Mais condenados que mulheres. Quem são os escolhidos de André Ventura?
Diogo Pacheco de Amorim é o único dos deputados do Chega que já conhece o hemiciclo por dentro, depois de ter substituído Ventura na legislatura anterior durante a campanha autárquica. Considerado o “ideólogo” do Chega e, antes, da Nova Democracia de Manuel Monteiro, do qual copiou parte do programa para o partido da extrema-direita, Pacheco de Amorim tem uma atividade neste campo político que remonta ao tempo da ditadura. Ao lado de José Miguel Júdice, formou o “Grupo da Cidadela” na Universidade de Coimbra, que se afirmava “nacionalista revolucionário” para defender o colonialismo contra os estudantes que exigiam a descolonização. Após o 25 de Abril, integrou o grupo terrorista Movimento Democrático de Libertação de Portugal (MDLP), cujos atentados bombistas mataram, entre muitos outros, o padre Max e a jovem Maria de Lurdes. Em seguida junta-se ao projeto político do general Kaúlza de Arriaga, um dos “ultras” da ditadura, no Movimento Independente para a Reconstrução Nacional (MIRN). É no CDS que vem a integrar-se nos anos 1980, enquanto assessor de Freitas do Amaral no primeiro governo da AD. Em 1995, com Manuel Monteiro na liderança, torna-se chefe de gabinete do grupo parlamentar, vindo a fundar com ele a Nova Democracia, cujo programa elabora.
Proposto como candidato à vice-presidência do Parlamento, Pacheco de Amorim viu ressurgir algumas afirmações que fez no passado e que motivaram acusações de racismo. Por exemplo, quando defendeu que em Portugal são “bem-vindos os de todas as raças desde que respeitem a nossa raça”. Questionado agora na Rádio Observador sobre essas palavras, insistiu que “a nossa cor de origem é a cor branca” e “a nossa raça é a raça caucasiana“, mas que por haver “raças distintas e cores distintas”, isso “não implica qualquer superioridade de uma em relação a outra, o que implica é que tem de haver respeito mútuo”.
Médico-veterinário e supranumerário do Opus Dei, Pedro Frazão foi militante do PSD e é outro dos novos deputados do Chega cronistas convidados do Observador, onde escreve sobretudo em defesa das touradas, que compara aos abates religiosos muçulmanos e judeus.
Frazão é no entanto mais conhecido pelas mentiras e insultos que espalha. Há poucos meses publicou uma foto nos corredores do Parlamento, junto ao gabinete de Joacine Katar Moreira, tapando várias letras num autocolante ali colado pela deputada - onde se lia "descolonizar este lugar", passou a ler-se "desconizar". Além da própria deputada, também a presidente da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas anunciou a apresentação de uma queixa à Procuradoria Geral da República. As suas mentiras valeram-lhe uma condenação em tribunal este mês, numa ação interposta por Francisco Louçã, a quem tinha acusado em novembro de ter recebido avenças do BES.
A única mulher eleita para a bancada do Chega, Rita Matias, faz parte da direção do partido e é responsável pela Juventude Chega. O pai, Manuel Matias, é assessor parlamentar de Ventura e presidiu ao Partido Pró-Vida, que defende a proibição do aborto mesmo em caso de violação. Rita Matias assume-se como antifeminista e inspira-se no exemplo de Giorgia Meloni, líder do partido de extrema-direita Fratelli d’Italia, ao ponto de ter repetido quase ipsis verbis partes de um discurso de Meloni de 2019 no Congresso do Chega em 2021.
No ano anterior, discursou noutro congresso do Chega para apresentar a moção “Inv(f)erno Demográfico”, com um discurso a favor da criminalização do aborto em que acusava o Estado de subjugar a família aos seus interesses em nome de uma “ideologia perversa”, prometendo em resposta rejeitar a “Constituição socialista” e “rasgar os acordos com organizações internacionais que não gostam do nosso país”.
O coordenador do gabinete de estudos do Chega, Gabriel Mithá Ribeiro, é responsável pelas alterações ao programa do partido. Foi filiado no PSD durante 15 anos e é doutorado em Estudos Africanos pelo ISCTE. Em 2006, escreveu o livro "A Pedagogia da Avestruz”, onde assume a defesa de castigos corporais aos alunos indisciplinados e o que chama de “modelo autoritário” usado no tempo da ditadura. Autor do livro “O Colonialismo Nunca Existiu”, defende publicamente que o racismo também deixou de existir com a mudança do contexto histórico nas últimas décadas. O que não o impediu de se queixar de ter sido vítima de racismo e xenofobia durante a campanha autárquica em Alcochete, devido à sua ascendência moçambicana.
Nas suas crónicas no Observador, repete que “os equilíbrios entre sociedade e instituições têm sido destruídos pelo poder avassalador do marxismo cultural” e fala de um “assalto às universidades” que na sua opinião se tornaram o palco “dos mais violentos ataques ao coração da civilização ocidental”, a par da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento “que deveria ser banida dos currículos escolares”. Eleito por Leiria,aponta Rui Ramos e Jaime Nogueira Pinto como “os raríssimos grandes pensadores resistentes” que “não são tolerados por tais castradores da diferenciação intelectual”.
Antes de entrar no Chega em 2020 e ser eleito deputado por Braga este ano, Filipe Melo, sobrinho-neto do Cónego Melo, passou pela JSD, PSD e CDS. Participou na guerra interna pelo poder na distrital de Braga do Chega e foi acusado de xenofobia nas redes sociais depois de se insurgir contra a então presidente da mesa da Assembleia Distrital de Braga: "Não vai ser uma brasileira que vai mandar nos destinos de um partido nacionalista, patriótico… Nunca, não permitirei”, clamava nas redes sociais. Quando a referência a “uma brasileira” levantou protestos, Filipe Melo acabou por alterar o post para "essa senhora".
Após a eleição, foi revelado que o nome do agora deputado se encontrava na lista pública de execuções por dívidas, tendo sido condenado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Braga a pagar mais de 80 mil euros em três processos distintos de execução. À revista Visão, o antigo funcionário do BES reconheceu dívidas de cerca de 120 mil euros, que justifica com a doença do filho, mas quem o conhece falou à revista sobre o estilo de vida com despesas nada compatíveis com dificuldades financeiras. No Congresso do Chega de maio de 2021, defendeu a extinção dos tribunais administrativos e fiscais, onde conta com dezenas de processos por dívidas. Já em fevereiro, várias concelhias de Braga pediram o afastamento do deputado, justificando-se com o facto de "o combate aos bandidos e corruptos" ser uma das bandeiras agitadas pelo Chega.
Eleito por Lisboa, o novo secretário-geral do Chega foi diretor de campanha e mandatário presidencial de André Ventura e já passou férias com o líder do partido. Rui Paulo Sousa coordena a comissão de Ética e aplica a “Lei da Rolha” instaurada para travar as trocas de acusações entre dirigentes e militantes e as críticas a Ventura nas redes sociais nas guerras internas pelo poder.
Licenciou-se em Gestão de Empresas e foi sócio na empresa agrícola Villabosque. Foi cabeça de lista por Santarém do partido Aliança em 2019, cuja concelhia liderava, tendo abandonado as funções e o partido logo a seguir à derrota eleitoral. Está neste momento a responder em tribunal por falta de pagamento da pensão de alimentos a um filho com necessidades especiais. Alegou não ter nenhum rendimento além do subsídio de desemprego e de estar dedicado à atividade política em exclusivo, sem receber vencimento do Chega além do pagamento de despesas de deslocação. Segundo a Visão, em 2020 disse ao Tribunal que o seu objetivo a longo prazo era a conquista de um cargo político para obter remuneração que lhe permitisse cumprir as obrigações. Conseguiu-o agora nas legislativas, tendo falhado a eleição para vereador em Castelo Branco.
Pedro Pinto foi dirigente do CDS em Portalegre e é secretário-geral adjunto do Chega. Eleito por Faro, apresenta-se como empresário, jornalista e aficionado da tauromaquia. Além de ter sido diretor da Revista "Ruedo Ibérico", foi diretor-adjunto do jornal taurino Farpas e apresentador do programa “3 Tércios” na Rádio Portalegre, dedicado ao mesmo tema. Chegou a participar pontualmente em corridas como forcado, apoderado (representante) de cavaleiros ou comentador televisivo. Segundo a Sábado, Ventura descreve-o como "um bom orador".
Formado em gestão imobiliária, Pedro Pessanha foi membro do CDS desde a década de 1990 e presidiu à concelhia de Cascais até ser expulso em 2013, integrando a candidatura do movimento “Ser Cascais”. No BES Angola assessorou negócios imobiliários enquanto sub-diretor do Património Imobiliário, prosseguindo a carreira no banco já sob controlo do Estado angolano.
Eleito deputado municipal em Lisboa nas últimas autárquicas, Pedro Pessanha preside à distrital de Lisboa. Em novembro passado, este ex-fuzileiro classificava o norte-americano Kyle Rittenhouse, que matou a tiro duas pessoas durante as manifestações em Kenosha, nos EUA, como um “herói”.
Rui Pedro Afonso é membro do Chega desde 2019, integrou a distrital do Porto e chegou à presidência após a demissão de José Lourenço no início de 2021. Bancário de profissão, foi eleito deputado municipal no Porto nas últimas autárquicas. Entrevistado antes das eleições, disse ser um admirador de Sá Carneiro e assumia as dificuldades do partido no distrito, não só por Ventura ter sido comentador enquanto adepto do Benfica mas também porque a integração de minorias étnicas teve “muito mais sucesso aqui no Porto do que em Lisboa e noutras regiões do país”.
Defensor da prisão perpétua, da castração química e da proibição da adoção por casais do mesmo sexo, afirmou num debate para as legislativas que iria “devolver aos portugueses” os 12.5 mil milhões de euros do Orçamento para a Saúde, justificando que esse dinheiro serve para alimentar “a rede de interesses que se instalou” durante os governos do PS.
O deputado eleito por Setúbal, Bruno Nunes, vem do PPM e foi o braço direito de Ventura na coligação dos monárquicos com o PSD nas autárquicas de 2017 em Loures, que elegeu vereador o líder do Chega. Agora, é Bruno Nunes que ocupa o lugar na vereação de Loures pelo Chega. Como os seus colegas de bancada, não esconde a fidelidade ao líder: “Somos um partido de um homem só”, afirmou.
Apresenta-se como consultor e administrador de empresas e pelo menos uma delas, a Oragepopcorn, deixou um rasto de dívidas e tem presença na lista pública de execuções fiscais. O próprio deputado do Chega também consta nessa lista desde 2017, por uma dívida de quase quatro mil euros.
Jorge Valsassina Gaveias, eleito por Aveiro, é presidente da mesa do conselho nacional do Chega e liderou os trabalhos no recente congresso de novembro de 2021, onde foi uma peça-chave para a impugnação de uma das listas concorrentes à eleição de delegados na distrital de Lisboa, alegando “irregularidades insanáveis”, tendo também impedido que sete moções críticas de Ventura fossem sequer votadas. Apresenta-se como gestor e realizador ligado à publicidade e a uma empresa de gestão turística chamada Lisbon Holidays.