Controlos de segurança nos aeroportos, insegurança para a nossa saúde

porAmy Goodman

18 de abril 2012 - 0:51
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Chegar ao avião, hoje em dia, pode representar um risco ainda maior para a saúde do que o próprio voo.

Esta semana, o terror atingiu o céu do Texas, só que desta vez não foi provocado por um terrorista, mas sim por um piloto: nada mais e nada menos que um piloto certificado pela Administração Federal de Aviação. O capitão da JetBlue Airways Caly Obson pilotava o voo 191 que se dirigia do Aeroporto Internacional John F. Kennedy, em Nova Iorque, para Las Vegas. Quando o avião já se encontrava no ar, Obson começou a correr de um lado para o outro do corredor ao mesmo tempo que, segundo o testemunho de vários passageiros e as imagens tiradas com telemóveis, falava sobre o Iraque, Israel, al-Qaeda e ataques com bombas, pedia aos passageiros que rezassem e gritava: “Vamos morrer todos”. Um piloto que se encontrava entre os passageiros ajudou o co-piloto a fazer uma aterragem de emergência enquanto os passageiros e a tripulação acalmavam Obson, que trabalha na JetBlue desde a fundação da empresa. Após a aterragem, Obson foi levado para o hospital e ficou suspenso do trabalho com licença remunerada. Mais tarde foi apresentada uma acusação penal contra ele, por interferir com a tripulação do voo.

Este incidente basta para provocar medo a qualquer pessoa que queira voar. No entanto, só chegar ao avião hoje em dia pode representar um risco ainda maior para a saúde do que o próprio voo.

As novas tecnologias de controlo de segurança dos aeroportos – principalmente os scanners de retrodispersão de raios X – estão a ser fortemente questionadas tanto em relação à sua eficácia, como ao risco da exposição à radiação provocar cancro. À preocupação com a saúde junta-se a natureza gráfica das imagens captadas, basicamente as fotos mostram nua cada pessoa que passa pela máquina, e ainda a natureza agressiva (e para algumas pessoas humilhante) da alternativa à máquina: a “revista completa” realizada por um funcionário da Administração de Segurança no Transporte (TSA, na sigla em inglês).

A senadora republicana Susan Collins apresentou um projeto de lei que exigirá que os scanners de retrodispersão de raios X sejam submetidos a análise em laboratórios independentes, o mesmo que um grupo de cientistas da Universidade da Califórnia, São Francisco solicitou ao governo de Obama em abril de 2010. Em resposta à afirmação da TSA (em rigor, uma afirmação da empresa Rapiscan fabricante daquelas máquinas) de que a dose de radiação é menor à “recebida quando se come uma banana”, o catedrático John Sedat e outros académicos escreveram: “Embora a dose fosse segura se fosse distribuída de igual forma por todo o corpo, a dose na pele pode ser perigosamente alta. Há boas razões para crer que estas máquinas aumentarão o risco de cancro em crianças e outros setores vulneráveis da população, como mulheres grávidas”. O Doutor Michael Love, diretor do instituto de raios X da Faculdade de Medicina da Universidade John Hopkins, disse à revista Discover que se este risco se multiplicar pelos 700 milhões de passageiros anuais, “seguramente alguém vai contrair cancro de pele”. A União Europeia proibiu estas máquinas.

Nas viagens que realizei durante os últimos fins de semana neguei-me a passar por aquelas máquinas, o que é um direito que qualquer passageiro tem, apesar da opção quase nunca estar indicada em parte alguma (o projeto de lei da senadora Collins também exige que haja sinalizações claras). Fizeram-me esperar até que os empregados da TSA estivessem disponíveis para realizar o que eufemisticamente se denomina “revista completa”. A agressividade com que a funcionária da TSA questionou a minha decisão de não passar pelo scanner só foi igualada pela agressividade da revista quando me neguei a mudar de decisão. De regresso a Nova Iorque, uma amigo recém chegada do Aeroporto Internacional de O'Hare, em Chicago, contou-me como um funcionário da TSA passou as mãos pela parte da frente das suas calças e lhe disse: “Parece que perdeu algum peso!”.

Quem beneficia com isto? As duas empresas que fabricam as máquinas têm amigos poderosos. Segundo informaram os jornais The Hill e The Washington Post, a L-3 Communications, a empresa fabricante do scanner de ondas milimétricas, contratou a lobista Linda Daschle, esposa do ex-senador Tom Daschle. Também foi divulgado que a Rapiscan, a empresa que fabrica a máquina de retrodispersão de raios X, pagou um milhão de dólares ao Chertoff Group, dirigido pelo ex-diretor de Segurança Nacional Michael Chertoff, enquanto este aparecia nos média publicitando os benefícios das máquinas. Cada um destes dispositivos custa aos contribuintes cerca de 150.000 dólares, mas isso é só a sua compra; a instalação e o pessoal que trabalham com eles custam muito mais.

Os próprios agentes da TSA poderão ser os que enfrentam os piores riscos. Um recente relatório do inspetor geral da TSA reconheceu que “é preciso instalar escudos para reduzir ainda mais os níveis de exposição à radiação dos operadores do scanner de retrodispersão de raios X”.

Advertiu também que os empregados da TSA levantaram a questão de que não receberam formação suficiente para operar com as máquinas. Michael Grabell, um jornalista de ProPublica que escreveu muito sobre os scanners de corpo inteiro, disse-me: “Os técnicos de radiação disseram a alguns dos operadores da TSA: 'se eu operasse alguma dessas máquinas usaria um mediador de radioatividade'. Mas a TSA não permitiu”.

Estas preocupações levaram a que o Centro de Informação sobre Privacidade Eletrónica tenha pedido à TSA e ao Departamento de Segurança Nacional que procurem pôr fim ao uso dos scanners, pelo menos até que se realizem exames independentes sobre os riscos e os resultados sejam publicados.

Enquanto não tivermos a certeza de que os scanners são seguros, continuarei a optar por não me submeter a eles.

Artigo publicado em "Democracy Now" em 29 de março de 2012. Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna. Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps para espanhol. Texto em espanhol traduzido para português por Carlos Santos para Esquerda.net

Amy Goodman
Sobre o/a autor(a)

Amy Goodman

Co-fundadora da rádio Democracy Now, jornalista norte-americana e escritora.
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