Golfo do México: Fundo de reparações da BP acusado de fraude

06 de março 2011 - 0:14

Pela primeira vez, vítimas do derramamento de petróleo no Golfo do México denunciaram por fraude, negligência e enriquecimento ilícito o administrador do fundo de compensações da empresa britânica British Petroleum (BP). Por Dahr Jamail da IPS.

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Plataforma petrolífera Deepwater Horizon a arder – Foto de ideum/Flickr

A acção foi apresentada num tribunal estadual da Flórida contra Kenneth Feinberg, que administra o fundo de 20 mil milhões de dólares da BP e da Gulf Coast Claims Facility (Escritório de Reclamações da Costa do Golfo).

O advogado Brian Donovan, com escritório na cidade de Tampa, apresentou a queixa contra Feinberg, contra o seu escritório Feinberg Rozen, LLP e contra o Escritório de Reclamações em nome de Pinellas Marine Salvage, uma empresa dedicada ao resgate e reparação de embarcações, e de John Mavrogiannis, o seu proprietário. Os queixosos acusam os denunciados de negligência, fraude, incentivo fraudulento e enriquecimento ilícito. “Kenneth e o Escritório de Reclamações causaram mais danos do que o derramamento de petróleo”, disse Brian à IPS. “O meu cliente confiou no que Kenneth disse que faria. Fizeram promessas que não cumpriram. À empresa de John prometeram dinheiro que não recebeu”, afirmou.

“Estamos cansados de evasivas. Cansei-me das mentiras de Kenneth. Ele está a manipular o sistema e isso não está certo”, disse John à IPS. Ele não é o único que não recebeu compensações pelas perdas económicas sofridas que começaram com o derramamento de petróleo no Golfo do México. Há pouco, soube-se que mais de 130 mil queixas serão rejeitadas por Kenneth, com o argumento de que esses pedidos não estão apoiados pela documentação pertinente.

O petróleo começou a espalhar-se no dia 20 de Abril de 2010, quando a plataforma de exploração Deepwater Horizon, que a BP arrendara da firma suíça Transocean, explodiu e, dois dias depois, se afundou. Somente em Julho foi possível parar o derramamento. Nesse período, foram derramados cinco milhões de barris (de 159 litros cada) de petróleo, que causaram um sério dano ambiental e sanitário em extensa área do Golfo.

Os governos dos Estados de Luisiana, Flórida, Alabama e Mississippi acusam Kenneth de atrasar os processos, agravar as penúrias das empresas locais e subestimar as perdas provocadas na região costeira. Para Brian, Kenneth não faz mais do que cumprir a tarefa que lhe foi dada pela BP. “Está a fazer o seu trabalho. É um advogado defensor que representa a companhia. Pensar de outro modo é ingenuidade. Como advogado defensor, está a realizar um grande trabalho. E o que eles dizem é façam o que dizemos ou processem-nos”.

O escritório de Kenneth, que fica em Washington, recebeu da BP um pagamento mensal de 850 mil dólares para administrar o fundo de compensação e processar as reclamações dos habitantes e pescadores do Golfo. No dia 7 de Janeiro, foi tornado público o contrato de 46 páginas entre a BP e Kenneth, quando foi apresentado no tribunal federal da cidade de Nova Orleães, no julgamento que acontece contra a petrolífera britânica pela sua responsabilidade no derramamento. Segundo esse contrato, o pagamento do escritório “será acordado de comum acordo entre as partes de forma trimestral antes do primeiro dia de cada trimestre”.

Devido a essa cláusula, muitos acreditam que Kenneth pode ganhar mais se pagar menos aos reclamantes do fundo de 20 mil milhões e vincula esses pagamentos ao êxito que tiver em reduzir a responsabilidade da BP. Todo o dinheiro que restar dos 20 mil milhões voltará à BP, em virtude de um acordo a que a empresa chegou com o governo de Barack Obama. “Entendo que se os 20 mil milhões de dólares forem suficientes e sobrar dinheiro, este será retido pela BP”, disse Kenneth à imprensa. Em Dezembro, chegou a antecipar à Bloomberg Television que metade dessa quantia será suficiente para atender todas as reclamações de perdas económicas.

Brian acredita que as denúncias contra Kenneth até agora não tinham sido feitas “por razões políticas”. “Só o que me ocorre é que ele tem ligações políticas. Não imagino porque mais gente não processou Kenneth, quando é óbvio que deveriam fazê-lo. Os únicos advogados que conheço a trabalhar no derramamento são os que tentam organizar as vítimas para apresentar pedidos de acção colectiva”, acrescentou. “É compreensível, já que menos de 3% das 470 mil empresas e pessoas que apresentaram queixa ao Escritório de Reclamações contam com assistência legal para negociar”, afirmou.

John acredita que a sua acção é sólida “porque Kenneth mentiu várias vezes. Se me tivessem dito desde o começo que trabalhava para a BP, eu teria levado de imediato a BP aos tribunais. Acreditei que ele era imparcial, mas enganou-me, e isso é fraude. Perdi o meu negócio e a minha casa porque não pude pagar a hipoteca já que Kenneth não me pagou. Quem me vai compensar por isso?”, perguntou John, que está em risco de ser despejado de sua casa.

“Os denunciados empregam a estratégia de demorar, negar e se defender. É a que usam as companhias de seguro não escrupulosas: atrasar o pagamento, deixar morrer de fome o afectado, e depois oferecer uma quantia minúscula para todos os danos sofridos por um reclamante já debilitado económica e emocionalmente”, diz o processo. “Se o reclamante rejeita o acordo oferecido, tem de lutar”, acrescentou.

Até agora, a quantia média paga a cada afectado é de 16 mil dólares. Segundo as cifras oficiais, em 2009 uma família norte-americana de três membros era considerada pobre se o seu rendimento anual fosse inferior a 18,31 mil dólares.

2 de Março de 2011, Envolverde/IPS

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