Vem esta história a propósito do hospital Amadora Sintra e das Parcerias Público Privadas para a saúde, assunto que muita tinta tem feito correr.
O anúncio do ingresso da gestão do hospital Amadora Sintra na esfera pública causou muita agitação. Visto como um claro sinal de rotação à esquerda por uns, considerado uma cedência ao preconceito por outros, este imprevisto só deixou sem reacção os responsáveis do PS de Sintra e da Amadora, que em 2007 votaram a compra de 6% da sociedade gestora daquele hospital por cada um dos municípios.
Este primeiro acto de governação de face humana de Sócrates levou mesmo a que Salvador Mello, ainda a saborear a vitória do concurso para a construção e gestão do novo hospital de Braga, tenha vindo à praça pública anunciar que "esta decisão vai sair cara ao Estado" e que ela não é mais do que "uma cedência ao facilitismo e à falta de rigor".
Mas o erro só ganhou dimensão quando, no início de Abril, os responsáveis pelas propostas vencedoras das quatro PPP (Cascais, Braga, Vila Franca de Xira e Loures), anunciaram que esta opção permitirá ao Estado poupar 777 milhões de euros ao longo de 30 anos (Diário Económico, 03-04-208).
E de pouco vale o Tribunal de Contas ter alertado para o facto de não terem sido considerados, para o novo hospital de Cascais, todos os encargos públicos com o projecto nem avaliados os riscos daí decorrentes.
Desta vez não foi preciso esperar muito tempo para que o cenário maravilha do pintado pelos investidores começasse a ruir.
Uma semana depois, e começa, a surgir indícios de que os custos que o Estado terá nas PPP da saúde poderão ser bem mais altos do que o previsto, tendo o governo orçamentado uma almofada de 982 milhões de euros para incorporar o efeito esperado da inflação, que, ao que parece, não estaria contabilizado nas propostas iniciais (Jornal de Negócios, 11/03/2008). Ou seja, aquilo que no início de Abril era vantagem quantificável começa a ganhar contornos de um buraco bem fundo.
Tal como na televisão, também os sonhos do luso capitalismo parecem depender da ergonomia, cabendo sempre ao Estado a árdua tarefa de moldar a almofada.
