O trabalho ao sábado

porJosé Casimiro

07 de setembro 2017 - 22:54
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No momento em que se debate tanto a situação na Autoeuropa, noutra empresa do parque industrial de Palmela, a “Hanon Systems”, pretende-se impor a laboração dos trabalhadores ao sábado, como um dia normal de trabalho.

A luta contra o trabalho ao sábado e pelas 40 horas marcou várias gerações, até à sua conquista. Desde logo se desenvolveu, em vários setores, na indústria, empresas de vigilância, call-center, centros comerciais, hipermercados, entre outros, o trabalho por turnos, com folgas rotativas ou fixas, declarado ou não (porque muitos patrões, principalmente nas grandes superfícies, não querem pagar nenhuma compensação ou trabalho extra). Nos dias de hoje, mais de 10% da força de trabalho em Portugal trabalha por turnos.

A intensificação dos ritmos e da exploração do trabalho são cada vez mais intensos, com horários mais alargados (12,05h/dia) e baixos salários, com perturbações na vida social e familiar, na saúde e no envelhecimento precoce.

Na resposta a esta realidade, o governo PS, as confederações patronais, e outras, respondem que não se podem ultrapassar “as suas linhas vermelhas”, colocando as propostas dos trabalhadores, quanto às necessárias compensações, criação de postos e melhor organização de trabalho, dando mais tempo para a vida social e familiar, possibilitando, a redução do horário de trabalho e a antecipação da idade de reforma sem penalização, mandando, assim, às urtigas os direitos do trabalho.

No momento em que se debate tanto a situação na Autoeuropa, veja-se o que se está a passar noutra empresa do parque industrial de Palmela, a “Hanon Systems”, segundo grupo mundial na área da climatização para a indústria automóvel, onde se pretende impor a laboração dos trabalhadores ao sábado, como um dia normal de trabalho.

O PS, o governo e as confederações patronais escandalizam-se quando os trabalhadores defendem os seus direitos mas nada dizem quando o patronato intensifica os ritmos de trabalho e a exploração.

Diálogo social

A Autoeuropa é frequentemente apontada como uma empresa modelo onde o “diálogo social” impera, mas diga-se que no modelo alemão (VW) é a única em Portugal, pois o mesmo não existe em mais nenhuma empresa, alemã ou portuguesa.

O diálogo social em Portugal ou na União Europeia (U.E.), onde impera a financiarização da economia, a política do semestre europeu, traduz-se numa relação de forças desfavorável ao trabalho. Só assim se pode compreender que o governo PS/Vieira da Silva e as confederações patronais não queiram alterar a legislação laboral.

O código de trabalho de 2003 e as suas alterações posteriores impuseram uma relação de forças capital-trabalho extremamente desfavorável aos trabalhadores, esgrimindo-se “linhas vermelhas”, sempre que os mesmos exercem os seus direitos, como foi o caso da luta desenvolvida pelos trabalhadores Autoeuropa.

A chantagem da deslocalização não ajuda nada nem ninguém. O que é fundamental é que o governo PS/Vieira da Silva crie condições de trabalho e melhore o quadro de direitos dos trabalhadores, destroikando as relações de trabalho, criando-lhes ao nível da empresa outras condições.

Alguém questionou a gestão “musculada” da administração da Autoeuropa?

Os trabalhadores já deram mostras das suas competências e formação, até no seio do grupo em termos mundiais, pois o novo carro ao ser atribuído à Autoeuropa só o veio confirmar.

A luta dos trabalhadores da Autoeuropa e a sua greve são uma “oportunidade” para criar condições para a vinda de novos carros.

A administração deve alterar a sua postura “musculada” nas negociações com os trabalhadores pois se houve greve na Autoeuropa foi porque foi quebrado o diálogo, quando retirou a sua proposta da mesa das negociações e a CT se viu na obrigação de solicitar aos sindicatos que marcassem uma greve para que o diálogo fosse retomado. 2/3 dos trabalhadores rejeitaram o pré-acordo em referendo, pelo que se impunha voltar à mesa das negociações e ouvi-los de novo com nova proposta.

O trabalho ao sábado, está uma vez mais no centro do debate, numa organização de trabalho em turnos rotativos, impõe-se que seja encontrada uma organização, que respeite e compatibilize a vida laboral com a vida social e familiar, atribuindo também as devidas compensações.

Para que se consiga fazer 240 mil carros será necessário criar pelo menos 2 mil postos de trabalho, sublinhando que é necessária uma grande solidariedade para com estes trabalhadores que irão trabalhar por metade do salário dos restantes, tendo 40horas semanais, incluindo o sábado e o domingo no seu contrato.

A postura da administração deve ainda alterar-se nas negociações salariais futuras para que não se repita o que aconteceu nas negociações do ano passado, em que perante a dupla rejeição dos trabalhadores, impôs administrativamente esses aumentos.

É necessário aprofundar a negociação

O “ruído” dos últimos dias sobre a situação na Autoeuropa não beneficia ninguém. Há que eleger nova Comissão de Trabalhadores (CT) e aproveitar a campanha eleitoral para ouvir as aspirações dos trabalhadores; nova organização de trabalho por turnos e respetivas compensações, novos trabalhadores a contratar e apresentar as novas propostas.

É fundamental eleger a 3 de Outubro uma nova CT ao serviço dos trabalhadores e que respeite as suas decisões maioritárias.

À administração exige-se uma verdadeira abertura ao diálogo, ouvindo os trabalhadores, respeitando os seus anseios, para que se concretize a produção dos 240 mil carros e para que novos modelos possam vir para a Autoeuropa.

José Casimiro
Sobre o/a autor(a)

José Casimiro

Deputado municipal em Lisboa. Dirigente do Bloco de Esquerda.
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