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(En)Dívida

A cada boa avaliação do Governo, maior é a desgraça do país.

A troika passou duas semanas a avaliar o país, para concluir que tudo está bem, quando a troika cá vem. Mas, a cada avaliação da troika, em que nos dizem que estamos no bom caminho, o desemprego aumenta e a recessão bate mais fundo. A cada boa avaliação do Governo, maior é a desgraça do país. As previsões seguem-se umas atrás de outras, só para serem desmentidas pelo cenário mais negro da previsão seguinte. Os caminhos da austeridade são tortuosos e o destino é um brutal empobrecimento do país.

As vozes da troika falam claro: é preciso mais competitividade e isso passa pela redução do preço do trabalho. Se os funcionários públicos irão ter um corte salarial, porque não seguirão os trabalhadores do privado o mesmo caminho?! O que a troika disse em conferência de imprensa é que um mal nunca vem só e que as maldades que o Governo fará ao país não têm limites. A cada corte que seja aplicado aos portugueses, há sempre algo mais para cortar, desde que seja aos trabalhadores. Hoje no sector público, amanhã no privado, não há trabalhador que seja isento de sacrifícios. O pecado original, ao contrário do que nos dizem, não está na dívida, mas no trabalho. Esta é a cartilha da troika.

A dívida é o meio para desvalorizar o trabalho. Com a crise da dívida não se quer reduzir a dívida! Isso está bem à vista na Grécia, na Irlanda ou em Portugal. No fim do programa de ajustamento da troika a dívida portuguesa estará nuns assustadores 125% do PIB. A dívida é o pretexto para o grande ajuste de contas: desvalorizar os salários e reduzir os direitos. No público ou no privado, o objetivo é sempre o mesmo, conseguir uma redução do salário direto e indireto, realizar uma redução do custo unitário do trabalho. A eterna disputa entre quem trabalha e quem detém o capital está hoje mais acesa do que nunca e a dívida é o às de trunfo do jogo do capital. A dívida tudo subjuga, o Governo e a troika assim o querem garantir.

A dívida, que ao trabalho tudo exige, ao capital tudo permite. Que o diga a banca, a quem nada falta, e para quem está reservado um apetitoso bolo de 12 mil milhões de euros. Os sacrifícios não batem a todas a portas e, curiosamente, há portas em que nunca batem. Afinal, a dívida não era assim tão grande, que não pudesse ser maior, e por isso nos endividamos para a segurança dos bancos. A segurança de uns, à custa da insegurança de tantas e tantos. Este é um dos exemplos dos 1% bem organizados, que se governam à custa dos 99%.

Os 1% não têm limites para as exigências. Quererão sempre um corte maior, um sacrificiozinho mais, antes do próximo que exigirão. É por isso muito importante o tempo em que vivemos: é agora que os 99% têm de dizer basta. É agora que têm de bater o pé. Pelos direitos de hoje e pelos direitos do amanhã. Em nome daqueles que conquistaram os nossos direitos, e dos nossos filhos, a quem querem que vejamos crescer sem direitos nenhuns. Em nosso nome, porque não aceitamos adiar mais as nossas vidas, nem nos resignamos às desigualdades. Por um amanhã que se constrói hoje e pelo dia de hoje, que não queremos que nos seja roubado. A Greve Geral não é só um direito, são muitos: os teus, os meus, os de 99%!

Sobre o/a autor(a)

Deputado, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, matemático.
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