A ausência de grande talento matemático sempre me afastou dos números; mas sem afeição por números, não há dia em que não seja um número de um qualquer catálogo ou listagem. Parece que a humanidade se esvazia das suas singularidades para entendermos objetivamente o que nada tem de objetivo.
A obsessão dos números assaltou a campanha eleitoral em que tudo se resume à demonstração de evidências matemáticas, esperando que as mentiras e deturpações grotescas e aberrantes passem incólumes à evidência.
Somos manietados diariamente com sondagens cujas amostras são intervenientes de representatividade duvidosa; tornou-se aliás mito urbano entender quem são os participantes desta auscultação de opinião: aparentemente o grupo alvo serão indivíduos desocupados e de bem com a vida, atentos ao seu telefone fixo (haja alguém que ainda o use) e permanentemente dispostos a fornecer valiosa opinião a tempo do Telejornal da noite.
Não sou esta ou aquela percentagem nos pomposos gráficos que enchem a vista e invadem a mente, pincelados com comentários tendenciosos e insultuosos à inteligência de comentadores sobejamente ligados ao atual ou anteriores executivos.
Mas há vários números em que me insiro: sou um dos 110.000 portugueses que em 2014 foram expulsos do seu País, tantos quantos em 2013, e mais ainda neste ano ainda não findado.
Sou um dos 15.000 enfermeiros descartados por um Sistema Nacional de Saúde que sobrevive em estado crítico, desmantelado impiedosamente por uma governação criminosa.
Sou um dos 10 milhões sacrificados para salvar uma banca corrupta, com o esforço do meu trabalho a ser a manta que cobre as negociatas e as habilidades contabilísticas; o meu suor é o garante do ilimitado poder de socorro aos que parasitam Portugal.
Sou talvez um dos poucos que, ignorando o esplendor da matemática, sabe entender que uma dívida pública que supera os 130% é a maior de sempre e que os sacrifícios foram em vão: o propósito sempre foi a aniquilação de direitos e o empobrecimento de um povo que se quer disposto a tudo em troca de quase nada.
Sou um dos milhares de jovens que viu chegar a praga da precariedade; depois das lutas de Abril e das conquistas dos direitos laborais, assistimos a um rasgar da dignidade no trabalho, à infestação da incerteza, à escravidão com outro nome, ao amordaçamento da reinvidicação. Sou da geração punida severamente por sonhar e aspirar, quando nada mais é permitido para além de subsistir.
Sou um dos imensos que observa de coração partido ao empobrecimento dos reformados, que se veem obrigados a contribuir para além do que podem, para que não se perturbem os fartamente abonados; sou dos que escuta os gritos de desespero dos avós que sustentam filhos e netos, dos que esquecem a sua forme ou os seus medicamentos para que outros tenham uma refeição digna.
Sou dos que consta as filas intermináveis de desempregados, tratados como marginais e preguiçosos, e cujos pensamentos vagueiam por tudo o que ambicionaram ser e nunca poderão.
Sou dos que cria emprego em Portugal, afinal a única estratégia do bando que governa Portugal é eliminar população e falsear números de desemprego e empregabilidade.
Sou daqueles de verdade, não dos sorrisos encomendados, daqueles que não desiste do seu País, ainda que tudo me tenha sido tirado. Mas a alma, essa, ainda não se resume a números, e como eu muitos saberão resistir ao assalto de liberdade e dignidade e dizer basta.
Os números contam no fim, contados um a um, e não encomendados: sem comícios e paradas de fachada, sem défices escondidos, sem artimanhas ou promessas que roçam o gozo, o verdadeiro número fará a diferença: 10 milhões de Portugueses saberão dizer basta, saberão ver os números de verdade, aqueles que todos os dias se apresentam nas ruas.
Os acéfalos que se limitam ao seguidismo, agitando bandeirolas, saberão responder, mais do que com os punhos, às consequências destas governações que destroçaram o Portugal de Abril.
Sou também da abstenção; impedido de votar por um sistema que ostraciza e castiga emigrantes, guardo nas vossas mãos a minha esperança, já que as mordaças da burocracia teimam em não deixar os emigrantes votar.