Dez anos depois da descriminalização do consumo, é tempo de Portugal voltar a dar um exemplo nas políticas de combate à toxicodependência, através de novas medidas, responsáveis e tolerantes.
O centro destas políticas tem que continuar a ser – a saúde, a promoção de escolhas informadas e o combate sem tréguas aos traficantes de droga.
A descriminalização, cujos efeitos positivos, hoje, ninguém nega, deixou alguns problemas por resolver, pois não deixa nenhuma alternativa ao consumidor que não seja a aquisição da canábis no mercado ilegal.
E este aspeto acaba por comprometer os resultados de uma política que é apontada como um exemplo a nível mundial.
Por isso mesmo, apresentamos este Projeto-Lei, para que se dê mais este passo, no sentido do progresso – legalizar o cultivo da cánabis para consumo pessoal e criar o enquadramento legal que possibilite a criação de “Clubes Sociais de Canábis”.
Hoje, a legislação permite a posse de uma determinada quantidade de canábis para consumo pessoal. No entanto se essa pessoa cultivar a planta exatamente com o mesmo objetivo é considerado um traficante.
Mas o mais grave, é que esta contradição ajuda o mercado ilegal e os traficantes que tiram lucro, e que lucro, deste comércio.
Não falamos de uma substância inócua, não há aqui qualquer demagogia. Mas os riscos do seu consumo para a saúde pública não são maiores, serão mesmo menores em alguns casos, do que o consumo do tabaco e do álcool.
Os Clubes Sociais de Canábis, uma experiência bem sucedida em Espanha, são um local de acesso controlado e de consumo controlado.
Nada têm a ver, nem com o modelo dos coffe-shops holandeses, e muito menos com as smart shops, cujos efeitos nocivos e dramáticos já foram objeto de debate e tomada de posição por este Parlamento.
Os Clubes Sociais de Canábis não põem em causa o respeito pelas Convenções Internacionais que proíbem o seu comércio.
Se há palavra que defina o mundo do mercado ilegal, para além da palavra lucro, é a palavra descontrolo.
Aquilo que propomos vai em sentido inverso – controlo e informação.
Termino, senhora Presidente, senhores e senhoras deputadas, citando a recomendação da Comissão Global sobre Política de Drogas, formada por muitas personalidades mundiais, entre as quais destaco Kofi Annan:
“encorajar as experiências dos Governos com modelos de regulação legal das drogas para enfraquecer o poder do crime organizado e salvaguarda a saúde e a segurança dos seus cidadãos”.
Para o Bloco de Esquerda é tempo de responder a este apelo.
Intervenção no debate na Assembleia da República sobre a legalização do autocultivo e dos clubes sociais de canábis, 8 de maio de 2013
