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Acesso e direito à saúde

Assente sobre o seu cariz público e universal e dada a grande resiliência dos seus profissionais, o SNS sobreviveu aos ataques políticos, aos vários cortes, aos gigantes desvios orçamentais para o sector privado e até à derradeira pressão pandémica. Por Nuno Malafaia.

A evolução ao nível científico-tecnológico veio viabilizar a descoberta e desenvolvimento de muitas práticas utilizadas hoje que permitem um domínio das ciências da vida, o qual seria impensável. A par desta evolução, a sociedade é inundada de novos fatores que acarretam a maximização da troca de informação, abastecendo os indivíduos de novas ferramentas, que permitem uma maior comunicação e um incremento de conhecimento. Contudo, esta evolução, que foi e é sem dúvida importante para a sociedade, promove o aparecimento de novas problemáticas, colocando em causa algumas fronteiras que nos indicam o caminho eticamente correto no domínio das ciências. Neste sentido, é pertinente analisar o jogo entre os interesses do desenvolvimento na área da saúde e a importância dos direitos fundamentais do indivíduo, suscitando uma discussão sobre princípios da bioética e deveres deontológicos, inseridos numa sociedade exigente e moderna.

O referido contexto bioético reclama um estudo inter ou transdisciplinar – com as respetivas dificuldades - que se orienta para a fixação de diretrizes que se destinem a proteger os direitos fundamentais – e, numa perspectiva internacional, mesmo dos direitos do homem - e a dignidade do ser humano que lhes serve de fundamento, impondo-se princípios como os da beneficência e da não-maleficência.

No atual panorama da medicina, é notável a urgência pelos aspetos tecnológicos, sempre com o objetivo incessante de curar ou de prolongar a vida, sendo a morte do indivíduo assumida como uma derrota. E, desta forma, fica frequentemente remetido para segundo plano o treino do controlo da dor e de outros sintomas, a revisão sobreposta de outros direitos. São a Autonomia, a Informação, a Liberdade de Escolha, a Privacidade, a Não-Discriminação e Não-Estigmatização, alguns exemplos dos direitos usualmente reconhecidos aos indivíduos em situação de doença. É certo que o indivíduo em situação de doença usufrui dos seus direitos enquanto paciente, quando reconhecido como pessoa que efetivamente sofre de um problema de saúde e necessita de cuidados. Torna-se, portanto, indissociável desta lógica, a garantia do acesso à saúde, como garantia do direito à saúde. Na nossa sociedade, essa garantia permanece sustentada pelo SNS, onde as portas estão sempre abertas para todos e todas, todos os dias, em todas as ocasiões, mesmo depois de exposto, durante décadas, à pressão dos grupos privados.

O lóbi dos grupos económicos levou a uma lei de bases e a um estatuto do SNS nos anos 90, que obrigavam o Estado a pagar pelos serviços privados através de verba pública, a estimular o negócio privado da saúde, a permitir a migração dos seus profissionais e a difundir os seguros de saúde privados, fragilizando a igualdade no acesso aos cuidados de saúde e ameaçando o próprio ao direito à saúde. Todavia, assente sobre o seu cariz público e universal e dada a grande resiliência dos seus profissionais, o SNS sobreviveu aos ataques políticos, aos vários cortes, aos gigantes desvios orçamentais para o sector privado e até à derradeira pressão pandémica.

Todos estes apports revelam um caminho rumo à humanização da saúde, demostrando que o SNS é realmente a única forma de defender a saúde da população e desta forma garantir os direitos fundamentais dos indivíduos. É inegável que o SNS é o garante para a saúde da sociedade e para a real concretização do princípio da dignidade da pessoa humana, sem o qual aquele não pode ser considerado, através dos cuidados que proporciona, dos resultados que apresenta, mas também dando o exemplo através da sua fundamentação em princípios éticos, intervenção multidisciplinar e foco de ação voltado para o doente e não para uma cura, que nem sempre – infelizmente – é possível.

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Esquerda Saúde 1

Revista Esquerda Saúde nº1

24 de Março 2022

Leia aqui em formato pdf o primeiro número da revista online "Esquerda Saúde". Todos os artigos e outros conteúdos sobre o tema estão disponíveis na página Esquerda Saúde.

Editorial: Romper com o atavismo na saúde

24 de Março 2022

A revista “Esquerda Saúde” é um espaço amplo de reflexão sobre a saúde, o Serviço Nacional de Saúde, os seus profissionais, a sua organização. Por Mário André Macedo e Bruno Maia.

Pedro Morgado

Pedro Morgado: "A precariedade no trabalho é um catalisador de problemas de saúde mental"

24 de Março 2022

Nesta entrevista, o médico psiquiatra Pedro Morgado fala sobre as dificuldades de se fazer investigação em Portugal e na implementação do Plano Nacional de Saúde Mental, do impacto da pandemia em diferentes populações vulneráveis ou das novas formas de organização do trabalho e a sua relação com a saúde mental. Entrevista conduzida por Bruno Maia.

Tribunal de Contas. Foto de Mário Cruz/Lusa

Erros do relatório do Tribunal de Contas

24 de Março 2022

A conclusão que a gestão PPP poupou quase 200 milhões de euros ao estado, é errada, por uma simples razão, a metodologia utilizada não permite afirmar que o estado poupou globalmente dinheiro, apenas que os hospitais gastaram menos que os outros do seu grupo comparável. Dito de outra forma, poupanças de um hospital PPP serão gastos do hospital vizinho EPE. Por Mário André Macedo.

Seguros de saúde privados como modelo de saúde? É melhor não ir por aí

24 de Março 2022

O farol do capitalismo pouco alumia quando falamos de ganhos em saúde, ainda que possa ser uma torrente de luz se se quiser falar de ganhos à custa da saúde. De facto, gastar tanto, obrigar os utentes a gastar tanto, para ter tão pouco só pode deixar contentes as seguradoras e os seus acionistas. Por Moisés Ferreira.

Vacinação. Foto sanofi/Flickr

Como a CIA hipotecou as hipóteses de erradicar a Poliomielite

24 de Março 2022

Graças às suspeitas levantadas por uma operação de vacinação falsa da CIA para tentar apanhar Bin Laden, revelada em 2011, os dois únicos países com circulação endémica do vírus selvagem da poliomielite são o Paquistão e Afeganistão. Por Mário André Macedo.

Comentário ao livro: "O sistema de saúde no Estado Novo de Salazar"

24 de Março 2022

O livro de Andreia da Silva Almeida foi o vencedor do Prémio António Arnaut e é uma investigação histórica sobre a criação do Ministério da Saúde e dos debates sobre o sistema de saúde que atravessaram grande parte do período da ditadura. Por Bruno Maia.

Acesso e direito à saúde

24 de Março 2022

Assente sobre o seu cariz público e universal e dada a grande resiliência dos seus profissionais, o SNS sobreviveu aos ataques políticos, aos vários cortes, aos gigantes desvios orçamentais para o sector privado e até à derradeira pressão pandémica. Por Nuno Malafaia.

Foto Sindepor/Facebook

Morrer não é uma opção! - A importância do associativismo sindical

24 de Março 2022

Entrámos num círculo vicioso. Os sindicatos são condenados por pedirem aumentos salariais e melhorias das condições de trabalho, supostamente colocando o país em esforço financeiro. O país fica numa posição ainda mais precária, ao ver mão-de-obra extremamente qualificada optar por emigrar para países que valorizam e dignificam os seus trabalhadores. Por Luís Mós.

Imagem Freepik

A necessidade de falar em “Erros”

24 de Março 2022

Muitos dos desafios para o sistema de saúde residem na identificação de erros e eventos adversos, podendo este processo minimizar a sua incidência e aumentar a segurança do doente. Por Joana Baltasar.

Os sistemas de saúde “Bismarckianos” são melhores do que o nosso?

24 de Março 2022

As comparações apontam que as diferenças de resultados entre os países europeus não se deve ao tipo de sistema adoptado mas sim a diferenças organizacionais e de financiamento entre cada país. Por Bruno Maia.

Foto de Ana Mendes

A Paz é a solução

24 de Março 2022

O apelo à paz não deve estar dissociado de um julgamento moral: foi a Rússia que agrediu e atacou o seu vizinho. O apelo à paz deve estar associado ao pedido para que as forças russas cessem imediatamente o seu ataque e recuem para o seu território. Por Mário André Macedo.

Foto de Paulete Matos

Há 10 anos foi assim...

24 de Março 2022

Em abril de 2012, o "Abraço à MAC" foi uma mobilização de profissionais e utentes da Maternidade Alfredo da Costa que conseguiu derrotar a intenção de encerrar o local por parte do Governo PSD/CDS.