As silly seasons são sempre momentos bastante interessantes para “animar a malta”. Mas se a isto juntarmos a proximidade de umas autárquicas, ficam de facto reunidas todas as condições para mergulharmos num país à beira de um ataque de riso (rir para não chorar é com certeza uma das melhores máximas nacionais nos tempos que correm). E assim acontece porque, quando andamos pelo país por estes dias, levamos com um autêntico banho de política real, despida da maquilhagem que sempre consegue disfarçar um pouco o fraco debate político que existe a nível nacional. Por estes dias, conhecemos os mais estranhos candidatos a autarcas, com as mais excêntricas promessas eleitorais, com as mais exóticas campanhas em curso.
E num ápice, aquele país que julgávamos estar à beira dos 40 anos de democracia, regressa ao nível de aprendiz de democrata. Tropeçamos então nas mais velhinhas estratégias de compra de votos, que vão desde a oferta de sacos de cimento e de baldes de tinta, passando naturalmente pelas inaugurações feitas com toda a pressa. Para que nada fique por inaugurar até ao final de Setembro. E não se pense que tal sucede apenas naquele Portugal profundo que tanto gostamos de imaginar. Acontece também nos maiores centros urbanos do país, onde o eleitoralismo atinge até os mais modernos e sofisticados candidatos. Veja-se o caso de Lisboa: da reabertura do jardim do Campo Grande ao Terreiro do Paço de cara lavada, tudo parece estar pronto para o passeio triunfal de António Costa.
As autárquicas são autênticas provas dos 9 para os partidos políticos. Não haja dúvidas a este respeito. A capacidade de constituir milhares de candidaturas, entre câmaras e freguesias, testa ao limite a ligação dos partidos à sociedade civil. E é então que um grande esforço é feito para que as estruturas locais consigam constituir listas aos diversos órgãos autárquicos. E se tal esforço é hercúleo nas forças políticas mais pequenas e com menor implantação local, o mesmo fenómeno não passa ao lado dos grandes partidos.
Curiosamente, não é necessário ser-se um grande visionário para se perceber que, mais do que um desafio para os partidos, as autárquicas deviam ser sim uma oportunidade para estes estreitarem laços com a sociedade civil. A necessidade de constituir milhares de listas, milhares de programas eleitorais, apontar milhares de cabeças de listas, devia ser sim encarada como uma oportunidade para abrir as estruturas partidárias a novas caras e a novas ideias. As autárquicas deviam ser um momento chave de renovação das estruturas partidárias, um momento de arejo, onde a política por vezes tão transcendente chega ao dia a dia das pessoas.
Por ser o acto eleitoral que é normalmente acompanhado por mais casos insólitos, por mais casos de corrupção, a exigência pode e deve assumir-se como um traço distintivo. Neste sentido, é naturalmente de aplaudir a postura do Bloco ao não deixar passar as flagrantes candidaturas de autarcas aos concelhos vizinhos, violando assim a lei da limitação dos mandatos. Este tipo de exigência é apenas um exemplo do que pode e deve ser feito para dignificar eleições cuja importância é inquestionável para a saúde democrática do país. E sempre que for necessário denunciar o eleitoralismo primário, que vai da oferta de sacos de cimento às inaugurações apressadas e descaradas em tempo de campanha, denuncie-se sem pestanejar. Não gostamos de estragar a festa das autárquicas. Por isso mesmo, tudo faremos para que não nos estraguem a festa da democracia local.
