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SIRESP: uma PPP que custou cinco vezes mais do que seria necessário

Com uma fatura inicial em 2005 de 580 milhões, adjudicada e renegociada depois para 485 milhões em 2006, um estudo do grupo de trabalho criado nos anos noventa pelo governo de António Guterres indicava um orçamento de 100 a 150 milhões.
SIRESP, foto de Nuno André Ferreira, Lusa (arquivo).
SIRESP, foto de Nuno André Ferreira, Lusa (arquivo).

Num trabalho de investigação publicado esta quinta-feira no jornal Público, o jornalista Paulo Pena recuperou o historial do SIRESP – a operadora da Rede Nacional de Emergência e Segurança, criada para, entre outras coisas, garantir uma rede fiável de comunicações em casos de emergência e que falhou nos incêndios de Pedrógão Grande.

Criada como uma Parceria Público Privado em 2005 pelo governo PSD/CDS de Santana Lopes, o contrato garantia uma renda de 580 milhões ao consórcio criado entre a PT, Motorolla, Esegur, Grupo Espírito Santo, Caixa Geral de Depósitos e SLN, de Oliveira e Costa. É aliás da SLN – mais especificamente da Plêiade, empresa da SLN – que surge o ministro que assina o contrato de PPP, Daniel Sanches.

Como Oliveira e Costa admitiu “sob juramento” nas audições parlamentares de inquérito ao BPN, “o que se gastou para fazer o SIRESP julgo que andará à volta de 80 e tal milhões de euros”. A “discrepância” entre os dois valores “pode ser difícil de explicar”, escreve Paulo Pena, mas a análise ao processo que culminou no contrato clarifica esta escalada.

A assinatura do contrato em 2005 surge quando o governo de Santana Lopes está demissionário e, em princípio, não deve celebrar atos que não sejam “urgentes”. Por isso, quando António Costa, então ministro do Ministério da Adminsitração Interna no primeiro governo de José Sócrates, pede à Procuradoria Geral da República (PGR) uma avaliação do contrato assinado por Daniel Sanches.

A PGR invalida o contrato (por curta margem) e António Costa anula o despacho do governo anterior. Procede depois a uma renegociação com o mesmo consórcio, resultando numa fatura de 485 milhões. António Costa justifica a decisão na altura garantindo que “O SIRESP assegura comunicações móveis de elevada qualidade a estes operadores, bem como a possibilidade de todos comunicarem entre si, o que é decisivo em termos operacionais e não é assegurado pelos atuais sistemas de rádio.”

As razões essenciais para manter a relação com o consórcio prendem-se com a dependência operacional já então criada entre os serviços de estado e o SIRESP, que “comeou a ser instalado a título gratuito e provisório”, ou seja, por sugestão do consórcio, “em 11 estações de comunicações, desde as vésperas do Euro 2004”, escreve Paulo Pena.

O SIRESP começa a funcionar “na sua versão paga” a 3 de julho de 2006 e, quatro meses depois, a Polícia Judiciária faz buscas na sede da SLN por suspeitas de favorecimento no concurso que escolheu o fornecedor, concurso que recebeu apenas uma candidatura por sinal da própria SLN. A PGR arquiva o processo em 2008 considerando não haver necessariamente favorecimento de Daniel Sanches à SLN.

485 milhões que podiam ter sido 100 a 150 milhões

A investigação de Paulo Pena revela depois um estudo de Almiro de Oliveira, ex-presidente do grupo de trabalho criado pelo governo de António Guterres com a missão de planear um sistema “tipo” SIRESP. Nas declarações ao jornal Público, Almerindo revela que “no nosso relatório prevíamos um investimento incial de 100 e 150 milhões de euros. A isso acrescentávamos dez por cento por ano, que corresponderai ao custo de exploração”.

A renegociação falhada de Passos Coelho

Na edição desta sexta-feira, o jornal Pública revela que também o governo de Pedro Passos Coelho tem responsabilidades na fatura do SIRESP. Desde 2011 que, para compensar os cortes transversais de austeridade exigidos pela troika, o MAI colocou a hipótese de de rever o contrato com o consórcio que geria o SIRESP.

Segundo escreve Paulo Pena, quando se tentou avançar com a renegociação, “fonte do MAI recorda ao Público que à proposta de Fernando Alexandre para iniciar esse processo com o SIRESP um diretor-geral do minsitério lhe terá sugerido, antes um almoço com o dr. Fernando Lima da Galilei”. O almoço foi “recusado”, escreve, mas a negociação só começou em abril de 2014.

Apenas um ano depois, já em abril de 2015, o Estado chega a um novo acordo preliminar com o consórcio que resultaria numa poupança de 25 milhõees de euros até ao final de 2021, 11% do custo total. “Porém, o processo só foi concluído em Dezembro, e já pelo atual Governo”. Ou seja, entre abril e dezembro de 2015, o acordo ficou à espera de ratificação pelo Conselho de Ministros, uma responsabilidade de Luís Marques Guedes, então secretário de Estado da Presidência, que recusou comentar o assunto ao jornal Público.

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