social Mundial, em que valorizaram os contributos do FSM para as lutas pelo socialismo e procuraram o apoio dos movimentos sociais de todo o mundo.

Urgência!

Os dois principais tópicos em discussão no Fórum Social Mundial reclamam acção urgente: a crise económica, que ameaça sociedades inteiras com o espectro do endividamento, do desemprego e da miséria, e a crise ecológica, que ameaça a sustentabilidade do planeta e é espelhada com evidência nos problemas da Amazónia.

Balanço do Fórum e do outro mundo possível

Os que acreditam que o fim do Fórum Social Mundial é o intercâmbio de experiências devem estar contentes. Para os que chegaram a Belém angustiados com a necessidade de respostas urgentes aos grandes problemas que o mundo enfrenta, ficou a frustração, o sentimento de que a forma actual do FSM está esgotada.

Entrevista a Walden Bello: "Vivemos um período revolucionário"

O filipino Walden Bello é uma das figuras de referência do Fórum Social Mundial, desde a sua criação. Bello é o presidente da "Freedom from Debt Coalition" e activista da "Focus on Global South". Em entrevista ao Esquerda.net, falou-nos da crise mundial, das respostas possíveis e  das lutas trabalhadores no Sul e Norte do planeta.

Dia das Alianças encerra Fórum Social Mundial

O Fórum Social Mundial terminou neste domingo em Belém do Pará com o Dia das Alianças, um conjunto de reuniões alargadas à procura de convergência para acções comuns. O Fórum reivindica a urgência de se encontrarem alternativas ao capitalismo, porque um outro mundo é possível e necessário.

A crise no Fórum Social Mundial

A crise internacional foi um dos principais temas em discussão no Fórum Social Mundial. No último dia de debates, coube-me apresentar uma comunicação sobre o tema, com o economista venezuelano Eduardo Lander, num seminário promovido pela Transform. A procura de alternativas ao capitalismo marcou este Fórum, onde também esteve Olivier Besancenot. O Partido da Esquerda Euopeia reuniu com o Fórum Porto Alegre, procurando caminhos conjuntos.

Boaventura diz que a realidade prova que "o FSM tinha razão"

No fim da edição do FSM na Amazónia, Boaventura Sousa Santos diz que foram os Fóruns Sociais que "anteciparam a crise"  que hoje vivemos e não o Fórum de Davos que reúne a elite financeira. O fundador do FSM quer ver o mundo a discutir as ideias e soluções propostas em Belém do Pará e diz que é urgente "reinventar o Estado", orientando-o no rumo da democracia participativa.

Lula reúne com Conselho Internacional do FSM

O presidente do Brasil afirmou que a edição deste ano do FSM «mostra a necessidade da sua continuidade e a importância da diversidade democrática». Lula esteve acompanhado por alguns membros do seu governo, como Dilma Rousseff, que anunciou como a próxima candidata presidencial pelo PT. Texto de João Romão, em Belém do Pará, Brasil, para o Esquerda.net.

Correa, Lugo, Morales e Chavez no FSM

Mesmo sem a presença do anfitrião Lula, quatro presidentes de Repúblicas da América Latina juntaram-se num comício em Belém do Pará, à margem do Fórum Social Mundial, em que valorizaram os contributos do FSM para as lutas pelo socialismo e procuraram o apoio dos movimentos sociais de todo o mundo.

Fórum Parlamentar Mundial reúne na Amazónia

O Fórum Parlamentar Mundial (FPM), promovido pelo Fórum de São Paulo da América Latina e pelo GUE/NGL do Parlamento Europeu, começou em Belém do Pará, juntando pela sexta vez representantes de vários países da América Latina e da Europa.

Amazónia, património de todos

Depois da gigantesca Marcha que assinalou o arranque do Fórum Social Mundial, começaram na quarta-feira as mais de duas mil sessões de debate que compõem o seu programa, distribuídas por grandes grupos temáticos que assinalam as grandes reivindicações dos movimentos sociais do planeta.

Fotogaleria da marcha do FSM

Fotografias de Emmanuelle Reungoat

Cem mil na marcha de abertura do Fórum Social Mundial

Os cem mil participantes no Fórum atravessaram a cidade de Belém, bloquearam o trânsito, trouxeram para as janelas a população local e mobilizaram um enorme aparato policial, intimidativo mas que se limitou a observar um extraordinário desfile com todas as reivindicações sociais do planeta, todos os sons da militância solidária, toda a alegria do desejo de transformação.

Fórum Social Mundial começa esta terça-feira

Começa esta terça feira o Forum Social Mundial, em Belém do Pará, cidade pobre junto à selva amazónica onde se esperam mais de cem mil participantes, mais de dois mil painéis e seminários de discussão e mais de mil jornalistas de todo o mundo.

Atraso mudou-se para Davos. Futuro visita Belém

Quando o Fórum Social Mundial nasceu, como contraponto ao Fórum Económico Mundial de Davos, a globalização ainda era cantada em prosa e verso. Oito anos depois, os mantras neoliberais estão cobertos por pesadas nuvens de suspeição e descrédito. O novo estará reunido em Belém, de 27 de janeiro a 1º de fevereiro, no FSM.