Revertida a privatização, que fazer nos transportes públicos do Porto?

A reversão da privatização dos transportes no Porto, que a Direita queria entregar a uma empresa estrangeira, foi uma vitória de todos os que se mobilizaram. Mas desde então, o que mudou? E o que falta fazer? Por José Soeiro.

16 de janeiro 2017 - 17:47
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A reversão da privatização dos transportes no Porto, que a Direita queria entregar a uma empresa estrangeira, foi uma vitória de todos os que se mobilizaram. Foi um dos principais temas da campanha e foi ponto de honra da esquerda na assinatura dos acordos com o PS que sustentam a atual solução política. Mas desde então, o que mudou? E o que falta fazer?

Garantir a propriedade pública, sendo essencial e necessário para garantir o serviço público, não é condição suficiente. Na verdade, o serviço público, sobretudo a STCP, foi degradado durante anos, com a frota desgastada e envelhecida, um número de trabalhadores aquém do necessário, carreiras sem atualização, degradação da capacidade de manutenção e taxas de cumprimento de serviço longe do razoável, com esperas longas nas paragens e autocarros que não chegavam.

Em alguns destes aspetos houve progressos. Foram contratados 100 novos motoristas para a STCP e a taxa de cumprimento passou para os 97% (com o governo anterior tinha sido reduzida a 80%). As longas esperas nas paragens por autocarros que não chegavam alterou-se. Não, a situação não é perfeita. Mas não é comparável. Há também o compromisso de aquisição de 300 viaturas, que tem de ser acelerado, tal é o estado de alguns autocarros que circulam. Falta investir nas oficinas e na manutenção, nomeadamente em termos de pessoal. Falta quase tudo no que diz respeito à negociação coletiva, à valorização das carreiras ou ao reconhecimento da natureza desgastante do trabalho por turnos e das escalas, como acontece na Metro do Porto.

Mas além disso, como discutir a qualificação e o investimento em transportes públicos sem pensar os critérios ambientais, a política urbana, o espaço dado ao transporte público face ao automóvel (por exemplo, em dez anos o Porto perdeu cerca de 10 km de corredor BUS), o preço dos passes que pesa demasiado no orçamento das famílias, as tarifas dos bilhetes, a acessibilidade para quem tem mobilidade reduzida, os horários e carreiras? Há muito a fazer. Refiro-me, nomeadamente, a três desafios.

Primeiro, recuperar passageiros e melhorar o acesso. Promover os transportes públicos é reduzir os preços dos passes, alargar os horários, nomeadamente à noite (respondendo quer às dinâmicas do convívio noturno, quer aos trabalhadores desses equipamentos, que muitas vezes moram fora do centro), garantir os percursos e linhas necessários para que todas as zonas e bairros das cidades estejam servidos de transportes.

Segundo garantir que, no Porto, os privados não abocanham as zonas de operação da STCP. O problema é antigo. Nos concelhos à volta do Porto, há muitos operadores privados cujo serviço chega até à cidade do Porto. Mas muitos destes operadores extravasam a sua área e acabam por disputar os utentes com a empresa pública, de forma ilegal. Mais grave do que manter a ausência de fiscalização, seria que algumas linhas fossem atribuídas a esses operadores. O Porto não precisa, como sugerem alguns autarcas, de uma STCP pequenina e encolhida, restrita ao centro histórico. Precisa de expandir a sua área de atuação, até porque o seu serviço é incomparável em termos de segurança, qualidade da frota ou do respeito por critérios ambientais.

Em terceiro lugar, alargar a rede do metro do Porto, a par da sua articulação com outros meios de transportes.

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