Quando um casal entra num hospital para ter um filho, o que deseja é que seja uma experiência positiva.
Todas as experiências de parto são únicas e implicam abordagens individuais e uma condução respeitosa e informada de todo o processo. Isto fará toda a diferença na perceção dos casais em relação à sua experiência de parto.
A violência obstétrica pode vir na forma de insultos, humilhação, ausência de explicações, de respostas ou pela realização de procedimentos desaconselhados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como é o caso das episiotomias de rotina, a manobra de Kristeller ou o “ponto do marido”.
A episiotomia consiste num corte feito no períneo para ampliar o canal do parto; a manobra de Kristeller consiste na aplicação de pressão na parte superior do abdómen e o “ponto do marido” consiste num ponto que se faz ao término da sutura de uma episiotomia, com o objetivo de estreitar a área vaginal.
Há muitos nomes e formas que as mulheres deram, durante anos, à sua experiência menos positiva de parto, mas hoje é possível enquadrá-la nesta definição.
Nos Açores, não são divulgados dados relativos a episiotomias e manobras de Kristeller realizadas nos hospitais da região, mas através do estudo desenvolvido no âmbito do projeto IMAGINE EURO, que contou com a participação de 58 açorianas, ficamos a saber que mais de 75% foram sujeitas à manobra de Kristeller. Este mesmo estudo mostrou que 24,1% das açorianas considera não ter tido um tratamento digno e 13,8% afirma ter sofrido de abuso (físico, verbal ou psicológico).
A 2.ª edição do inquérito “Experiências de Parto em Portugal”, que contou com a participação de 81 açorianas, concluiu que três em cada dez mulheres afirmam terem sido vítimas de abuso, desrespeito ou discriminação, sendo as intervenções não consentidas as apontadas como a forma mais recorrente dessa violência.
Para além disso, na resposta a um requerimento do Bloco de Esquerda, foi possível conhecer queixas de violência obstétrica em dois hospitais da região, que foram desvalorizadas considerando que a “situação foi interpretada pela utente como violência obstétrica” e que existiu uma “divergência entre as expetativas da utente e a atuação da equipa clínica”.
Ou seja, fica claro o trabalho que tem de ser feito na região para se garantir que as experiências de parto são o mais positivas possíveis para os casais.
Por tudo isso, o Bloco de Esquerda avançou com um debate público sobre o tema e entregou no parlamento regional uma proposta para prevenir e erradicar a violência obstétrica na região, que inclui a realização de um estudo anónimo regional, o registo obrigatório por parte dos hospitais dos procedimentos realizados no parto, a implementação de inquéritos de satisfação às puérperas, a adoção de planos de parto institucionais, assim como campanhas de sensibilização e aposta na literacia em saúde materna e obstetrícia.
Mais do que apoios financeiros à natalidade, o que os casais desejam é que haja uma legislação e medidas protetoras da parentalidade, onde se enquadra também a proteção da mulher nas intervenções ginecológicas e obstétricas.
