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Escândalo BES: vai ser feita justiça?

Os banqueiros produziram danos económicos e financeiros duma enorme dimensão mas a sanção pelas suas práticas ilícitas é…. pagar uma multa.

“Houve gestão ruinosa e prestação de falsas informações no caso BES”. Esta foi uma das notícias mais recentes sobre o caso que levou à falência e destruição do grupo Espírito Santo. “Banco de Portugal tem provas de que Salgado ordenou por escrito a falsificação de contas da Espírito Santo International”, titulava um jornal nas últimas semanas. E acrescentava que o Banco de Portugal tinha já 18 acusados (Ricardo Salgado e outros administradores do grupo). É o primeiro de 5 processos de contraordenação sobre o caso BES, confirmou Carlos Costa no parlamento.

Não é por acaso que a notícia sobre a abertura de processos contra os dirigentes do BES ocorra na mesma semana em que o primeiro-ministro do governo PSD/CDS-PP veio dizer que vai manter Carlos Costa como governador do Banco de Portugal (BdP). É como dizer às pessoas que o Banco de Portugal está a trabalhar bem, até já deduziu acusações contra 18 responsáveis do BES, logo o governador deve continuar em funções.

Desapareceram milhares de milhões de euros de ativos financeiros em poucos meses, muitas centenas de compradores de produtos bancários ficaram com títulos de papel que não valem nada. Finalmente está a fazer-se justiça, dirão alguns mais distraídos. Mas uma análise mais cuidada da situação mostra que, afinal, as infrações cometidas pelos administradores do BES são qualificadas como contraordenações, ou seja, prestar informações falsas sobre as contas dos bancos tem como sanção uma coima (multa), tal como estacionar uma viatura em lugar não permitido. Os banqueiros produziram danos económicos e financeiros duma enorme dimensão mas a sanção pelas suas práticas ilícitas é…. pagar uma multa.

Ao longo de muitos anos os banqueiros conseguiram que os governos e o Banco de Portugal os tratassem como uma elite, como gente VIP, muito acima do vulgar cidadão. As atuações ilícitas dos banqueiros não são consideradas crimes, mas simples contraordenações, como as multas de trânsito. Os processos contraordenacionais são elaborados por entidades administrativas como o BdP ou a CMVM (e não pelo Ministério Público) e o recurso das contraordenações aplicadas é julgado num tribunal de pequena instância criminal, como dum pequeno delito se tratasse… Mais que um sinal do poder dos figurões da banca, a legislação em vigor sobre as infrações financeiras, ao não qualificar como crime a prestação de falsas informações sobre as contas dum banco, mostra como os governos se colocaram de joelhos perante a finança. Mesmo o decreto-lei nº 157/2014, de 24 de Outubro, do regime geral das instituições de crédito e financeiras, aprovado após o escândalo do BES/GES continua a enquadrar atuações gravíssimas dos banqueiros como ilícito de mera ordenação social…

Só nos últimos 6 anos, a ganância dos banqueiros já custou às finanças públicas mais de 34 mil milhões de euros, quase metade do “empréstimo” da troika. Mais de 20% do PIB português foi usado para “salvar” os bancos. Mas as condutas ilícitas dos banqueiros não vão ser sancionadas com pena de prisão. E pagar uma multa não é punição que preocupe o mundo da alta finança. Tarda a justiça. Até quando?

Sobre o/a autor(a)

Jurista. Membro da Concelhia do Porto do Bloco de Esquerda
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