A tentação das analogias é grande, mas Maio não se repete em Outubro, tampouco 42 e dois anos depois. Significa esta resposta algum menosprezo pela luta dos trabalhadores e estudantes franceses? De forma alguma! A sua luta é digna de registo: não só reflecte a coragem da insurgência em tempos de atomização social, desemprego e desvinculação colectiva, como demonstra forte solidariedade entre gerações. As greves francesas são ainda um excelente exemplo de como é possível forjar uma grande maioria social.
Sem qualquer nostalgia, os combates configuram novas formas de organizar as agendas reivindicativas e uma grande vontade de conquistar o espaço público. As greves devem invadir as ruas e as praças; transformar-se em grandes paradas; sair dos bastidores e disputar a opinião pública com políticas inteligentes de comunicação. De nada serve uma paralisação geral se for cinzenta e repetitiva. A participação dos estudantes alarga as possibilidades de sucesso pela sua centralidade simbólica, mas também pela inversão do nexo socializador: cada vez mais os pais aprendem com e a partir dos filhos. Ninguém pensa, para já, em alterar um padrão civilizacional. Mas as utopias possíveis erguem-se a partir do quotidiano.
Em suma, as fúrias francesas mostram que a sociedade bloqueada está a reagir e a assustar a burguesia. Basta de sermos bem-educados com essa gente. Chega de consentimento. Não há consenso entre interesses díspares, nem mitos de coesão nacional.
Maio não se repete porque a saudade dá bons fados, mas não novos frutos.