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Como se mede o trabalho de um professor?
Um pedreiro faz um muro e o muro lá fica; um marceneiro constrói uma mesa e passa-se o mesmo. O trabalho das artes manuais é duradouro.
Há quem seja avaliado pela performance. Um atleta, um advogado ou até mesmo um médico podem apresentar o resultado do seu trabalho em quantidades.
E há quem venda produtos. Para estes também se pode medir a capacidade de trabalho em horas e receitas.
E um professor? Como se mede o trabalho de um professor?
Vem esta reflexão atrelada ao facto de ter concluído a formação de uma turma do ensino profissional que acompanhei do 10º ao 12º ano. Consultados os meus apontamentos, foram mais de 500 horas com cada um dos alunos só em sala de aula, sem contar com outros contextos, como estágio, trabalho de projeto final, recuperações, etc.
Chegando ao fim deste ciclo, pergunto-me: o que fiz eu que fosse mensurável, que se possa quantificar, que objetivamente tenha feito a diferença?
Eu costumo dizer, meio a brincar mas muito a sério, que uma peculiaridade do trabalho de um professor é que, quando cumprimos bem a tarefa, os clientes não ficam satisfeitos! É necessário, antes de mais, uma grande resistência à frustração para esta constante negociação - queremos sempre que os alunos deem um bocadinho mais de si, e eles esperam quase sempre fazer um pouco menos.
Por outro lado, uma porção significativa do trabalho passa-se fora das salas de aula; e mesmo fora da escola. É sozinho que um professor planeia as suas atividades e avalia os resultados delas. Sem relógio de ponto.
Então, se não temos produto para mostrar, não geramos performances que se vejam, não temos receitas, não podemos fazer inquéritos de satisfação dos clientes nem podemos consultar a quantidade de horas gastas, como é que medimos o trabalho de um professor?
Há poucas décadas descobriu-se nas escolas um bicho chamado "evidências". Uma evidência (não é complicado lá chegar) supostamente traz ao de cima as atividades do professor. Normalmente num formato impresso e registado. São as tais grelhas, relatórios e planos de que tanto se falam.
Há obviamente, evidências que já se produziam antes, mas com outros nomes. E há evidências novas que até são úteis. E reconheço que a grande maioria são, chamemos assim, inócuas.
O problema é que há muitas que não são. Há relatórios que se fazem porque sim, grelhas de grelhas e planos que mal saem da impressora já estão a ser colocados no arquivo morto.
Mas ainda pior é que muitos professores convenceram-se que as evidências são um bom meio para medir o trabalho docente. Que uma reunião só fica bem feita se produzir uma ata de não-sei-quantas páginas, mesmo que o seu conteúdo não reflita nada do que lá se passou. E que mais importante do que aquilo que efetivamente se faz é a forma como se regista.
A escola até pode ter gerado grandes "evidenciadores". Mas serão estes os melhores professores para os nossos miúdos? Confesso que não sei responder.
Eu li este trecho num relatório da Prova de Aptidão Profissional de um dos meus alunos, na parte dos agradecimentos. Dizia assim, ipsis verbis: “Ao professor Alexandre Mano, pela disponibilidade para me esclarecer todas as minhas dúvidas, por realmente tentar entender o meu projeto, pelas dicas e conselhos para melhorar o meu trabalho e também por partilhar comigo um pouco da sua experiência seja no âmbito deste tipo de projetos ou em outros também sempre de uma forma intuitiva e descontraída”. Por acaso até nem tive de intervir muito no trabalho do rapaz. Se eu precisar de uma evidência na minha avaliação, é esta que vou pôr. E acho que não fico mal. Como é que os meus alunos mediriam o meu trabalho?
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