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Reflexões à margem do X encontro nacional do trabalho

Sem o desaparecimento da lógica capitalista, não sei se o pleno emprego é uma vã promessa do capitalismo, que nos acena com o céu, para melhor suportarmos o inferno, ou uma frente de luta susceptível de vir a conseguir os resultados esperados.

A minha maior dúvida:

Alinharam-se variadíssimos argumentos em favor da probabilidade (possibilidade) de se atingir e manter no futuro uma situação de pleno emprego, apesar de todas as alterações provocadas no trabalho pelas mudanças científicas e tecnologias introduzidas nos processos produtivos.

Segundo os defensores desta tese, o pleno emprego é possível, graças:

a) à necessidade de responder a uma latente, justa e progressiva exigência de melhores e mais abrangentes serviços de apoio pessoal e social que criará trabalho remunerado capaz de contribuir significativamente para absorver os níveis de exclusão da intervenção humana nos processos produtivos pela evolução tecnológica.

b) aos grandes aumentos quantitativos de produção, viabilizados pelos investimentos em capital fixo (sejam eles automatização, coordenação automática, robotização - impressão 3D em série, inteligência artificial etc.) que gerarão, a montante, a jusante e colateralmente, graças a maior intensidade e volume da concepção – produção e logística total, mais postos de trabalho, contribuindo igualmente para a situação de pleno emprego.

Mesmo considerando positivamente, por um lado a argumentação atrás mencionada e pelo outro os indicadores mundiais dos últimos anos em relação ao aumento constante do desemprego, a minha dúvida persiste.

Admitindo que pudesse resultar globalmente desta transição um relativo equilíbrio social, em meu entender seria sempre um equilíbrio de uma relatividade precária, muito distante do pleno emprego, uma relatividade do tipo da presente…

Os contraditórios interesses dos investidores, de baixar ou eliminar salários e obter o maior lucro possível, exigem maiorias significativas de desempregados com alguma capacidade de adquirir os grandes volumes de produção, o que criaria uma situação igualmente longe do pleno emprego, apesar de tudo socialmente suportável pelas grandes maiorias de desempregados, mantidas relativamente solventes por via de processos “caridosos” paliativos capazes de garantir a vital capacidade de aquisição e consumo.

Vital para os investidores dos grandes excedentes maquino-facturados acumulados graças aos “ganhos de produtividade” obtidos com as introduções cientifico-tecnológicas instaladas e suas consequências.

Convictamente… sem o desaparecimento da lógica capitalista, não sei se o pleno emprego é uma vã promessa do capitalismo, que nos acena com o céu, para melhor suportarmos o inferno, ou uma frente de luta susceptível de vir a conseguir os resultados esperados.

O pensamento crítico no “chão da fábrica”

Obviamente, sem a acumulação dos necessários conhecimentos a servirem de referenciais para uma qualquer discussão formativa, cada indivíduo estará sempre muitíssimo limitado, e acabará, na melhor das hipóteses, por desinteressar-se das questões, sem ter percebido as suas consequências.

Parece-me valer a pena, dada a fulcral importância das mudanças mais ou menos previsíveis no mundo do trabalho e das tecnologias de produção, reflectir seriamente sobre as possibilidades de levar até aos locais de trabalho o essencial destas discussões.

Daí que, da desmultiplicação e intensificação destes encontros, do nacional ao municipal e empresarial, dependerá a qualidade do “caldo” em que os interesses do futuro do trabalho serão “cozinhados”. Será absolutamente necessário um grande esforço formativo dos trabalhadores, para evitar que surjam novas imposições de alternativas únicas.

O facto de se afirmar que estamos em transição para a quarta era tecnológica, argumentando que, por essa razão, devem ser consideradas normais as incertezas e perplexidades que intrigam e assustam o presente, não parece ser argumentação suficiente para nos manter passivos...

Se é verdade que o país não está, como outros “mais desenvolvidos”, a entrar na tal geração 4.0, e o mais certo é ainda não termos saído da segunda, isso faz-nos pensar que a previsível recuperação do “atraso” nos cria pela frente um temível e difícil desafio, a necessidade de formação para um pensamento crítico como obstáculo central à moderação das más consequências resultantes da aplicação de qualquer das hipóteses.

O Bloco de Esquerda, se conseguisse preparar razoavelmente um número de quadros, de entre aqueles que demonstram interesse pelo assunto, deslocando-se até a um encontro nacional, de maneira a que estes ficassem capazes de reproduzir “A” mensagem a outro níveis, dando lugar a uma pequena cadeia suficiente para “A” tornar presente num espaço de tempo adequado, estou convencido que o retorno justificaria largamente o esforço.

Campanha de esclarecimento sobre as alterações organizativas, tecnológicas e profissionais do trabalho, no próximo futuro.

Compreender para melhor se defender.

Compreender para uma ação consciente.

Sobre o/a autor(a)

Agente de desenvolvimento local. Histórico militante antifascista e revolucionário
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