Vicente Ferreira

Vicente Ferreira

Economista

Nos últimos meses, os preços dos alimentos têm sido o principal motor da inflação em Portugal. O custo de vida não está a ser devidamente avaliado com base no indicador da inflação, que é o referencial usado nas negociações salariais e na atualização das pensões e de outros apoios sociais.

A reforma laboral apresentada por cá não ajuda a combater os problemas do modelo de crescimento português e, pelo contrário, contribui para os acentuar: a flexibilização que tem como principal objetivo reduzir os custos laborais beneficia sobretudo as empresas em setores intensivos em trabalho.

As limitações do indicador da inflação não são apenas detalhes técnicos. Se o indicador subestima o aumento do custo de vida, traduz-se em aumentos de salários ou pensões que acabam por ser mais baixos do que os que seriam necessários para travar a perda de poder de compra.

Portugal continua a ser um dos países onde maior percentagem das pessoas é incapaz de comportar uma semana de férias por ano. Os preços do alojamento e de serviços como a restauração excluem boa parte das pessoas que vivem e trabalham em Portugal.

As primárias para eleger o candidato do Partido Democrata à câmara de Nova Iorque tiveram um vencedor surpresa: Zohran Mamdani. Ele ganhou com um conjunto de propostas centrado no combate à crise do custo de vida, do controlo de rendas à gratuitidade de transportes públicos e creches.

Ao definir um alvo demasiado baixo para a inflação considerada aceitável, os bancos centrais são mandatados para aplicar uma política de subida dos juros que não afeta todos da mesma maneira. No caso da Zona Euro, as decisões do BCE não só afetam de forma diferente grupos sociais diferentes, como têm impactos diferentes nos diferentes países.

Este texto discute três aspetos que ajudam a explicar porque é que o crescimento da economia não se reflete necessariamente na qualidade de vida de muitas pessoas: o modelo de crescimento que temos, o aumento (subestimado) do custo de vida e o desinvestimento público.

Embora, no ano passado, o primeiro-ministro tenha afirmado que “o equilíbrio das contas não é o fim da nossa política” e que “há vida para além do excedente orçamental”, a política seguida não tem correspondido ao discurso.

As propostas de revisão constitucional na área da economia têm sido apresentadas como "ideologicamente neutras", mas estão longe de o ser e têm impactos profundos na nossa vida.

A inflação não mede a evolução do custo de vida da maior parte das pessoas. Portugal foi o país da OCDE onde o fosso entre os salários e os preços das casas mais aumentou na última década.