Afeganistão: a guerra continua

21 de dezembro 2009 - 0:00
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O ano de 2009 chega ao fim com o anúncio do envio de mais 30 mil soldados norte-americanos para combater no Afeganistão, o que perfaz um total de 100 mil, mais 38 mil dos países da NATO. Portugal é o país que mais aumenta o seu contingente em termos percentuais. O objectivo proclamado é o de aniquilar a al-Qaeda, embora seja no vizinho Paquistão que se suspeitam existir as principais bases do grupo de Osama bin Laden.



Os EUA prevêem ficar no Afeganistão nos próximos anos, com o início da retirada previsto para meados de 2011. No discurso de aceitação do Nobel da Paz, Barack Obama fez a defesa da guerra no Afeganistão, qualificando-a de "justa". Contudo, nem mesmo o embaixador dos EUA em Cabul foi um entusiasta do reforço das tropas, afirmando que o governo de Hamid Karzai teria de dar mais garantias de combate à corrupção e aos talibãs.



Mas o comportamento das tropas da NATO foi alvo de muitas queixas, após terem sido responsáveis por várias chacinas da população civil. Os relatos de bombardeamentos aéreos sobre casamentos e aldeias chocaram a opinião pública internacional e acrescentaram mais razões para a revolta dos afegãos contra as tropas ocupantes. Um dos massacres levou à demissão do ministro do Trabalho alemão, que enquanto detinha a pasta da defesa terá sonegado informação sobre a responsabilidade das suas tropas no ataque que vitimou dezenas de civis em Kunduz.



2009 foi o primeiro ano em que as tropas da NATO sofreram mais baixas no Afeganistão que no Iraque, com cerca de 500 mortos. As vítimas civis do conflito ultrapassaram a fasquia dos mil mortos no fim do primeiro semestre, uma subida de 24% em relação a 2008, ano em que já se tinha atngido um recorde de vítimas civis. As tropas britânicas anunciaram que o número total dos seus militares mortos no Afeganistão já supera os do Iraque.  Com o intensificar da guerra em 2010, a tendência parece ser de uma subida ainda mais pronunciada, o que é admitido pelo próprio general David Petraeus, o militar escolhido por Obama para liderar a guerra em solo afegão.



O dilema da situação afegã não é apenas militar. Os homens escolhidos pelos EUA para liderarem o processo político são conhecidos pelas ligações á corrupção e ao narcotráfico. O vice-presidente do país, que ocupa a pasta da defesa nos governos de Karzai, é um antigo "senhor da guerra" aliado dos norte-americanos e que os próprios EUA admitem ter ligações ao tráfico de heroína. E até o irmão do presidente Karzai foi acusado pelo New York Times de estar ao serviço da CIA e ser um dos grandes traficantes de ópio do país que produz mais de 90% da oferta mundial desta substância.



As eleições presidenciais, que supostamente seriam a base da reconstrução do Estado afegão, revelaram-se uma gigantesca fraude feita de modo a dar a vitória esmagadora a Karzai, com centenas de milhares de votos falsos a entrarem nas urnas. Karzai foi forçado a aceitar uma segunda volta mas o seu adversário, Abdullah Abdullah, recusou participar.



"As urnas ficaram todas nas mãos da mafia e dizia-se que o importante não é quem vota, mas quem conta os votos. O fantoche sem vergonha que é Hamid Karzai foi o escolhido para ganhar e assim continuar no poder", disse a ex-deputada e activista pelos direitos humanos Malalai Joya quando esteve em Lisboa, a convite do Bloco de Esquerda. Entre outros atentados às liberdades fundamentais, Malalai denunciou uma lei assinada pelo presidente que na prática legaliza a violação das mulheres, tal como no tempo dos talibãs.

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