Creative Commons

28 de outubro 2006 - 0:00
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DIREITOS DE AUTOR AMIGOS DO UTILIZADOR

"Proibido o direito de reprodução". De tal forma nos habituámos a encontrar esta mensagens em cada DVD ou CD que, para a maioria das pessoas, torna-se difícil acreditar que existem outras formas de protecção da propriedade intelectual que não passem necessariamente por um sistema que mantenha "todos os direitos reservados". Perante as crescentes restrições do sistema de copyright aos direitos dos consumidores, um movimento iniciado em 2001 por um conjunto de professores universitários, advogados e artistas tem lutado pela criação de um sistema que, embora garantindo a protecção intelectual das obras, defenda o uso público e universal da criação intelectual.

Artigo de Pedro Salles



Este movimento, conhecido por copy left, esteve na origem de um original e flexível sistema de protecção intelectual, as Creative Commons. Desde 2003, este sistema tem vindo a ser crescentemente utilizado por artistas e autores, permitindo-lhe definir a forma como o seu trabalho pode ser reproduzido ou modificado legalmente.



 Existem dezenas de licenças, adaptadas à legislação de 40 países, sendo as mais comuns as que permitem a livre difusão ou alteração dos conteúdos protegidos - desde que permaneça visível o nome, ou sítio da internet, do seu autor original. Segundo os seus proponentes, a flexibilidade deste sistema de licenciamento permite a protecção legal aos autores sem espoliar a comunidade dos meios para difundir e divulgar o conhecimento.



 O Copy left e as Creative Commons aparecem como uma reacção às alterações legislativas que, nos Estados Unidos da América e na maioria dos países industrializados, têm tornado os sistema de protecção intelectual cada vez mais antagónico com os direitos dos consumidores.



 Argumentando que a facilidade das cópias digitais punha em causa o seu modelo de negócio, as empresas de entretenimento forçaram a alteração da legislação sobre o copyright, aumentando os direitos de propriedade intelectual em mais 20 anos. Com a sucessiva ameaça de processos judiciais sobre os distribuidores de conteúdos na internet, passaram, de facto, a ter um verdadeiro poder de veto sobre a informação publicada na internet.



 O mais recente exemplo vem do Youtube, o canal de distribuição de vídeos na internet recentemente adquirido pelo Google, que começou ontem mesmo (27 de Outubro) a enviar e-mails aos seus utentes avisando que, pressionados pelos advogados da Comedy Central, a maioria dos vídeos desta empresa (South Park, Colbert Report, ou Daily Show with John Stewart) vão ser retirados do "ar".



 Progressivamente, é a própria definição de protecção de direitos de autor que tem sido posta em causa. Longe de se limitarem a acrescentar entraves à difusão da produção intelectual, as mesmas leis que proíbem a cópia de segurança de um Dvd doméstico têm aberto espaço para o até aqui inatacável direito de qualquer consumidor a deter aquilo pelo qual pagou - como é o caso de algumas das lojas que alugam e vendem música digital.



 Ao mesmo tempo que esta tendência se mantém, o sucesso da blogosfera tem empurrado o sucesso desta alternativa aos "direitos reservados".  Desde que foram criadas, em 2003, já foram emitidas mais de 250 milhões de licenças com o já famoso logótipo das Creative Commons - 100 milhões nos últimos seis meses.



 Se é certo que as Creative Commons têm sido mais utilizadas para o licenciamento de fotografias ou ilustrações na internet, a sua utilização começa rapidamente a alastrar-se a outros domínios. O Governo brasileiro anunciou recentemente que todos os arquivos da agência noticiosa do país, incluindo 150 mil fotografias, passarão a ser do domínio público através de uma destas licenças. A BBC tem parte dos conteúdos musicais e vídeo do seu site licenciados por este sistema.



 Vários músicos, como os Pearl Jam, Beasty Boys ou David Byrne, têm apoiado e licenciado parte da sua obra desta forma. Este último artista, em conjunto com Brian Eno, assina uma nova edição, para quem queira modificar e reutilizar, de uma das suas obras culto, "My Life in the Bush of Ghosts", de 1981.



 Gilberto Gil, o popular músico e ex-ministro da cultura, brasileira, depois de anos de lutas judiciais com as suas editoras, tem todo o seu catálogo licenciado através das Creative Commons. Este último artista, em conjugação com a mais improvável das empresas, encontra-se também ligado a outro momento chave para as Creative Commons. Foi um seu discurso, como ministro da cultura brasileiro, o primeiro documento a ser licenciado com a nova ferramenta do Microsof Office que permite a inclusão, automática, em cada documento produzido nestes programas, de uma Creative Commons.



 Dez anos depois da febre da internet, e das promessas originais de difusão quase ilimitada do conhecimento, as Cretive Commons são a ferramenta que mais perto está de cumprir esse espírito, não tratando os cidadãos como meros consumidores dos objectos culturais mas como parte interveniente no seu processo de criação, difusão e partilha.

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