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Ninguém enriquece, em funções do Estado, sem uma razão

A posse de bens em completa discrepância com os rendimentos declarados por força de se exercer um cargo político ou público, sem justificação sobre a sua origem lícita, configura, de facto, um crime de enriquecimento ilícito e deve ser punido, enquanto tal.

O combate à corrupção deve ser uma preocupação constante nas sociedades modernas.

Recentemente, a Assembleia da República aprovou leis contra a corrupção, sendo de destacar a criação do crime urbanístico e o alargamento dos prazos de prescrição para o crime de corrupção, aliás com sugestões do Bloco de Esquerda. Mas é pouco.

Será bom registar, que a percepção geral dos cidadãos e cidadãs não mudou. As pessoas acham que existe fraqueza na perseguição e na punição dos corruptos. Os diminutos sucessos alcançados na investigação, e a morosidade dos processos que conseguem chegar a tribunal, explicam-no bem.

Ao longo dos últimos anos, temos assistido a um desinvestimento na investigação criminal, falta de condições de trabalho, exíguos meios ao dispor de investigadores e procuradores, falta de especialistas para as perícias necessárias. A corrupção não é um crime de fácil investigação, pelo contrário, o encobrimento de corruptores e corrompidos torna difícil a produção de prova.

Por outro lado o nosso ordenamento jurídico não está completo no que diz respeito à tipificação de todos os crimes, falta um “instrumento” que permita punir o enriquecimento sem causa.

Há uma coisa que toda a gente percebe: ninguém enriquece, em funções de Estado, sem uma razão.

E é precisamente aqui que é preciso actuar. A posse de bens em completa discrepância com os rendimentos declarados por força de se exercer um cargo político ou público, sem justificação sobre a sua origem lícita, configura, de facto, um crime de enriquecimento ilícito e deve ser punido, enquanto tal. Só a criminalização da posse dos bens é eficaz, pois como sabemos, os bens, móveis e imóveis, são titulados em nome de empresas em off-shore ou estão em nome de outrem . Também o período de fiscalização da declaração de rendimentos deve ser alargado para 5 anos, após o fim das funções públicas.

A eventual discrepância da declaração ao Tribunal Constitucional de todos os agentes do topo do Estado, das empresas públicas, das autarquias locais, não pode ser encarada e punida como simples falsas declarações. Estão em causa valores muito superiores – a transparência exigida aos titulares de cargos políticos e públicos, a confiança dos cidadãos e cidadãs no Estado de Direito.

A criação do crime de enriquecimento ilícito contribuirá para o combate à corrupção mas também será um passo no sentido do resgate da confiança no sistema de Justiça.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Vereadora da Câmara de Torres Novas. Animadora social.
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