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Agro-combustíveis e neo-colonialismo

A necessidade de grandes extensões de terra para o cultivo intensivo de agro-combustíveis motiva que os países mais pobres sejam o local privilegiado para a expansão desta indústria, onde é dito que existe muito solo livre, condições climáticas melhores e mão-de-obra mais barata, tornando este mercado mais rentável.
Os agro-combustíveis acabam assim por se transformar num projecto de recolonização imperial, onde os atentados aos direitos humanos se multiplicam, com o aumento da expulsão dos camponeses e do trabalho escravo.
A totalidade da superfície agrícola da União Europeia apenas conseguiria cobrir 30% das necessidades actuais de combustíveis, não as futuras, previsivelmente maiores. Nos Estados Unidos, para satisfazer a procura actual de combustíveis fósseis seria necessário destinar à produção de agro-combustíveis 121% de toda a superfície agrícola desse país. Por conseguinte, a oferta de agro-combustíveis terá que proceder do Sul, da periferia pobre e neo-colonial do capitalismo. A matemática não mente: nem os Estados Unidos nem a União Europeia têm terras disponíveis para suportar ao mesmo tempo um aumento da produção de alimentos e uma expansão na produção de agro-combustíveis.

Por outro lado, os obstáculos à desflorestação, contaminação ambiental e perda de biodiversidade são obviados por governos ávidos de "investimento" estrangeiro e de promover a agricultura intensiva de exportação, em prejuízo de sistemas locais integrais que constituíam a sua própria soberania alimentar.

Os agro-combustíveis constituem assim um projecto de recolonização imperial, num novo assalto das indústrias transnacionais às economias camponesas e à soberania alimentar.

Os objectivos de substituir percentagens importantes de combustíveis com produtos agrícolas (10% UE, 5% Canadá e 20% USA, etc.) está a produzir efeitos devastadores sobre as economias mais vulneráveis, agredindo ecossistemas já de si vulneráveis e atirando para a exploração, miséria e fome os pequenos produtores e as populações indígenas.

Atentados aos direitos humanos: escravatura e exclusão dos camponeses

Têm-se registado graves atentados contra os direitos humanos em plantações de cana de açúcar, óleo de palma e soja no Brasil, Argentina, Paraguai, Colômbia e Sudoeste Asiático, havendo casos de escravidão, salários de miséria, condições de trabalho degradantes, conflitos violentos pela terra, mortes e graves problemas de saúde devido à utilização de agroquímicos e à desflorestação.

A industrialização da agricultura e a concentração de terras aprofundam-se devido aos cultivos energéticos. Com a terra em tão poucas mãos e tantas mãos sem terra, os fluxos migratórios internos dos países cresceram junto da miséria e insegurança nas cidades, e reforçam-se as migrações internacionais que as grandes potências estrangulam cada vez mais duramente.

Neste momento há um plano, preparado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, para investir 200.000 milhões de dólares para produção de agro-combustíveis na América Latina, estimulados pelos acordos com os EUA, que têm o Brasil como o seu principal aliado. Os dois países controlam 70% da produção mundial de etanol.

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Neste dossier:

Dossier Biocombustíveis

Sete textos abordam diversos aspectos sobre os biocombustíveis (ou agro-combustíveis), o que o seu fomento pode provocar e os objectivos que os EUA e a UE têm vindo a colocar para a sua utilização.

Do carnaval ao imenso canavial

Estamos de volta aos ciclos de monocultura que, nos livros didácticos de minha infância, marcavam os períodos da história nacional: pau-brasil; cana-de-açúcar; ouro; borracha; café etc.

Agro-combustíveis: A quem interessa o monocultivo?

Segundo João Pedro Stedile, membro da direcção do MST e da Via Campesina Brasil, a produção dos agro-combustíveis da forma como está proposta hoje, só serve para aumentar ainda mais a concentração de terra e gerar mercadoria para manter as taxas de lucros das grandes transnacionais e o modo de vida consumista dos países ricos.

Agro-combustíveis e comércio de emissões

A expansão dos agro-combustíveis encontra a sua vida facilitada no âmbito dos mecanismos de mercado previstos no Protocolo de Quioto, que serão reforçados nas negociações pós-Quioto.

Agro-combustíveis e transgénicos

O sector da engenharia genética da indústria de biotecnologia está a promover os agro-combustíveis para assim aceder a um novo mercado. Existe uma forte resistência, sobretudo na Europa, à utilização alimentar de variedades OGM de várias culturas utilizadas actualmente para a produção de agro-combustíveis (ex: milho, soja e colza). A indústria confia que a promoção destas culturas para agro-combustíveis conseguirá aceitação. Contudo, os problemas associados às culturas transgénicas, incluindo a contaminação ambiental e alimentar, não seriam tidos em conta.

Agro-combustíveis podem provocar aumento da fome no mundo

A competição dos agro-combustíveis com a produção de alimentos tem levado ao aumento substancial do preços destes, gerando fortes conflitos sociais. O resultado, assinala Atílio Borón Biocombustibles: el porvenir de una ilusión, é um "holocausto social de enormes proporções: por cada incremento de um por cento no preço dos alimentos básicos, juntam-se mais 16 milhões de pessoas ao grupo dos que passam fome".

Agro-combustíveis e neo-colonialismo

A necessidade de grandes extensões de terra para o cultivo intensivo de agro-combustíveis motiva que os países mais pobres sejam o local privilegiado para a expansão desta indústria, onde é dito que existe muito solo livre, condições climáticas melhores e mão-de-obra mais barata, tornando este mercado mais rentável.

Agro-combustíveis: Aumento de terras cultivadas, desflorestação e mais emissões

São necessárias grandes áreas de superfície agrícola útil para a produção deste tipo de culturas energéticas. De acordo com um relatório da AEA (AEA, n.º 4/2004), tendo em conta as estruturas de preços actuais e a procura de alimentos na Europa e no mundo, o aumento da procura de agro-combustíveis só pode ser satisfeito e, ainda assim, parcialmente, através da redução da produção de alimentos a partir das potenciais plantas energéticas. A superfície total do solo consagrado à produção de culturas, portanto, teria de aumentar.

Agro-combustíveis estão a ser fomentados por UE e EUA

A escalada de preço do petróleo e dos restantes combustíveis fósseis, por esgotamento das reservas mundiais e instabilidade política dos países produtores, a par da problemática das alterações climáticas, tem motivado a procura de alternativas energéticas. Os agro-combustíveis, anunciados como uma energia renovável, surgem como uma solução de primeira linha para substituir o exponencial consumo de combustíveis fósseis e as emissões de gases de efeito de estufa (GEE) no sector dos transportes. A U.E. e os E.U.A. lideram este processo, acompanhados pelos outros países mais ricos do mundo.

Agro-combustíveis: energia limpa e sustentável?

Embora existam diferentes tipos de agro-combustíveis, também chamados de bio-combustíveis1, os mais comuns são o biodisel e o bioetanol. Os primeiros são produzidos a partir de oleaginosas (como o girassol, soja, colza, palma), enquanto que os segundos são produzidos a partir de cereais (como o milho e o trigo), beterraba sacarina, cana de açúcar e biomassa florestal. Os cultivos mais usuais são: milho, trigo, soja, colza e cana de açúcar.

Apelo à UE para que abandone os objectivos de utilização de biocombustíveis na Europa

Queremos manifestar a nossa profunda preocupação pelas propostas da Comissão Europeia no sentido de adoptar objectivos obrigatórios para a utilização de biocombustíveis no sector dos transportes.

Uma solução letal

Precisamos de uma moratória de cinco anos nos biocombustíveis, antes que eles destruam o planeta.