Carris Metropolitana: Passageiros capturados e sem direitos

porMaria Santos e Jaime Pinho

01 de setembro 2022 - 22:34
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Pela calada do Verão, com as escolas fechadas e muita gente de férias, as empresas concessionárias dos transportes na península de Setúbal passaram ao assalto descarado ao bolso e ao direito ao transporte.

Carris Metropolitana. Foto publicada no site da CM Setúbal

Pela calada do Verão, com as escolas fechadas e muita gente de férias, as empresas concessionárias dos transportes na península de Setúbal passaram ao assalto descarado ao bolso e ao direito ao transporte, com supressão massiva de horários e desviando os autocarros para as carreiras das praias da região, onde comparativamente com o período anterior a 1 de junho os preços das viagens aumentaram por vezes 80 por cento!!

O que parecia impossível aconteceu: a “revolução nos transportes” prometida para a Área Metropolitana à volta de Lisboa e iniciada no dia 1 de junho passado continua a revelar-se um rotundo fracasso, quase três meses depois. E não se vê uma luz ao fundo do túnel. De positivo são apenas os autocarros novos, ainda que alguns disponham de poucos lugares sentados para percursos mais longos que o devido.

De resto, tudo negativo.

A forma como as empresas privadas concessionárias tratam os motoristas continua a gerar mal-estar e revoltas. E o desprezo com que tratam os passageiros é absoluto e difícil de imaginar.

Recorde-se a história: a primeira fase deste plano para a melhoria dos transportes nos distritos de Lisboa e Setúbal começou no dia 1 de junho e abrangeu os concelhos de Palmela, Alcochete, Moita, Montijo, Setúbal e Barreiro. No dia 1 de julho iniciou-se a segunda fase com o alargamento aos concelhos de Almada, Seixal e Sesimbra. Verificou-se de imediato o mesmo tipo de falhas e atentados aos direitos dos passageiros e motoristas verificados na primeira fase. Por todo o lado instalou-se a convicção de que os transportes ficaram pior que antes.

Perante os protestos e resistência das populações, a começar por Almada com uma ida coletiva à Assembleia Municipal e a criação de uma página online para denunciar as queixas (Passageiros da Carris Metropolitana, no facebook), a CARRIS METROPOLITANA reconheceu o fracasso e anunciou que a terceira fase, ou seja, o alargamento ao distrito de Lisboa ficaria adiado para 2023.

Para além de reconhecer erros e falhas nas carreiras e horários a CARRIS METROPOLITANA e vários presidentes de Câmara dos concelhos afetados repetiram as promessas de que em dias ou semanas tudo estaria resolvido. 

Só que aconteceu o contrário.

Pela calada do Verão, com as escolas fechadas e muita gente de férias, as empresas concessionárias dos transportes na península de Setúbal passaram ao assalto descarado ao bolso e ao direito ao transporte, com supressão massiva de horários e desviando os autocarros para as carreiras das praias da região, onde comparativamente com o período anterior a 1 de junho os preços das viagens aumentaram por vezes 80 por cento!! Por exemplo: no ano passado uma viagem de ida e volta Setúbal-Praia da Figueirinha custava 2, 90 euros, enquanto que agora custa 5,20 euros!

E torna-se grotesco o roubo e a impunidade: os passageiros que viajam dentro das cidades ou entre localidades e que ficam nas paragens desesperados têm na sua maioria passes pré-pagos às mesmas empresas…e por isso não preocupam os donos das transportadoras.

Carreiras suprimidas, ninguém dá explicações

Uma senhora está há duas horas e meia horas à espera no Interface de Transportes de Setúbal, recentemente inaugurado. O autocarro para Cacilhas não se realizou no horário previsto. Não há modo de saber quando é o próximo, nenhum motorista se arrisca ou sabe a falar sobre o assunto. Alguns horários novos estão afixados, outros não: vai dar ao mesmo: não estão em vigor! Tenta apanhar um alternativo para Sete Rios, em Lisboa. Passada meia hora, uma hora, conclui que foi suprimido. Não há NINGUÉM que dê uma explicação, uma esperança, de quando se realizará a próxima viagem para Cacilhas ou Sete Rios.

Um outro autocarro vai partir para os lados de Palmela. Leva, mas não traz passageiros! Explicando o que se passou: após a supressão de um horário aparece um miniautocarro, uma hora depois. As pessoas manifestam o seu descontentamento, mas não têm outro remédio: vão de pé e amontoadas. Às tantas apercebem-se: o motorista tem ordem para fazer viagem de ida, mas para na volta não parar porque tem que chegar rápido para fazer uma carreira para a praia. Alguém se dirige ao motorista: “vou buscar uma pessoa de quem cuido e preciso de regressar!”, exclama! – São ordens, ouve como resposta! O autocarro deixará em terra as pessoas que estiverem em qualquer paragem.

A empresa dá prioridade às praias até 15 de setembro, que se revelam uma mina de lucros. E depois de dia 15, quando for necessário transportar crianças e jovens para as escolas, ou seja, os transportes escolares?

Na garagem central amontoam-se autocarros novos parados, dias, semanas, meses. Faltam motoristas, diz toda a gente. As empresas não os respeitam.

Não consta que tenha sido atendida alguma das reclamações apresentadas no portal das queixas da CARRIS METROPOLITANA, algumas com comprovativos de táxis que tiveram que se utilizar porque os autocarros não passaram.

E começa-se a perceber a conversa com que enfeitaram o tal plano para melhoria dos transportes. O brutal aumento dos bilhetes comprados ao motorista imposto a 1 de junho foi apresentado como estratégia para evitar atrasos e perdas de tempo. Por isso haveria que pressionar as pessoas a tirar passes e bilhetes pré-comprados. O motorista passou a vender um único tipo de bilhete para “simplificar”! Só que o preço é o da totalidade da viagem, que pode ser uma distância de 10 ou 15 quilómetros. Uma pessoa que precise de ir de uma paragem para outra, na distância de 300 ou 400 metros, pagará a totalidade da viagem…Não estão claramente definidos e explicados os critérios que distinguem “Linha Próxima”, referida nos folhetos como “Para as suas voltas do dia-a-dia”, da “Linha Longa”, designada como “Para as suas viagens de maior distância”, a qual tem um custo acrescido - apesar de ambas serem utilizadas diária e frequentemente pelos passageiros. As “Linhas Próximas”, com um custo menor, são muito poucas…

Foram abolidos os bilhetes de criança que eram a metade do preço: agora pagam como adultas. Acabaram os bilhetes de ida e volta, que sempre tinham algum desconto.

Os autocarros que fazem os circuitos para as praias, amplamente divulgados como estando a funcionar sem quaisquer problemas, afinal também já começaram a falhar…


Artigo publicado no jornal “O Setubalense” em 29.8.2022

 

 

 

Sobre o/a autor(a)

Maria Santos e Jaime Pinho

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