Quem tenha visto as imagens da última greve geral na Grécia, ou as de Roma, junto ao Parlamento que acabara de salvar Berlusconi pela estreita margem de três duvidosos votos, ou ainda as de Londres, onde um príncipe e uma duquesa passaram pelo pânico, facilmente perceberá que qualquer coisa está a irritar as multidões de jovens que saem à rua. Qualquer coisa: desemprego nos 17 por cento, precariedade generalizada no trabalho e estudos cada vez mais caros.
Ninguém é feliz condenado a casar cada vez mais tarde e a viver em casa dos pais ou dos avós até aos 30 e mesmo aos 40 anos. O euromilhões não é alternativa a esta falta de horizontes. A irritação, pelo contrário, mostra aos políticos da austeridade que os pagadores de facturas começaram a perder a paciência.
O que os decisores políticos europeus estão a impor aos seus povos não tem explicação. Foi posta em andamento uma máquina infernal de transferência de rendimentos. Esta trituradora transforma dívida privada em dívida publica. Dito assim, não parece grave. Tentemos de outro modo: o dinheiro dos nossos impostos e os impostos dos nossos filhos foram mobilizados em socorro do sistema financeiro que nos mergulhou na crise. Por causa desta operação de salvamento, os Estados aumentaram o seu endividamento e os défices orçamentais voltaram a crescer. Daqui não viria mal ao mundo. Em si mesma, a dívida não é má, pode fazer girar a economia e é para isso que deveria servir. Mas em Bruxelas, os governos e a comissão decidiram que era preciso retirar os apoios de excepção aos pobres, aos desempregados e poupar nos serviços públicos e nos salários dos funcionários. Por causa do défice e da dívida... que era de privados e que agora é nossa. No mínimo, esta generosidade deveria ter como consequência alguma decência fiscal. Ok, o nosso dinheiro salva, mas em troca eles devem devolver. Seria um acordo justo, mas a justiça destes dias é um bem raro e escasso.
Até um estudante pouco letrado consegue fazer a pergunta do milhão: porque é que depois de tantos PEC’s, orçamentos de austeridade e complicadas decisões sobre governação económica europeia, o euro continua sob ataque? Ou então: porque é que depois de tanto elogio às malfeitorias já aprovadas, Bruxelas quer sempre mais e mais, mesmo que seja mais do mesmo? Porque é que agora se quer mexer nas leis laborais que o governo dizia intocáveis e que agora já não? Em que é que um fundo que facilita o despedimento ajuda ao emprego? E em que é que a criação de um tecto máximo de indemnização que torna o despedimento obrigatório, mesmo sem justa causa, contribui para a criação de emprego? É. Há um dia em que as perguntas se transformam mesmo em irritação. Até em Portugal, terra de brandos costumes.